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Criar abelhas em casa pode ser “tiro no pé” para conservação da espécie

Criar abelhas em casa pode ser “tiro no pé” para conservação da espécie

Pesquisadores alertam para sobreposição de espécies invasoras e nativas, o que pode criar uma disputa ainda maior por abrigo e comida. Especialistas recomendam plantar flores para ajudar as abelhas

As notícias sobre o declínio populacional das abelhas vem causando reações de quem gostaria de ajudar na conservação, passando a criar abelhas em casa, na maioria dos casos, de espécies sem ferrão.

Na Austrália, houve um salto de 5 mil novos criadores em cinco anos, relata o jornal The Guardian. Um número que começa a preocupar pesquisadores e profissionais ligados à apicultura.

A criação de abelhas sem ferrão, entre outras, pode causar um choque entre espécies e prejudicar as abelhas locais. Apesar da boa vontade, apicultores amadores podem estar ajudando a desequilibrar as populações de abelhas que tanto estimam.

No Brasil o tema desperta atenção também, com artigos científicos alertando para o impacto de abelhas “estrangeiras” inseridas em novas regiões.

Ao mesmo tempo que espécies amazônicas são criadas e solicitadas em regiões do Centro-Oeste e do Sudeste, nessas mesmas localidades uma espécie como a uruçu-amarela (Melipona rufiventris) está na lista vermelha da fauna ameaçada de extinção, alerta a pesquisadora Betina Blocktein em análise sobre artigo publicado por ela e colegas brasileiros no Journal of Applied Ecology, da Sociedade Britânica de Ecologia.

Entre apicultores australianos a preocupação é precisamente a mesma. Tony Wilsmore, especializado em instalar colmeias urbanas nos subúrbios de Melbourne, afirma ao Guardian que, ao receber telefonemas de novos clientes, a primeira coisa que faz “é tentar convencê-los de que não devem criar abelhas”.

“Acho que as pessoas são compelidas a manter uma colmeia porque fundamentalmente querem ajudar as abelhas. E minha mensagem geralmente é que o primeiro passo para ajudar as abelhas é plantar flores”, afirma Fiona Chambers, CEO da Wheen Bee Foundation, uma instituição sem fins lucrativos para conservação das abelhas na Austrália.

A diminuição de territórios verdes nas cidades, e a pouca oferta de flores para fornecer a matéria-prima para as abelhas, causa uma competição entre as recém-chegadas, muitas vezes espécies de outro tipo de habitat, e as abelhas silvestres locais.

“Antes de as pessoas terem uma colmeia de abelhas, elas precisam pensar muito seriamente: Tenho flores suficientes, e não apenas na primavera, mas há flores suficientes ao longo do ano para sustentar as abelhas?”, coloca Chambers.

Pesquisadores brasileiros alertaram, em estudo publicado em 2021, que o comércio de abelhas sem ferrão tomou escala nacional e merece mais atenção em relação ao seu possível impacto.

“Tais encontros entre abelhas nativas e exóticas podem representar ainda maior risco pela transferência de novos patógenos e parasitas”, coloca Betina, que defende a comercialização de abelhas apenas nas regiões de origem, para evitar essa sobreposição.