Anchor Deezer Spotify

Ruídos captados por balões na estratosfera terrestre viram mistério para cientistas

Ruídos captados por balões na estratosfera terrestre viram mistério para cientistas

À primeira vista, a estratosfera da Terra parece calma e silenciosa. Mas, quando pesquisadores lançaram balões movidos a energia solar a 20 quilômetros de altitude, eles detectaram um mundo acústico oculto, com ruídos misteriosos sem origem conhecida.

Os ruídos são “infrassons”, inaudíveis ao ouvido humano – assim como a luz no espectro infravermelho é invisível ao olho humano. Quando gravados com instrumentos especiais e acelerados milhares de vezes, soam como sussurros abafados.

Alguns sons captados pelos balões têm uma fonte clara: um murmúrio baixo, parecido com o suspiro que você ouve quando põe uma concha perto do ouvido, é o som distante das ondas do mar batendo umas nas outras. Mas outras crepitações intermitentes desafiam a explicação.

“Passamos muito tempo discutindo sobre o que as coisas são”,

disse Siddharth Krishnamoorthy, tecnólogo de pesquisa do Laboratório de Propulsão a Jato da Nasa em Pasadena, Califórnia.

“Faço isso há uns dez anos, e o fato de haver sons misteriosos que não entendo é preocupante, mas não chega a ser uma revelação”,

disse Daniel Bowman, cientista do Laboratório Sandia, que constrói e lança os balões movidos a energia solar. Bowman está apresentando seu mais recente trabalho esta semana no 184º encontro da Sociedade Acústica da América, em Chicago.

“Mas é engraçado falar com pessoas como você, que dizem, ‘Espere aí, como é que é? Vocês estão ouvindo coisas?’ Sim, estamos. Mas, não, não sabemos o que é”.

Compreender os sons é mais do que uma busca intelectual. Cientistas que lançam balões na Terra querem usar nosso planeta como uma plataforma de teste para interpretar gravações para que possamos um dia enviar balões semelhantes para estudar outros mundos.

50 dólares em fita adesiva, folhas de plástico e pó de carvão

O empreendimento dos balões flutuantes na estratosfera da Terra tem uma tecnologia surpreendentemente baixa.

Bowman constrói balões de ar quente movidos a energia solar usando materiais comuns que você pode encontrar na loja de ferragens: folhas de plástico para pintores, fita adesiva, pó de carvão. Para evitar que suas criações sejam confundidas com balões espiões ou que interfiram em aeronaves, ele avisa a Administração Federal de Aviação sobre seus experimentos.

O sol aquece o ar dentro do balão, deixando-o menos denso que o ar externo, e aí ele vai embora. O balão atinge a estratosfera antes do pôr do sol, quando a mudança de temperatura faz com que ele desça. Os balões vão para onde o vento os sopra – um deles viajou desde o centro do Novo México até os arredores de Houston.

Bowman inicialmente se interessou em usar balões para medir erupções vulcânicas em pontos da Terra que não têm grande vigilância. Um balão flutuando acima de uma região vulcanicamente ativa poderia detectar as ondas sonoras geradas por uma erupção e avisar os aviões para alterarem suas trajetórias de voo.

Mais recentemente, os balões foram usados como monitores de terremotos. As ondas sísmicas geradas pelos terremotos se movem pela terra, mas também criam ondas sonoras que se movem pelo ar. Cientistas provaram que é possível detectar uma série de terremotos de perto ou de longe usando esse método.

Uma rede de balões conseguiu medir um grande terremoto de magnitude 7,3 a quase 3.200 quilômetros de distância. De perto, os balões detectaram terremotos muito menores.

Provar que tais medições podem funcionar e são precisas fornecerá informações básicas para futuras medições extraterrestres.

O desafio é “descobrir como fazer isso na Terra e depois exportar para Vênus”, disse Bowman.

Balões em Vênus

Na década de 1980, cientistas soviéticos lançaram balões sobre Vênus como parte das missões Vega 1 e 2. Os balões, projetados para fazer medições atmosféricas, coletaram e transmitiram dados por cerca de 46 horas.

Agora que a ciência da acústica dos balões avançou, os pesquisadores querem voltar. A questão de saber se Vênus é vulcanicamente ativo se tornou central na tentativa de entender por que virou um planeta inabitável, apesar de ser tão semelhante à Terra. A atividade no interior dos planetas está intimamente ligada a como as condições na superfície evoluem e influenciam suas atmosferas.

Mas, em um planeta onde a superfície é muito quente e a pressão, muito alta, os instrumentos sísmicos terrestres não duram o suficiente para fazer o trabalho. A atmosfera, por outro lado, é um pouco mais amena – mais temperada, com pressões mais toleráveis nas alturas onde um balão de Vênus movido a hélio flutuaria, algo em torno de 50 quilômetros de altitude.

E a densidade da atmosfera traz uma vantagem para medições sísmicas aéreas: será mais fácil detectar as ondas de pressão de eventos sísmicos.

Krishnamoorthy disse que, se um tremor de magnitude 5 sacudisse Vênus, por exemplo, o sinal atmosférico captado por um balão seria cerca de 60 vezes mais forte do que o gerado por um terremoto equivalente na Terra.