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Recordista mundial, Brasil terá aumento de raios e relâmpagos com crise do clima

Recordista mundial, Brasil terá aumento de raios e relâmpagos com crise do clima

Com o aumento da temperatura do planeta e as mudanças climáticas, taxa anual média de 77,8 milhões de raios deve saltar para 100 milhões de raios por ano no país

Dia após dia, um olhar para o alto antes de sair de casa pode dar pistas sobre como será o tempo ao longo das horas seguintes. Quando o céu está fechado, ou mesmo com apenas algumas nuvens que parecem mais carregadas, os sinais indicam que pode vir chuva ao longo do dia. Como parte do ciclo da água na Terra, a chuva é um fenômeno positivo e necessário: é ela que recarrega reservatórios de água, que irriga florestas e plantações e mantém as condições saudáveis para a existência de vida no planeta. Porém, é preciso tomar alguns cuidados quando o tempo se fecha. Durante uma tempestade é comum a ocorrência de raios, que podem ser percebidos pela luz no céu escuro ou pelo som que atravessa quilômetros de distância.

De acordo com o engenheiro eletrônico e coordenador do Grupo de Eletricidade Atmosférica (ELAT), vinculado ao Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE), Osmar Pinto Júnior, raios e relâmpagos “são descargas elétricas intensas que ocorrem na atmosfera”. Segundo Pinto Júnior, “relâmpago é o nome dado a todas as descargas, já o raio é apenas aquele que entra em contato com o solo”. Os raios são descargas elétricas de grande intensidade e que conectam o solo e as nuvens de tempestade na atmosfera. Para se ter ideia, um raio costuma ter uma intensidade de 30.000 ampères, o equivalente a mil vezes a intensidade de um chuveiro elétrico. Além disso, a descarga pode percorrer distâncias de até 5 quilômetros.

“A forma de se proteger é evitar situações de risco”, disse Pinto Júnior. “Se uma pessoa estiver ao ar livre e uma tempestade se aproximar, a principal recomendação é buscar abrigo dentro de um carro fechado ou dentro de uma residência. Dentro da residência, o ideal é evitar contato com objetos ligados à rede elétrica ou telefônica”, afirmou.

A força dos raios é um dos motivos que geram preocupação em dias de temporais. A chance de uma pessoa ser atingida por um raio é baixa – em média, é menor do que uma em um milhão –, mas, caso o fato ocorra, o efeito da descarga elétrica pode causar danos graves ao indivíduo. Além de causar queimaduras no corpo, a descarga do raio pode levar à morte por parada cardíaca e respiratória. Os sobreviventes desse tipo de acidente podem passar longos períodos em recuperação das sequelas físicas e psicológicas. Somado a todos os outros incômodos causados pela chuva, a preocupação com a incidência de raios é mais um motivo para procurar abrigo durante um temporal.

Os perigos relacionados aos raios não são somente os de incidência direta. Indiretamente, raios podem causar incêndios e quedas de linha de energia. Em janeiro de 2022, um raio provocou um incêndio de grandes proporções em uma área alagada do Parque Estadual Várzeas do Rio Ivinhema, na cidade de Naviraí, no sul do Mato Grosso do Sul. Foram necessários 23 combatentes diretos e a equipe teve que acionar um avião para fazer um sobrevoo no local. Também em janeiro de 2022, um raio teria causado um curto-circuito em um disjuntor de uma casa residencial, que pegou fogo por causa do acidente.

Uma forma de direcionar os raios para locais onde o dano será reduzido é a instalação de para-raios no topo de edifícios. A haste de metal é conectada ao solo por um fio terra, que é um condutor de eletricidade que tem o objetivo de reduzir os riscos de choques elétricos. Como é impossível evitar que o raio ocorra, pois ele é um fenômeno natural que acontece de acordo com os ciclos da natureza, o equipamento de metal é uma forma de criar condições mais atraentes para a incidência de raios naquele local específico.

Vista aérea dramática das nuvens carregadas de chuva sobre bairro em São Paulo. — Foto: Paralaxis/GettyImages

Vista aérea dramática das nuvens carregadas de chuva sobre bairro em São Paulo. — Foto: Paralaxis/GettyImages

A quantidade de notícias nacionais sobre acidentes com descargas elétricas não é coincidência: o Brasil é campeão mundial em ocorrência de raios. De acordo com dados do ELAT, 77,8 milhões de raios caem no Brasil por ano. O motivo é geográfico. Por ser o maior país da zona tropical do planeta, é onde se localiza a área central em que o clima é mais quente e favorável à formação de tempestades e de raios. Com o aumento da temperatura do planeta e as mudanças climáticas, a média deve aumentar para 100 milhões de raios por ano.

Como a formação de tempestades e de raios está relacionada à umidade do ar e às altas temperaturas, se não houver diminuição na emissão de gases de efeito estufa, a expectativa é que as descargas elétricas aumentem em todo o país. De acordo com um estudo conduzido por Pinto Júnior, a região Norte deve ver um aumento de 50% de incidência de raios, enquanto a Nordeste terá um crescimento de 10%. As outras regiões do país poderão registrar aumentos entre 20% e 40% na incidência de raios.

Enquanto as descargas elétricas são recebidas com preocupação, elas não devem ser vistas apenas com maus olhos. “Raios e relâmpagos foram e são vitais para a existência de vida em nosso planeta”, disse Pinto Júnior. De acordo com um estudo realizado pela Universidade Yale, nos Estados Unidos, e pela Universidade de Leeds, no Reino Unido, bilhões de raios que atingiram a Terra ao longo de milhões de anos liberaram o fósforo, componente essencial para o surgimento das biomoléculas necessárias para a existência de vida no planeta.