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O melhor amigo das crianças: por que elas devem conviver com cachorros

O melhor amigo das crianças: por que elas devem conviver com cachorros

Especialistas explicam como a relação entre crianças e animais contribui para o desenvolvimento e o fortalecimento do sistema imunológico infantil

Você já deve ter ouvido por aí aquela expressão que diz que os cães são os melhores amigos do homem. Mas o que talvez seja uma novidade é descobrir que essa relação de amizade e companheirismo promove diversos benefícios também para crianças. Algumas pesquisas, inclusive, apontam fortalecimento significativo no sistema imunológico e demais áreas do comportamento dos pequenos que convivem com cachorros em casa.

Para Gisélia Batista, psicopedagoga e neuropsicopedagoga, ter um animal de estimação é uma ótima oportunidade para auxiliar no desenvolvimento infantil. Além de conceder autonomia, responsabilidade e ensinar sobre vínculo, os pets são fonte de estímulos sensoriais, motores, cognitivos, emocionais, sociais e comportamentais.

“Cachorros são companheiros carinhosos que estimulam nossos filhos a aprimorar seu afeto, inteligência, comunicação não verbal, a criar vínculos, interpretar os sentimentos e necessidades de outro ser. Essa relação ajuda a trabalhar empatia e o respeito pelo outro. O convívio com os bichos os ensina a serem mais pacientes e tolerantes com todos a sua volta”, afirma a especialista.

Neste sentido, crianças que não tiveram a chance de desenvolver suas relações fora de casa durante o isolamento causado pela pandemia da Covid-19, podem ter se beneficiado das relações com seus “cãopanheiros”. Letícia Casonatto, psicopedagoga especialista em Intervenção Assistida por Animais (IAA), conta que essa interação ajudou muitos jovens a se sentirem menos solitários neste período.

Crianças que possuem cães em casa tendem a ser mais ativas, de acordo com os especialistas (Foto: Canva / Creative Commoms)Crianças que possuem cães em casa tendem a ser mais ativas, de acordo com os especialistas (Foto: Canva/ Creative Commoms)

“Ouvimos relatos de pais que contavam que os cães acompanhavam seus ‘mini tutores’ durante as aulas online – no colo ou no mesmo cômodo. Esse vínculo ajudou no desempenho acadêmico, reduziu a ansiedade, aumentou a segurança e promoveu momentos de descontração em tempos dificeís”, diz Letícia.

Benefícios físicos e psicológicos

Se alguma vez você se sentiu mais calmo depois de uma sessão de carícias com seu pet, não foi coincidência. Os especialistas explicam que o ato de acariciar o bicho proporciona aumento da serotonina no corpo, hormônio responsável pela sensação de bem-estar, prazer e diminuição do estresse.

Já no campo da autonomia, ter um pet em casa também promove um senso de responsabilidade. Levando em conta a idade do filho, os pais podem designar tarefas – que devem ser realizadas sempre com o acompanhamento de um adulto – para o dia a dia.

Por exemplo, cuidar dos horários do cachorro, repor a água ou comida, levar para passear, realizar brincadeiras, escovar os pelos, acompanhar a ida ao pet shop, participar da hora do banho ou até mesmo da hora de dormir.

O companheirismo dos cães para com seus pequenos tutores foi importante durante a pandemia (Foto: Canva / Creative Commoms)
O companheirismo dos cães para com seus pequenos tutores foi importante durante a pandemia (Foto: Canva/ Creative Commoms)

Essas pequenas obrigações empoderam a criança e a faz se sentir mais confiante e pertencente a rotina familiar. Além disso, Gisélia conta que os passeios e as brincadeiras, apesar de parecerem inocentes, estimulam o desenvolvimento das habilidades motoras infantis. “Em um mundo que se preocupa tanto com os níveis de sedentarismo e o aumento da obesidade em jovens, quanto mais envolvida com esses cuidados básicos do pet, mais ativa a garotada será. O cão será um incentivo para que eles troquem a tela pelas atividades do ‘mundo real’”.

E a imunidade, como fica?

André Manso, médico alergista e imunologista pediátrico das unidades ambulatoriais do Hospital Israelita Albert Einstein, acredita que, desde que os tutores responsáveis pelo cão prestem atenção à saúde do animal, o contato entre os peludos e os mais novos não oferece grandes riscos.

“O contato precoce com animais domésticos não aumenta a chance do surgimento de alergias. Pelo contrário, alguns trabalhos mostram que essa interação ajuda na prevenção de doenças autoimunes e fortalece o sistema imunológico infantil. Durante a gravidez, o bebê praticamente não possui contato com bactérias maternas, sendo o útero um ambiente quase ‘estéril’. Após o nascimento, a criança vai interagir com milhares de substâncias diferentes nunca vistas antes por seu organismo”, aponta.

O médico explica que é função do sistema imune evoluir e aprender a determinar o que é bom ou ruim para o corpo. Essa capacidade de “seleção”, que na medicina é chamado de tolerância, evolui e se aperfeiçoa com o tempo.

Nas palavras do imunologista, quanto mais diferente e diversificada for essa exposição, principalmente nos primeiros dois anos de vida, melhor será o desenvolvimento imunológico. Ou seja, o contato com os cães coloca o sistema em uma espécie de treinamento intensivo para que, no futuro, os anticorpos estejam preparados para combater novos organismos.

Brincadeiras entre cães e crianças devem ser supervisionadas por um adulto (Foto: Canva / Creative Commoms)
Brincadeiras entre cães e crianças desenvolvem o sistema motor infantil (Foto: Canva/ Creative Commoms)

Existe uma teoria famosa dentro da medicina, inclusive, chamada de hipótese da higiene, desenvolvida em 1989, que acredita que um dos fatores determinantes para o aumento das alergias em todo o mundo pode ter relação com a falta de exposição com substâncias naturais do meio ambiente que ajudariam a desenvolver o sistema imune infantil. Entende-se que este cenário leva a um desbalanço facilitator para o aparecimento de doenças alérgicas e autoimunes.

Como relembra Bruna Rusig, médica especialista pela Associação Brasileira de Alergia e Imunologia (ASBAI), um estudo finlandês de 2019, que avaliou crianças desde o nascimento, compreendeu que aquelas que cresceram com cães em casa, quando chegaram aos 5 anos, tiveram 40% menos asma, 28% menos rinite e 23% menos exames positivos para todos os alérgenos.

“São necessárias mais pesquisas para confirmar esses e outros resultados. Não podemos simplesmente recomendar que famílias optem por ter um pet dentro de casa com o intuito de prevenir alergia no bebê, mas é o suficiente para demonstrar que, aqueles que têm vontade de adotar ou que já possuem animais em casa, não precisam se desfazer do bicho com a chegada do filho”, garante a médica.

Os cuidados durante a interação

O alerta fica para as crianças que já possuem doenças alérgicas – dermatite atópica, asma ou rinite, por exemplo. Nesses casos, a recomendação é investigar para entender se o quadro piora após o contato com o cachorro e avaliar cada caso individualmente com acompanhamento médico. “Mesmo assim, isso não significa que a criança não vai poder ser tutora de um animal ou brincar com ele por algumas horas”, tranquiliza André.

Nestes caso, Bruna orienta que a família busque por alternativas capazes de controlar os sintomas e reduzir a sensibilidade da criança ao seu cão. Entre as sugestões citadas pela especialista, a imunoterapia, as famosas vacinas para alergia, são um tratamento bastante eficaz e seguro.

“Ela ‘ensina’ o sistema imunológico a não ser tão sensível às proteínas que estão presentes no pet, reduzindo sintomas e possibilitando uma melhor convivência da criança com o animal”, garante.

É importante que adultos estejam presente durante as interações entre as crianças e os animais, principalmente os de grande porte (Foto: Canva / Creative Commoms)
É importante que adultos estejam presentes durante as interações entre as crianças e os animais, principalmente os de grande porte (Foto: Canva/ Creative Commoms)

Fora isso, a atenção redobrada ao calendário vacinal do pet, à vermifugação e à higienização correta do animal após passeios e saídas de casa é essencial. Dessa mesma forma, respeitar as peculiaridades comportamentais do cão é imprescindível para qualquer lar.

“Os pais devem ensinar seus filhos a perceber o limite de seus cãopanheiros e os sinais de possível desconforto, sensibilidade que não faz parte do repertório infantil, para diminuir as chances de possíveis acidentes domésticos. Por mais dócil que o cachorro seja, ele pode, por instinto, reagir de maneira agressiva. Por isso todo convívio e interação, principalmente com bebês, deve ser supervisionado por um adulto”, orienta Letícia.

Aconteceu em casa

Para Greici Gabbardo, 37, a amizade construída entre Lorenzo, seu filho de 5 anos, e Tedy, o cachorro da família, foi transformadora. O pet chegou quando a gestação ainda era um sonho distante da professora, há 10 anos. Depois do teste positivo, se despedir do cãopanheiro não era uma opção.

“A relação deles sempre foi muito próxima, desde quando o Lorenzo ainda estava na minha barriga. Logo após seu nascimento, isso só se ampliou. Hoje, o Tedy que tem quase 40 kg e dorme no mesmo quarto que ele”, relata a mãe.

Greici ainda relembra que, ao chegar do hospital com um bebê no colo, com objetivo de estreitar os laços e apresentar oficialmente o novo morador, decidiu deixar o pet cheirar o bebê. “Apesar dele ser grande, nunca nos deu problema, sempre que podem, os dois brincam juntos. Quanto aos benefícios, o Lorenzo voltou a dormir no quarto dele sozinho faz pouco, e se sente mais seguro divindo o espaço com o Tedy.”

Camilla Lima, 33, ilustra outra relação positiva entre pet e crianças. Laura, sua menina de 5 meses, é a fiel companheira de Galo Louco, um golden retriever de 5 anos. A interação, que começou quando a criança ainda estava em sua barriga, tem se mostrado essencial para o desenvolvimento da filha.

O nome Galo Louco foi dado em homenagem ao time Atlético Mineiro (Foto: Canva / Creative Commoms)
O nome Galo Louco foi dado em homenagem ao time Atlético Mineiro (Foto: Canva/ Creative Commoms)

“Ela grita pra o Galo na tentativa de se comunicar com ele com vários sons diferentes. A Laura também bate os bracinhos, como se estivesse chamando o cachorro, repetindo os movimentos que faço. Fora isso, a vejo sorrindo e exercitando a concentração quando observa suas atividades. Dá para ver que é uma interação que deixa ambos felizes e curiosos”, observa a mãe.

Por fim, a empresária conta que entende essa conquista como um resultado positivo de uma adaptação coerente e paciente. “Tivemos muito cuidado em não mudar a rotina dele para que não houvesse uma associação negativa com a chegada do bebê. Fizemos questão de introduzi-lo em todo o processo de criação do quarto, por exemplo, e sempre demos muita atenção e carinho pra ele. Afinal, o Galo era filho único antes da laura, né?”, brinca entre risos.

Não esqueça!

Todos esses motivos não são o suficiente para decidir adotar um pet – seja um cão ou qualquer outro animal. Antes de bater o martelo na decisão, é importante que os adultos planejem a chegada do bicho em casa ponderando as questões financeiras, espaço disponível, tempo para cuidados, etc.