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Para sociedades médicas, liberar máscaras nas escolas eleva riscos

Para sociedades médicas, liberar máscaras nas escolas eleva riscos

Representantes de algumas das principais sociedades médicas do Brasil afirmam que o fim da exigência do uso de máscaras para professores e alunos é uma medida precipitada. Consultados pelo EXTRA, especialistas das áreas de pediatria, imunização, infectologia e saúde coletiva sustentam que o ambiente escolar é mais vulnerável à propagação da Covid-19 em virtude da baixa cobertura vacinal infantil.

Ao menos 20 capitais e o Distrito Federal já dispensaram o uso de máscaras em ambientes abertos, sendo que oito capitais flexibilizaram também em fechados. A medida contrasta com um cenário em que apenas metade do público infantil de 5 a 11 anos tinha recebido a primeira dose do imunizante até sexta-feira e só 12,4% nesta faixa etária têm esquema vacinal completo.

Os estados do Rio de Janeiro e São Paulo dispensaram o uso do item nos dias 7 e 18 de março, respectivamente. A vacinação tem avanço desigual no país e há problemas com dados nos estados.

Para a médica sanitarista Rosana Onocko, presidente da Associação Brasileira de Saúde Coletiva (Abrasco) e professora da Unicamp, a liberação aumenta o risco de exposição de crianças não vacinadas e suas famílias.

— Não custa nada ter um pouco mais de cautela. Alguns pais estão com medo de vacinar os seus filhos e crianças muito pequenas ainda nem podem receber a imunização — diz.

Ainda que a média móvel de mortes tenha caído 42% nas últimas duas semanas, os meses que antecedem o inverno são mais propícios à disseminação de vírus respiratórios como o da Covid-19.

— Tudo fica mais fechado, é uma situação preocupante — completa Onocko.

Estudo divulgado nesta semana pela Universidade Duke, da Carolina do Norte (EUA), mostrou que o uso obrigatório de máscaras em escolas teve importante papel na queda de casos de Covid-19 no ano passado, mesmo quando já existia vacina. Foi verificada uma redução de 72% no número de ocorrências na comparação entre estados americanos que mantiveram e liberaram as máscaras. O levantamento englobou um universo de mais de 1 milhão de alunos.

O Estado de São Paulo manteve a máscara em transportes coletivos, mas cada município pode regular detalhes de sua flexibilização de acordo com os índices locais de vacinação. A cidade de Jaboticabal, por exemplo, obriga o uso do equipamento de proteção em todos os ambientes. Na Câmara Municipal de São Paulo, ele será utilizado até 31 de março: após isso, apenas em ambientes com mais de 50% de ocupação.

No início do ano letivo, a secretaria de educação de São Paulo entregou máscaras às escolas do estado. A assessoria da pasta informou que as unidades estão autorizadas a comprar o equipamento e fornecer aos alunos que solicitarem.

— Assim como não conseguimos fazer distanciamento no transporte público, na escola também é impossível. Deveriam incentivar o uso de máscara pelo menos enquanto os maiores de 5 anos não estão com o esquema vacinal completo — diz Renato Kfouri, presidente do Departamento Científico de Imunizações da Sociedade Brasileira de Pediatria.

Um dos colégios privados mais tradicionais de São Paulo, o Dante Alighieri informou que a máscara foi desobrigada em suas dependências. No Rio, o Colégio Federal Pedro II manteve o uso dentro de todas as suas unidades.

Desestímulo à vacinação

Vice-presidente da Sociedade Brasileira de Imunizações (SBIm), Isabela Ballalai acredita que a flexibilização das máscaras pode até desestimular a vacinação contra Covid. Ela recorda que a proteção contra a doença deixou de ser prioridade para milhares de pessoas no final do ano passado, mesmo com a chegada da variante Ômicron.

A transmissão da subvariante BA.2 está em ascensão no Brasil. Em três semanas, a proporção de casos prováveis da linhagem da Ômicron cresceu de 3,8% para 27,2% no país, segundo o Instituto Todos pela Saúde (ITpS).

A omissão de alguns governos de estados brasileiros, que transferem às escolas a decisão de legislar sobre o uso da proteção, também preocupa médicos e especialistas. Infectologista e coordenadora do comitê de imunizações da Sociedade Brasileira de Infectologia, Rosana Richtmann afirma que a baixa procura pela vacinação das crianças foi motivada justamente pela falta de comunicação entre governos e cidadãos. A dúvida e o medo, diz, contribuem para que se perca a percepção de risco.

— Precisamos entender essa nova variante. Não chegamos a estudar nenhum impacto da retirada em locais abertos — diz Richtmann.