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Novo olhar sobre fósseis humanos pode reescrever história da nossa evolução

Novo olhar sobre fósseis humanos pode reescrever história da nossa evolução

Segundo estudo, reanálises sobre fósseis sugerem que H.sapiens estava na Europa há pelo menos 210 mil anos — mais de 150 mil anos antes do que se pensava

Uma nova revisão de estudos publicada ontem (21) na revista Quaternary Science Reviews mostra que reanálises feitas sobre fósseis descobertos ao redor do mundo poderiam reescrever o que se sabe sobre a evolução humana.

Rainer Grün, da Universidade Nacional Australiana em Canberra, e Chris Stringer, do Museu de História Natural de Londres, relatam os avanços da redatação do Homo floresiensis, o “Hobbit das Flores”, que foi datado mais recentemente como sendo de 60 mil anos atrás, embora tenha sido originalmente estimado com cerca de 18 mil anos.

O esqueleto contendo a caixa craniana do hominídeo foi descoberto em 2003 na caverna de Liang Bua, localizada na Ilha de Flores, na Indonésia. A discrepância de idade ocorreu pois os pesquisadores dataram sedimentos muito mais jovens que estavam próximos ao esqueleto de floresiensis, gerando uma verdadeira confusão.

Crânio de Homo Floresiensis — Foto: Wikimedia Commons
Crânio de Homo Floresiensis — Foto: Wikimedia Commons

Revisão de método

Os métodos tradicionais de datação normalmente se baseiam na análise de sedimentos nos quais os fósseis foram encontrados ou na decomposição de elementos radioativos — especialmente a datação por radiocarbono, que, contudo, é eficaz apenas em fósseis mais jovens que 50 mil anos.

Em vez de disso, os coautores do estudo usaram a datação direta por séries de urânio, que é capaz de datar espécimes com centenas de milhares de anos ao medir a proporção de isótopos de urânio em fósseis.

Além disso, os pesquisadores desenvolveram maneiras precisas de acessar o interior dos artefatos, evitando danos estruturais. “O problema com os ossos é que eles são um sistema aberto”, explica Stringer, em comunicado. “O urânio pode entrar no osso, permitindo que seja datado, mas mais pode ser adicionado ou lavado ao longo do tempo”.

Anteriormente, era preciso cortar um fóssil ao meio para rastrear o urânio em sua integridade, mas isso não é viável em fósseis valiosos como os que a equipe analisou. Por isso, o pesquisador conta que seu colega, Grün, ajudou a “miniaturizar o processo, para que pequenas amostras pudessem ser retiradas usando lasers para minimizar danos em áreas importantes do espécime”.

Fragmentos de crânio encontrados na caverna Apidima, na Grécia — Foto: Katerina Harvati, Eberhard Karls/University of Tübingen
Fragmentos de crânio encontrados na caverna Apidima, na Grécia — Foto: Katerina Harvati, Eberhard Karls/University of Tübingen

Um dos vários destaques da pesquisa é a Caverna Apidima, na Grécia, onde foram descobertos dois crânios parciais que pareciam pertencer anatomicamente a duas espécies diferentes: um neandertal e um Homo sapiens primitivos.

H.sapiens foi datado por séries de urânio como sendo 40 mil anos mais antigo do que os restos de neandertal. Isso gerou dúvidas em cientistas, já que, cronologicamente, os neandertais aparentemente estavam presentes na Europa muito antes dos sapiens. Supôs-se então que os fósseis eram, na verdade, de uma única população de neandertais com características distintas.

Mas análises adicionais de Grün e Stringer apresentadas no novo estudo apontam que havia, sim, H.sapiens e neandertais na caverna. Porém, eles foram originalmente depositados em ambientes geológicos diferentes e, posteriormente, deslocados novamente juntos.

A descoberta indica que o H.sapiens estava realmente presente na Europa há pelo menos 210 mil anos — mais de 150 mil anos antes das ideias anteriores sobre quando esses humanos migraram pela primeira vez para o continente.

Outra reavaliação fascinante se deu com base nos restos encontrados de Homo luzonensis na Caverna Callao, nas Filipinas, em 2010. Antes, as estimativas eram que o hominídeo tinha cerca de 65 mil anos, mas acredita-se agora que tenha pelo menos 130 mil anos. Isso deixa menos provável uma hipótese anterior de que a espécie poderia ter coexistido com os primeiros H. sapiens na região.

Agora, os pesquisadores esperam que mais pessoas no campo voltem e ampliem o trabalho de datação desses e de outros fósseis. Os especialistas também acreditam que mais trabalho deve ser feito para encontrar novos locais contendo restos humanos primitivos. Por exemplo, áreas como a Arábia, o subcontinente indiano, sudeste asiático e África central e oeste ainda não foram tão investigadas.