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Tempo para evitar aquecimento catastrófico está se esgotando, revela relatório científico

Tempo para evitar aquecimento catastrófico está se esgotando, revela relatório científico
  • A redução temporária das emissões de carbono ocasionadas pela quarentena global por COVID-19 não retardaram o avanço contínuo da mudança climática. As concentrações na atmosfera de gases de efeito estufa estão em níveis recorde e o planeta está rumo a um perigoso superaquecimento.
  • As conclusões são do relatório climático Unidos na Ciência 2021, publicado em conjunto por agências da ONU.
  • O documento também traz dados sobre os efeitos das mudanças climáticas no nível do mar, nos eventos extremos e na saúde humana e destaca a necessidade de uma ação urgente e efetiva.
  • Para o secretário-geral a ONU, o relatório revela o quão longe estamos de resolver a crise planetária. “Chegamos a um momento decisivo a respeito da necessidade da ação climática. A ruptura do nosso clima e do nosso planeta já está pior do que pensávamos, e está acelerando mais do que prevíamos”, afirmou Guterres.
bombeiros caminham em meio a chamas de incêndio florestal
Legenda: As mudanças climáticas aumentam os riscos do calor e do clima seco, que provavelmente irão impulsionar incêndios florestais
Foto: © Mikhail Serdyukov/Unsplash

A redução temporária das emissões de carbono ocasionadas pela quarentena global por COVID-19 não retardaram o avanço contínuo da mudança climática. As concentrações na atmosfera de gases com efeito de estufa estão em níveis recorde e o planeta está rumo a um perigoso superaquecimento, alerta relatório climático publicado por agências da ONU na quinta-feira (17).

Segundo o relatório marco Unidos na Ciência 2021, não há “nenhum sinal de crescimento para um retorno mais ecológico”.  O documento revela que as emissões de dióxido de carbono estão acelerando rapidamente, após um episódio temporário de baixa em 2020 devido ao coronavírus, e não estamos sequer perto das metas definidas pelo Acordo de Paris.

 “Chegamos a um momento decisivo a respeito da necessidade da ação climática. A ruptura do nosso clima e do nosso planeta já está pior do que pensávamos, e está acelerando mais do que prevíamos”, ressaltou o secretário-geral da ONU, António Guterres, em uma mensagem em vídeo. “Este relatório apenas mostra o quão longe estamos do curso”, adicionou.

Um mundo em perigo – De acordo com os cientistas, o aumento das temperaturas globais já está impulsionando eventos climáticos extremamente devastadores ao redor do mundo com impactos escaláveis nas economias e sociedades, como por exemplo, bilhões de horas de trabalho perdidas devido ao calor excessivo.

“Temos cinco vezes o número de recordes de desastres climáticos do que tivemos em 1970 e eles são sete vezes mais caros. Até mesmo os países mais desenvolvidos se tornaram vulneráveis”, disse o chefe da ONU.

Guterres falou como o furacão Ida recentemente cortou a eletricidade de aproximadamente um milhão de pessoas em Nova Orleans, e como a cidade de Nova Iorque foi paralisada por uma chuva recorde que matou pelo menos 50 pessoas na região.

“Estes eventos teriam sido impossíveis sem as mudanças climáticas causadas pelo homem. Incêndios onerosos, inundações e eventos climáticos extremos estão crescendo em todo lugar. Estas mudanças são apenas o começo do pior que está por vir ”, alertou.

Um futuro desanimador – O relatório ecoa alguns dos dados e advertências de especialistas no último ano: a temperatura média global nos últimos cinco anos estava entre as mais altas já registradas e há uma probabilidade crescente de que as temperaturas rompam temporariamente o limite de 1,5 °C acima da era pré-industrial nos próximos cinco anos.

O cenário apontado pelo Unidos na Ciência é desanimador: mesmo com ações ambiciosas para retardar as emissões de gases de efeito estufa, o nível dos oceanos continuará a subir e a ameaçar as ilhas baixas e populações costeiras em todo o mundo.

“Estamos, de fato, sem tempo. Devemos agir agora para prevenir adicionais danos irreversíveis. A COP26 em novembro deve marcar esse momento decisivo. A essa altura, precisamos que todos os países se comprometam a alcançar as emissões líquidas zero até meados deste século e que apresentem claras e confiáveis estratégias de longo prazo para chegar lá”, instou o chefe da ONU.

A Conferência das Nações Unidas sobre Mudança Climática de 2021, também conhecida como COP26, está agendada para acontecer na cidade de Glasgow, na Escócia, entre 31 de outubro e 12 de novembro de 2021. O encontro principal deverá definir o curso da ação climática para a próxima década.

chaminés de usinas despejam fumaça
Legenda: A poluição do ar pelas usinas de energia contribui para o aquecimento global
Foto: © Maxim Tolchinskiy/Unsplash

“Devemos garantir com urgência um avanço na adaptação e resiliência para que as comunidades vulneráveis possam gerenciar esses crescentes riscos [climáticos] … Espero que todas essas questões sejam abordadas e resolvidas na COP26. Nosso futuro está em jogo”, enfatizou Guterres.

“Ainda não estamos no caminho para o limite de 1,5 a 2 °C de Paris, embora coisas positivas tenham começado a acontecer e o interesse político em mitigar as mudanças climáticas esteja claramente crescendo, mas para ter sucesso neste esforço, temos que começar a agir agora. Não podemos esperar décadas para agir, temos que começar a atuar já nesta década”, acrescentou secretário-geral da Organização Meteorológica Mundial (OMM), o professor Petteri Taalas.

O novo relatório também cita as conclusões do relatório mais recente do IPCC: a escala das mudanças recentes no sistema climático não tem precedentes ao longo de muitos séculos a muitos milhares de anos, e é inequívoco que a influência humana aqueceu a atmosfera, o oceano e a terra.

Descobertas notáveis – As concentrações dos principais gases com efeito de estufa – dióxido de carbono (CO2), metano (CH4) e óxido nitroso (N2O) – continuaram a aumentar em 2020 e na primeira metade de 2021.

Segundo a OMM, a redução do metano atmosférico (CH4) a curto prazo poderia apoiar os compromissos dos 193 Estados-membros firmados em Paris. Esta medida não reduz a necessidade de reduções fortes, rápidas e sustentadas de CO2 e outros gases de efeito estufa.

Enquanto isso, o Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA), alerta que cinco anos após a adoção do Acordo de Paris, a lacuna de emissões (a diferença entre para onde as emissões estão caminhando e para onde a ciência indica que deveriam estar em 2030) é maior do que nunca.

Embora o número crescente de países se comprometendo com metas de emissão líquida zero seja encorajador, para permanecer possíveis e acreditáveis, essas metas precisam ser refletidas urgentemente em políticas de curto prazo e em ações significativamente mais ambiciosas, ressalta a agência.

Um futuro mais quente – O relatório explica que a temperatura média global anual provavelmente será pelo menos 1°C mais quente do que nos níveis pré-industriais (definidos como a média de 1850-1900) em cada um dos próximos cinco anos e é muito provável que esteja dentro da margem de 0,9 °C a 1,8 °C.

Há também uma chance de 40% de que a temperatura média em um dos próximos cinco anos seja de pelo menos 1,5 °C mais alta do que nos níveis pré-industriais. No entanto, é muito improvável que a temperatura média de 5 anos, de 2021 a 2025, ultrapasse o limite de 1,5 °C.

As regiões de alta latitude e o Sahel provavelmente serão mais úmidas nos próximos cinco anos, também alerta o relatório.“No último ano, estimamos que houve uma queda de 5,6% nas emissões e, uma vez que a vida útil do dióxido de carbono é tão longa, essa anomalia de um ano nas emissões não muda o cenário geral. Vimos algumas melhorias na qualidade do ar, esses gases de curta duração, que estão afetando a qualidade do ar. Vimos uma evolução positiva lá. Mas agora voltamos mais ou menos aos níveis de emissão de 2019”, explicou o chefe da OMM.

O aumento do nível do mar é inevitável – “Não sabemos o que vai acontecer com as geleiras da Antártica, onde temos a maior massa de gelo do mundo e, no pior dos casos, poderíamos ver até dois metros de elevação do nível do mar até o final deste século se o degelo das geleiras Antártica acontecer de maneira mais rápida”, advertiu o professor Taalas.

Os níveis globais do mar aumentaram 20 centímetros de 1900 a 2018 e a uma taxa acelerada de 2006 a 2018.

Mesmo se as emissões forem reduzidas para limitar o aquecimento bem abaixo de 2°C, o nível médio global do mar provavelmente aumentaria de 0,3 a 0,6 metros até 2100 e poderia aumentar de 0,3 a 3,1 metros até 2300.

A adaptação ao aumento será essencial, especialmente ao longo dos litorais baixos, pequenas ilhas, deltas e cidades costeiras, explica a OMM.

A saúde mundial também está em risco – A Organização Mundial da Saúde (OMS) alerta que a elevação das temperaturas está relacionado ao aumento da mortalidade ligada ao calor e ao comprometimento do trabalho.  com um excesso de 103 bilhões de horas de trabalho potenciais perdidas globalmente em 2019 em comparação com as perdas em 2000.

Além disso, as infecções por COVID-19 e os riscos climáticos, como ondas de calor, incêndios florestais e má qualidade do ar, combinam-se para ameaçar a saúde humana em todo mundo, colocando as populações vulneráveis particularmente em risco.

De acordo com a agência de saúde das Nações Unidas, os esforços de recuperação do COVID-19 devem estar alinhados com as estratégias nacionais de mudança climática e qualidade do ar para reduzir os riscos dos perigos climáticos em cascata e obter benefícios conexos para a saúde.

“Tivemos essa anomalia de temperatura no oeste do Canadá e nos Estados Unidos, com até 15°C graus mais quente do que o normal. E isso levou a uma quebra de recorde, incêndios florestais e graves problemas de saúde, especialmente entre os idosos”, destacou o secretário-geral da OMM.

Unidos na Ciência – O relatório Unidos na Ciência 2021, o terceiro de uma série, é coordenado pela Organização Meteorológica Mundial (OMM), com contribuições do Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA), da Organização Mundial da Saúde (OMS), do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC), o Global Carbon Project (GCP), o World Climate Research Program (WCRP) e o Met Office (UK). O documento apresenta os mais recentes dados científicos e descobertas relacionadas às mudanças climáticas para informar a política e a ação global.

Baixe o relatório completo.

Entidades da ONU envolvidas nesta atividade