Pesquisadores criam sensor de baixo custo para avaliar qualidade da água
Indicado para comunidades vulneráveis, aparelho atende atende aos critérios da OMS
Um novo sensor desenvolvido por pesquisadores do Brasil e do Nepal promete transformar o monitoramento da qualidade da água em áreas carentes. O dispositivo, resultado da colaboração entre a Escola de Engenharia de São Carlos (EESC) da USP, o Instituto de Pesquisa de Phutung no Nepal e a Universidade de York, foi recentemente descrito no periódico Optica. Este sensor inovador utiliza luzes de LED para detectar microrganismos patogênicos na água sem a necessidade de lentes, tornando-o mais leve, compacto e econômico.
“Nosso ponto de partida foi a necessidade de se criar soluções viáveis, ou seja, mais rápidas, baratas e portáteis, para o monitoramento da qualidade da água onde as comunidades vulneráveis vivem”, explica Emiliano Martins, professor do Departamento de Engenharia Elétrica e de Computação da EESC e um dos participantes do projeto. “Um dos grandes problemas é que os métodos tradicionais, lentos e caros, raramente podem ser feitos nesses locais, o que resulta na ingestão de água imprópria e suas consequências, com doenças e mortes, muitas delas de crianças, todos os anos”, completa.
O sistema funciona com base em fluorescência: LEDs com luz UV excitam proteínas de micróbios nocivos presentes na água, e o sensor detecta a fluorescência emitida por essas proteínas – sobretudo derivadas do aminoácido chamado triptofano. “Entre os aminoácidos essenciais que os humanos e a maioria dos animais que abrigam coliformes em seus intestinos não conseguem sintetizar, o triptofano é o mais fluorescente e pode ser encontrado dentro e fora das células das bactérias e, por essa razão, é o alvo do nosso sistema de detecção na água”, detalha o líder da equipe de pesquisa, Ashim Dhakal, do Phutung Research Institute no Nepal.
Essa abordagem permite identificar microrganismos a níveis inferiores a uma parte por bilhão, atendendo aos critérios da Organização Mundial da Saúde (OMS) para a avaliação de contaminação fecal. O projeto é uma resposta direta à falta de tratamento adequado de água em comunidades vulneráveis de países em desenvolvimento, como o Brasil e o Nepal.
“As moléculas absorvem a energia da luz, perdem parte dela como calor e emitem o resto da energia por meio de luz de menor energia. A absorção e a emissão dependem da configuração eletrônica das moléculas-alvo”, descreve Martins. A quantidade de luz emitida é medida usando um detector para quantificá-las, o que nos permite inferir a presença da bactéria na amostra”.
O novo fluorômetro desenvolvido não só elimina a necessidade de lentes, mas também melhora o desempenho em comparação aos dispositivos tradicionais. “O sinal de fluorescência alcançado é quase o dobro da força de um sistema com lentes”, afirma Martins. A tecnologia é projetada para ser uma alternativa de baixo custo e alta eficiência às soluções convencionais.
Uma das principais vantagens do sensor é a sua facilidade de uso. Os resultados são apresentados em números simples e indicadores de semáforo, permitindo que qualquer pessoa possa interpretar rapidamente os dados e tomar as ações necessárias. Isso contrasta com os métodos tradicionais, que exigem cultivo de amostras e quantificação de bactérias, um processo que pode levar mais de 18 horas e é impraticável em situações onde uma confirmação imediata da segurança da água é necessária.
Apesar dos resultados promissores, a equipe ainda enfrenta desafios. “Em algumas situações, nosso sensor ainda dá uma espécie de falso positivo, ou seja, acusa a presença de microrganismos, mesmo com a água tendo sido tratada e estando apta para consumo”, calcula Martins. Eliminar esses falsos positivos é o principal desafio que estamos abordando neste momento, o que conseguiremos brevemente”.
“Estamos evoluindo bem num projeto de alto impacto social e que, vale dizer, utilizou muito pouco recurso financeiro. Acho que é um ótimo exemplo de que é possível fazer pesquisa de ponta mesmo com poucos recursos”, conclui o professor da EESC. “Seguimos avançando, esperançosos de que esse trabalho facilite o monitoramento da água em locais de vulnerabilidade, de modo a contribuir para uma redução de doenças e mortes decorrentes do consumo de água inapropriada”.