Anchor Deezer Spotify

Projeto Uçá: uma aula inclusiva e lúdica sobre a vida nos manguezais do Rio

Projeto Uçá: uma aula inclusiva e lúdica sobre a vida nos manguezais do Rio

Trabalho é pioneiro de educação ambiental no estado junto a alunos das redes públicas com diversidade funcional

Com 18 anos, Fabiano de Melo só foi apresentado a um caranguejo de verdade aos 15, quando conheceu o Projeto Uçá, de conservação de manguezais, durante exposição em uma escola municipal de Guapimirim. O jovem tem uma diversidade funcional (termo atual para deficiência) visual, mas ali, usando as mãos, teve a oportunidade de aprender sobre o animal, símbolo dos mangues. Desde 2012, o projeto adapta metodologias e materiais para não deixar ninguém de fora: com trabalho de educação ambiental inclusiva reconhecido no Brasil, já atendeu 680 alunos de redes municipais e da estadual em 14 cidades das regiões das baías de Guanabara, Sepetiba e Ilha Grande.

— Foi uma experiência maravilhosa. Eu consegui visualizar com as mãos o caranguejo e pude aprender muito mais do que imaginava — lembra Fabiano, que acabou convidado a conhecer de barco o manguezal da Área de Proteção Ambiental (APA) de Guapimirim, e depois foi eleito vereador mirim da cidade com uma redação contando essa experiência.

Voltado para a conservação de ecossistemas costeiros e a valorização dos povos tradicionais no Rio, com foco nos manguezais, o Projeto Uçá é uma iniciativa da ONG Guardiões do Mar, patrocinado pela Petrobras por meio do programa Petrobras Socioambiental. A ONG, pioneira no país na promoção de educação ambiental inclusiva, foi vencedora do Prêmio Hugo Werneck (2017) e do Prêmio Firjan Ambiental (2020). As ações e todos os materiais didáticos e lúdicos são preparados em português e libras.

A organização mira no público com diversidade funcional, seja ela intelectual, motora, auditiva ou visual, e nas crianças com transtorno do espectro autista (TEA), como o menino João Paulo da Silveira da Costa, de 8 anos. Ele cursa o 3º ano do ensino fundamental em Duque de Caxias e participou de uma das ações de outro projeto da Guardiões do Mar, o Educ, que fomenta o protagonismo jovem e comunitário com educação ambiental e implementação de coleta seletiva comunitária.

— Ele plantou mudas de ipê-amarelo, conheceu o caranguejo-uçá e chegou em casa falando, todo feliz, que a gente tem que ter muito cuidado com os animais e preservar todas as vidas. O meu filho tem autismo e um modo de aprendizado diferente. É importante ele ter esse espaço e ser incentivado à consciência ambiental ainda pequeno — diz a mãe, Débora da Silveira, de 41 anos.

Ações também em campo

 

As atividades incluem sempre todos os alunos das turmas. Quando é identificada, em diagnóstico prévio, uma necessidade específica em algum estudante, um novo material complementar é produzido para garantir a sua participação plena. Exemplo disso ocorreu em uma atividade sobre a água.

— Nós tínhamos materiais tridimensionais, como o globo terrestre, para a aula. Mas, para atender um aluno cego, foi preciso fazer garrafas separadas com as proporções das águas doce e salgada. Assim, ele sentiu a diferença de peso — conta o biólogo e presidente da ONG Guardiões do Mar, Pedro Belga.

Estudantes de escola pública numa aula sobre a língua de sinais — Foto: Divulgação / Foto de RCampanario

Estudantes de escola pública numa aula sobre a língua de sinais — Foto: Divulgação / Foto de RCampanario

Em parceria com o Ateliê do Encontro — coletivo de produção de materiais, eventos e vídeos em libras — , o Projeto Uçá criou o caderno “Manguezal: colorir, desenhar & conhecer!”, acessível em libras para crianças pequenas via QR Code, e o livro infantil de educação ambiental “Projeto futuro”, com versões na língua dos sinais e em audiobook. No canal do YouTube da ONG, há conteúdos em libras sobre os manguezais e suas espécies.

O projeto ainda oferece um curso de Libras e Meio Ambiente, gratuito, para jovens e adultos, e produziu a primeira publicação em braile sobre a Baía de Guanabara, o “Guanabara viva”, em audiobook.

O Projeto Uçá também tem ações em campo de conservação dos manguezais: retirou 44 toneladas de lixo de 36 hectares no recôncavo da Guanabara na última década. E, através da Operação LimpaOca, restaurou 182 mil metros quadrados de florestas de mangue na APA de Guapimirim, plantando mais de 64 mil árvores das espécies locais.

No estado, a educação climática pode se tornar disciplina em escolas estaduais, prevista em projeto aprovado este mês na Alerj. A proposta, no entanto, não cita a inclusão de alunos com deficiência. O texto, da deputada Mônica Francisco (PSOL), aguarda sanção do governador Cláudio Castro.