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Estudo descobre espécie que viveu há 233 milhões de anos no Rio Grande do Sul

Estudo descobre espécie que viveu há 233 milhões de anos no Rio Grande do Sul

Fósseis de quatro indivíduos da espécie Santagnathus mariensis foram encontrados na região de Santa Maria e entregues para pesquisadores

O Rio Grande do Sul é o único estado brasileiro em que se encontram fósseis do período Triássico, com mais de 200 milhões de anos de idade. Entre as explicações vem do fato de que em pelo menos parte dessa época o mapa da Terra ainda era formado pelo supercontinente Pangeia e o território gaúcho integrava um imenso deserto junto ao que conhecemos hoje como o continente africano – território habitado por uma quantidade abundante de cinodontes, um grande grupo que, posteriormente, deu origem aos mamíferos. E é justamente uma nova espécie de cinodonte traversodontídeo que foi recentemente encontrada por pesquisadores da UFRGS no Triássico brasileiro. O Santagnathus mariensis, um animal que viveu há 233 milhões de anos foi identificado a partir de fósseis encontrados na cidade de Santa Maria e doados para a Universidade por um morador da região.

“O doador era um entusiasta da Paleontologia. É um projeto incrível, um material muito bom. A gente não precisou fazer nada de físico no fóssil, foram só comparações”, explica Maurício Rodrigo Schmitt, Doutorando do PPG Geociências da UFRGS e líder da pesquisa. Segundo o pesquisador, para a identificação de uma nova espécie é preciso observar diferentes características, principalmente a partir do crânio. “Se a gente determinar que [os fósseis] têm características distintas o suficiente, a gente descreve uma espécie nova”, resume Maurício que, para realizar comparações morfológicas e análises filogenéticas, se valeu do conhecimento sobre as espécies já pesquisadas na região e no conhecimento sobre o tipo de rocha em que os fósseis foram encontrados.

Doutorando do PPG Geociências da UFRGS, Maurício Rodrigo Schmitt lidera a pesquisa que identificou a nova espécie — Foto: Gustavo Diehl/UFRGS

Doutorando do PPG Geociências da UFRGS, Maurício Rodrigo Schmitt lidera a pesquisa que identificou a nova espécie — Foto: Gustavo Diehl/UFRGS

A partir da identificação da nova espécie, espera-se reunir mais insumos para definir formas ou comportamentos dos traversodontídeos, mas essa não é tarefa fácil para os paleontólogos. No final do período Triássico, estima-se que o início da separação dos continentes causou não só um aumento na erupção vulcânica, mas um processo extremo de mudanças climáticas, resultando na extinção em massa de diversos animais. Entre os cinodontes, apenas o grupo Probainognathia – clado que inclui os ancestrais dos mamíferos – sobreviveu.

Nenhum animal vivo que conhecemos, portanto, está diretamente relacionado ao clado Traversodontidae. Uma das únicas certezas que se tem sobre a espécie é relacionada à alimentação, com base na morfologia dos dentes, que aponta uma dieta herbívora. Nem mesmo a forma de reprodução pode ser confirmada. “O mais aceito até agora é que eles colocavam ovos. Os mamíferos mais antigos que conhecemos, como o ornitorrinco, colocam ovos. Então podemos supor que os animais que vieram antes deles também se reproduziam assim”, pontua Maurício.Também estima-se (de forma não oficial) que o animal teria de 1,2 a 1,5 metro de comprimento e uma massa de 9 a 16 quilos.

Costelas do Santagnathus mariensis, uma parte dos fósseis coletados em 2003 por um morador local e posteriormente doados ao Laboratório de Paleontologia de Vertebrados da UFRGS  — Foto: Gustavo Diehl/UFRGS

Costelas do Santagnathus mariensis, uma parte dos fósseis coletados em 2003 por um morador local e posteriormente doados ao Laboratório de Paleontologia de Vertebrados da UFRGS — Foto: Gustavo Diehl/UFRGS

Os fósseis do Santagnathus mariensis encontrados em Santa Maria totalizam quatro indivíduos, identificados a partir das mandíbulas, sendo duas maiores e duas menores. “A gente pode tentar assumir que esses quatro indivíduos estavam meio juntos, que são pai e mãe. Então talvez eles andavam em pequenos bandos. Mas é muito difícil a gente inferir comportamento com registros fósseis”, ressalta o pesquisador.

A descoberta foi publicada no final de maio no periódico The Anatomical Record. O artigo ainda propõe, com base em um conjunto de caracteres, a validação de uma espécie argentina de traversodontídeo, o Proexaeretodon vincei. O estudo contou com a colaboração de Cesar Leandro Schultz, coordenador do Laboratório, e de pesquisadores do Museo Argentino de Ciencias Naturales Bernardino Rivadavia e do Museu Nacional da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ).