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Dia Mundial do Meio Ambiente: por que o lema #UmaSóTerra nunca foi tão urgente como agora

Dia Mundial do Meio Ambiente: por que o lema #UmaSóTerra nunca foi tão urgente como agora

Ecoado há 50 anos em Estocolmo, ideal ganha nova luz sob cenário de guerra, fome, inflação e crise climática. “Temos responsabilidade de ação”, diz Marcelo Furtado, da Coalizão Brasil

Nas últimas décadas, o mundo tem experimentado avanços científicos e tecnológicos em velocidade jamais vista na história da civilização. Adquirimos o poder de transformar, de inúmeras maneiras e em uma escala sem precedentes, tudo o que nos cerca.

Se, por um lado, progredimos em muitos aspectos como sociedade, também deixamos um rastro de pegadas de impacto pesadas no caminho. Na esteira da pandemia de Covid-19, enfrentamos guerra, aumento da fome e aprofundamento de crises ambientais, sociais e econômicas, que parecem se retroalimentar. Como orquestrar uma resposta sistêmica a esses desafios e ao maior de todos — a crise climática — que ameaça aprofundar as mazelas contemporâneas?

Olhar para trás, aprender com o passado, rever planos e promessas para reorientar a rota e fortalecer o propósito comum é uma saída. Não à toa o Dia Mundial do Meio Ambiente de 2022, celebrado neste domingo (5) traz o tema #UmaSóTerra, o mesmo que ecoou 50 anos atrás durante um marco para o ambientalismo: a Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente Humano de 1972, ocorrida em Estocolmo, na Suécia. Neste ano, também celebramos os 30 anos da Rio 92, que contou com presença maciça de chefes de estado e deu origem a importantes documentos que até hoje balizam as discussões de alto nível sobre meio ambiente no mundo.

Sobre tudo isso e mais um pouco, Um Só Planeta conversou com o ambientalista e membro fundador da Coalizão Brasil Clima Floresta e AgriculturaMarcelo Furtado. Além de passar em revista os desdobramentos desses grandes encontros, Marcelo analisa os desafios e oportunidades para efetivamente agirmos como um só Planeta e construirmos uma Terra mais próspera, justa, resiliente e saudável.

“Estocolmo posicionou politicamente a questão ambiental mostrando que desenvolvimento a qualquer custo não era um caminho para a sociedade e que aquela ideia de poluir primeiro para ganhar dinheiro e só depois falar de questões sociais e ambientais era uma visão equivocada”, contou. “Naquele momento, começamos a ver grandes crises de contaminação e poluição, que despertaram na população a consciência de que não dava para viver ignorando a preservação ambiental”.

Duas décadas depois da conferência de Estocolmo, a urgência do desenvolvimento sustentável mobilizou as discussões na ECO-92, no Rio de Janeiro, que reuniu diplomatas e chefes de Estado de 183 países. Nasciam ali acordos globais para enfrentar desafios como a desertificação, perda de biodiversidade e as emissões crescentes de gases de efeito estufa, causadores do aquecimento global.

O documento Agenda 21 foi um dos principais resultados desse encontro, que mostrou a importância de governos, empresas, organizações não-governamentais e todos os setores da sociedade refletirem global e localmente sobre a forma pela qual poderiam cooperar para solucionar os problemas socioambientais, incluindo a erradicação da pobreza e da fome.

Proteção ambiental, justiça social e eficiência econômica direcionam o programa de ação que, na Assembleia Geral das Nações Unidas em 2015, daria origem à Agenda 2030 de Desenvolvimento Sustentável, com 17 objetivos globais. Como o termo “agenda” sugere, trata-se de um guia de um novo modelo de desenvolvimento para o século XXI pautado por uma sociedade global mais pacífica, justa, sustentável.

Para Marcelo, existe um grande vácuo entre toda a “arquitetura de compromissos” desenhada e a implementação de ações efetivas que impactem a sociedade positivamente. A atual intensificação das mudanças climáticas, inflação elevada, insegurança energética e alimentar, acentuadas pela guerra da Rússia na Ucrânia, compartilham um chamado comum, diz ele.

“O quanto nós, como sociedade, ao deixarmos de fazer a lição de casa que tinha que ser feita estamos pagando um preço cada vez mais alto. Mas quem paga de verdade o preço mais alto são os mais pobres e mais vulneráveis”, enfatiza. Essa constatação impõe aos países a necessidade de rever políticas agrícolas, econômicas e energéticas a partir da perspectiva da justiça ambiental e climática.

“Por que nossa agricultura ainda não é sustentável como deveria ser? Por que o Brasil, como grande produtor de alimentos, ainda tem altíssimos índices de desmatamento?”, provoca. “Sem natureza não tem economia. O que faz com que consigamos produzir alimentos e produzir energia nesse país é o fato de termos uma floresta amazônica em pé produzindo água”, afirma o ambientalista e cofundador da Coalizão Brasil Clima Floresta e Agricultura.

“Nós temos uma responsabilidade de ação. Faltou vontade política dos governos? Não há dúvida. Mas ao mesmo tempo há uma responsabilidade que as empresas têm que executar, o setor financeiro, o setor energético e alimentar. Os consumidores têm responsabilidade nas suas escolhas e nós, como cidadãos, também temos responsabilidade grande, seja como atores de transformação através de nosso voto, seja como como demandantes [de mudanças] em todos os seus níveis, municipal, estadual, federal e global”, defende.

Marcelo reconhece que o mundo já teve momentos melhores como “sociedade planetária integrada”, diferentemente do sentimento de polarização que predomina atualmente, mas diz que foram essas experiências do passado que nos deixam uma mensagem de esperança. “Talvez seja exatamente em momentos de retrocesso que precisamos revisitar marcos importantes para mostrar que a sociedade não aceita retrocessos, que o único caminho que temos é de ir pra frente com urgência, solidariedade e cooperação”.