Escassez relativa e escassez seletiva
A água é para todos?
Levados à radicalidade da pergunta, podemos dizer que sem água morremos. Nosso corpo precisa de muita água para viver e realizar suas funções básicas. E nosso organismo desidrata com facilidade. A desidratação severa leva à morte.
Levada à condição global, a do Planeta, a água não é tão abundante quanto se pensa. 96% dela é imprópria ao consumo e pertence aos mares e aos oceanos.
Os 4% restantes estão desigualmente distribuídos.
Há populações que se veem privadas de água quase permanentemente – como na Africa sub-saariana – vivendo com necessidade continuada e precária de abastecimento.
Há ainda a privação sazonal, aquela que depende das estações de chuvas.
Outra informação que nos escapa, é que a maior quantidade de água é consumida na agricultura.
As megacidades, que não são poucas, e que concentram grande contingente populacional, como NYC, Jacarta, México, Brasil, consomem grande quantidade de água – com dificuldades cada vez maiores de conseguirem a água que precisa no entorno: vão buscar longe em rios e reservatórios a quilômetros de distância.
Calcula-se que já vivemos no Planeta um ‘estado de escassez relativa’ de água.
No detalhe, no zoom, as grandes cidades brasileiras já vivem em estado de ‘escassez seletiva’: bairros são ‘sorteados’ para ficarem sem água alguns dias da semana, outros à noite.
Além de estruturalmente escassa, a água passa por regulamentações de uso e passou paulatinamente de bem comum para o status de produto caro.
Assim, a qualidade da água, tão importante para a saúde humana pode ser adquirida na qualidade bia, regular e ótima. Sendo esta última categoria a água engarrafada ou comprada em galões pela população.
O serviço de abastecimento, ou de provimento universalidade água é cada vez mais caro e os estratos mais pobres têm dificuldade de pagá-los.
Água bem comum ou negócio, estatal ou privada virou um debate que na prática significa: qual o melhor sistema para dar a maior e a melhor cobertura na provisão de água?
Não é um debate em vias de conclusão. O mundo experimenta diversos modelos. Há países que privatizaram o serviço de água e agora voltam atrás. No Brasil caminhamos a passos largos para a privatização.
Na moldura maior, temos que enfrentar como globo, nação e localidades o fenômeno das mudanças climáticas. Está em curso uma mudança radical no regime climático de produção de água. Isso afetará os negócios, afetará o conjunto das necessidades e provavelmente demandará novas soluções.
A tecnologia tenta dar algumas. A principal delas é olhar para o mar. Mas a dessalinização tem limites. O que faremos com os crescentes depósitos de sal? Talvez os levemos para Marte…
As ‘soluções ilícitas ‘ também caminham: o roubo de água, o mercado paralelo de água nas favelas, os ‘gatos’, a bandidagem cobrando mais de quem pode menos.
Estes são apenas algumas bolas que podemos levantar, numa primeira abordagem.
De uma coisa sabemos: sem água perecemos.
(Este texto foi escrito para ser apresentado na mesa 1 do encontro Cidades Verdes, organizado pela Onda Azul, cujo tema principal é o uso sustentável da água, dias 17 e 18 de outubro)