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Você tem medo? Estudo identifica rota cerebral que leva a esse sentimento

Você tem medo? Estudo identifica rota cerebral que leva a esse sentimento

Em pesquisa com camundongos, cientistas dos Estados Unidos identificaram circuito neural que faz o estresse provocar quadros de medo generalizado

Um estudo publicado na revista Science na última quinta-feira (14) revela que o sistema nervoso humano está naturalmente programado para sentir medo — como quando ouvimos ruídos estranhos no escuro ou quando um animal que está rosnando se aproxima.

A resposta ao medo serve como um aviso para que a pessoa permaneça em alerta, servindo como mecanismo de defesa para evitar situações perigosas. Entretanto, se o indivíduo sentir medo sem estar diante de situações ameaçadoras, seu bem-estar pode ser prejudicado.

Pessoas que vivenciaram incidentes de risco de vida ou estresse grave podem ter medo em episódios que não apresentam uma real ameaça. E isso pode gerar danos psicológicos a longo prazo, como o transtorno de estresse pós-traumático (TEPT).

A nova pesquisa foi realizada por neurobiólogos da Universidade da Califórnia em San Diego, nos EUA. A equipe identificou quais mudanças ocorrem na bioquímica do cérebro e mapeou os circuitos neurais que causam o medo generalizado.

Caminho do medo

A equipe estudou a área do cérebro de camundongos conhecida como rafe dorsal, localizada no tronco cerebral. A análise indica que o estresse agudo ocasionava uma mudança nos sinais químicos dos neurônios — passando de neurotransmissores excitatórios “glutamato” para inibitórios “GABA”, o que provoca respostas de medo generalizadas.

A área dorsal da rafe do cérebro fotografada usando microscopia confocal. — Foto: Laboratório Spitzer, Universidade da Califórnia em San Diego
A área dorsal da rafe do cérebro fotografada usando microscopia confocal. — Foto: Laboratório Spitzer, Universidade da Califórnia em San Diego

“Nossos resultados fornecem informações importantes sobre os mecanismos envolvidos na generalização do medo”, diz Nicholas C. Spitzer, membro do Departamento de Neurobiologia da Universidade da Califórnia em San Diego, em comunicado.

“O benefício de compreender esses processos nesse nível de detalhe molecular – o que está acontecendo e onde está acontecendo – permite uma intervenção que é específica para o mecanismo que impulsiona os distúrbios relacionados [ao medo]”, acrescenta Spitzer.

A mudança nos neurotransmissores impulsionado pelo estresse foi considerada uma forma de plasticidade cerebral. Com essa nova descoberta, os pesquisadores examinaram o cérebro de pessoas post-mortem que sofriam com TEPT e confirmaram uma troca semelhante de neurotransmissores (de glutamato para GABA).

A equipe encontrou ainda uma forma de impedir o medo generalizado: na rafe dorsal dos ratinhos, foi injetado um vírus adeno-associado (AAV) capaz de suprimir o gene responsável pela síntese de GABA. Esse método conseguiu evitar que o medo generalizado fosse adquirido pelos animais. Além disso, após um evento estressante, os ratos foram tratados com o antidepressivo fluoxetina.

Os pesquisadores conseguiram identificar a localização dos neurônios — capazes de trocar os transmissores — e sua ligação com a amígdala central e o hipotálamo lateral. Essas regiões cerebrais estão relacionadas a outras respostas de medo.

“Agora que temos uma ideia do núcleo do mecanismo pelo qual o medo induzido pelo stress acontece e dos circuitos que implementam esse medo, as intervenções podem ser direcionadas e específicas”, observa Nicholas C. Spitzer.