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Lixo espacial que caiu no Brasil tem risco? É tóxico? É reciclável? Entenda

Lixo espacial que caiu no Brasil tem risco? É tóxico? É reciclável? Entenda

Uma peça de mais de meia tonelada foi encontrada em São Mateus do Sul, cidade da região sudeste do Paraná, na última quarta-feira (16). Segundo astrônomos brasileiros, tudo indica que a estrutura é parte do foguete Falcon 9, lançado pela SpaceX, do bilionário Elon Musk, para levar satélites turcos para fora da Terra.

O que será feito com a peça? A estrutura apresenta riscos para humanos? O material poderá ser reciclável? Tilt conversou com especialistas em astronomia para responder essas e outras dúvidas sobre o acontecimento. Veja a seguir seis esclarecimentos:

É mesmo um pedaço do foguete Falcon 9?

Pesquisadores de diferentes observatórios brasileiros acreditam que o material encontrado tem todo jeito de ser parte do foguete Falcon 9, da SpaceX. Mais especificamente, do segundo estágio da nave, lançada em 19 de dezembro do ano passado da Base da Força Espacial dos EUA, na Flórida.

Segundo Anisio Lasievicz, astrônomo e diretor do Parque da Ciência Newton Freire Maia, em Pinhais (PR), a peça parece ter composições e marcas específicas que batem com as encontradas no foguete lançado recentemente pela empresa de Elon Musk.

 

Imagem do foguete Falcon 9 - SpaceX/Divulgação - SpaceX/Divulgação

Imagem do foguete Falcon 9

Imagem: SpaceX/Divulgação

De acordo com o astrônomo Naelton Araújo, do Planetário do Rio de Janeiro, o local da queda bate com a trajetória de reentrada na Terra do Falcon 9, que aconteceu na semana passada.

“Pensávamos que os fragmentos tinham caído no mar. Esse caso surpreendeu”, afirmou Marcelo Zurita, diretor técnico da Bramon (Rede Brasileira de Observação de Meteoros), ontem sobre o caso.

O que é lixo espacial?

Este pode ser mais um exemplo de lixo espacial que atinge a Terra, ou seja, quando um objeto artificial feito por nós e enviado ao espaço deixa de ter função e fica vagando. Peças e estruturas de satélites e foguetes são os exemplos mais comuns.

Calcula-se que mais de 130 milhões de objetos artificiais circulam pela órbita do nosso planeta. Deste número, apenas 2.000 são satélites ativos. O resto é lixo espacial.

É normal um pedaço desse tamanho cair na Terra?

Dados de 2019 da rede de monitoramento espacial dos Estados Unidos, estimam que:

  • mais de 128 milhões de pedaços de lixo espacial são menores que 1 cm;
  • 900 mil deles têm tamanhos entre 1 e 10 cm;
  • 34 mil possuem tamanho superior a 10 cm.

A peça encontrada no Paraná tem 600 kg. Quer dizer, é incomparavelmente maior que a média do lixo especial.

Esse tamanho todo ajuda a explicar por que ela não foi fragmentada ao entrar na atmosfera terrestre.

No processo de entrada na Terra, uma combinação de velocidade e atrito fazem os objetos se desintegrarem antes de atingir o solo. É raro quando isso não acontece.

Além disso, explica o astrônomo Thiago Gonçalves, do Observatório do Valongo, da Universidade Federal do Rio de Janeiro, e colunista de Tilt, quando um objeto vindo do espaço não é destruído na reentrada, tende a cair em áreas inabitadas ou no oceano —que compõem a maior parte da Terra.

Por fim, a rota dos foguetes pode ser programada para evitar a queda em áreas urbanas, explicaram os especialistas. Assim, lixos espaciais em lugares habitados costumam bastante incomuns.

No ano passado, por exemplo, destroços de um foguete chinês caíram no oceano Índico sem oferecerem nenhum tipo de perigo para as pessoas.

O que pode ser feito com a peça? É reciclável?

O astrônomo Naelton Araújo afirma que quase todo metal presente em lixos espaciais pode ser reciclado. Mas, no caso do Paraná, ele sugere que a peça seja exibida em museus. “Seria uma boa maneira de discutir lixo espacial num aspecto ambiental e tecnológico”, afirmou sobre a ajuda dessa estratégia para a divulgação científica.

“Provavelmente a Força Aérea [Brasileira] vai resgatar esse material para análise ou para que alguma universidade faça algum tipo de estudo”, completou Lasievicz.

Outra possibilidade é que a própria empresa responsável pelo material —ou seja, possivelmente a SpaceX— queira reavê-lo. Assim como em casos de acidentes aeronáuticos, esse tipo de lixo espacial pode servir para estudos de caso e guarda informações importantes sobre a resistência do material.

“Esses metais [dos lixos espaciais] preservam algumas informações valiosas para o seu construtor”, explicou Lasievicz.

Caso o material encontrado não interesse às autoridades brasileiras nem à SpaceX, ele pode virar “lembrancinha” de quem o encontrou.

O que vem do espaço apresenta riscos?

Um lixo espacial não apresenta riscos após sua queda no ambiente terrestre, pois não costuma ter materiais tóxicos ou radioativos.

Além disso, o processo de reentrada costuma “queimar tudo”.

“Quando o objeto atingir o solo, ele ainda vai estar muito quente. Então, as pessoas podem se queimar [caso toquem]”, explica Lasievicz.

Por esse motivo, caso caísse em áreas habitadas, poderia causar prejuízos ou ferimentos a quem estivesse por perto. Mas isso é muito raro.

Qual seria o valor da peça?

É difícil calcular isso, disseram os especialistas. Cada parte específica de um foguete tem seu respectivo valor.

Mas, o valor pode ser alto, já que a montagem de foguetes desse tipo costuma ser cara.

“São equipamentos que demandam muita tecnologia, as [suas] ligas metálicas também são ligas especiais”, explica Lasievicz.

Tem nióbio na composição?

De acordo com os astrônomos consultados por Tilt, a peça teria nióbio em sua composição, já que esse é um material usualmente utilizado na indústria espacial para deixar o aço ainda mais forte e resistente.

É muito comum encontrar porções de nióbio, titânio e ligas de aço nessas construções.

*Colaborou Bruna Souza Cruz, de Tilt.