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Hábitos dos jovens estão ligados ao aumento do risco para doenças crônicas

Hábitos dos jovens estão ligados ao aumento do risco para doenças crônicas

O relatório Covitel 2023 traz novos dados sobre o comportamento da população no que se refere a alimentação, práticas físicas, saúde mental e consumo de inebriantes

Dados de 2023 do Inquérito Telefônico de Fatores de Risco para Doenças Crônicas Não Transmissíveis em Tempos de Pandemia (Covitel) destacam que a população jovem adulta, de idades entre 18 e 24 anos, deve ser o foco das políticas públicas de saúde preventiva. Segundo a pesquisa, o grupo está mais ansioso, tem abusado do álcool, lida com a obesidade e tem a pior alimentação entre todas as faixas etárias.

Realizado pela Vital Strategies, em parceria com a Universidade Federal de Pelotas (UFPel), a Associação Umane e a Associação Brasileira de Saúde Coletiva (Abrasco), o levantamento contou com uma amostragem de 9.038 pessoas maiores de 18 anos, representantes das cinco regiões do país. A coleta se deu por meio de entrevistas feitas por ligações no telefone fixo e celular e os resultados, publicados na quinta-feira (29), podem ser consultados gratuitamente de forma online.

“As doenças crônicas não transmissíveis são as maiores causas de morte no mundo. Assim, entender o comportamento da população brasileira quanto aos fatores de risco é fundamental para orientar as prioridades, o planejamento e as ações relacionadas às saúde”, afirmou Pedro de Paula, diretor da Vital Strategies, no evento de lançamento do relatório.

Alimentação

No que se refere ao consumo de uma dieta saudável, os dados de 2023 apontam que 45% da população acima dos 18 anos alimentam-se regularmente de verduras e legumes – taxa que apresenta uma melhora na comparação com 2022 (39,5%) e o período pré-pandemia (45,1%). Da mesma forma, o consumo regular de frutas também melhorou, saltando de 38,4% em 2022 para 41,8% em 2023; mas ainda não atingiu a média anterior à Covid-19, de 43%.

Em comparação às outras faixas etárias do relatório, os indivíduos de 18 a 24 anos têm as mais baixas taxas de prevalência do consumo regular tanto de legumes e frutas (39,2%) quanto de frutas (33,5%).

Além das porcentagens, o relatório também identificou os perfis socioeconômicos de destaque nessas respostas. No caso, as boas práticas na alimentação estão presentes, sobretudo, entre os grupos das mulheres, com 65 anos ou mais, de escolaridade média completa, brancos e da região Sul.

Em relação ao consumo regular de refrigerantes e sucos artificiais, a pesquisa indicou um leve aumento de 2022 (16,8%) a 2023 (17,8%). Apesar disso, o valor ainda está abaixo da média pré-pandêmica (22,5%). O hábito não saudável é encontrado principalmente entre os mais jovens (24,3%).

Em 2023, o país apresentou os piores resultados na ocorrência de pessoas com excesso de peso (IMC ≥ 25 Kg/m²) e obesidade (IMC ≥ 30 Kg/m²). No primeiro cenário, o número saltou de 52,6% para 56,8%; já no segundo, o aumento foi menor, de 21,7% para 22,8%.

Mais uma vez, os jovens foram destaque negativo, com um aumento de 90% nos casos de obesidade. Em 2022, a ocorrência da doença era de 9%, mas, em 2023, esse percentual subiu para 17,1%.

Saúde física

Segundo os padrões estabelecidos pela Organização Mundial da Saúde (OMS), 150 minutos por semana é o tempo ideal para praticar atividades físicas moderadas ou vigorosas. A partir disso, o estudo identificou uma leve melhora na população em relação ao ano passado: passou de 30,3% a 31,5%. Contudo, esses valores ainda estão abaixo da média antes da pandemia, que era de 38,6%.

Os jovens de 18 a 24 anos também não se encontram em situação favorável nesse quesito, com apenas 36,9% praticando os 150 minutos semanais recomendados.

Além disso, esse grupo é líder em tempo de tela, com 76,1% utilizando dispositivos móveis por três horas ou mais para além do tempo gasto trabalhando ou estudando.

Em relação ao uso excessivo dos computadores, tablets e celulares, a média de toda a população cresceu. Antes da Covid-19, a porcentagem era de 56,3%. Em 2022, o número aumentou para 58,2% e, hoje, está em 59,9%.

Apesar de estáveis, as porcentagens de diagnósticos para doenças como diabetes e hipertensão arterial permanecem altas para todos os adultos. Neste ano, os valores foram registrados em 10,3% e 26,6%, respectivamente.

Também foram apontadas as ocorrências de quadros clínicos de asma ou bronquite asmática (8,8%), doença pulmonar obstrutiva crônica ou enfisema pulmonar (1,6%) e infecção respiratória aguda (2%) entre os entrevistados. Como são novidades no estudo, não há comparações com os anos anteriores.

Outro ponto levantado é a respeito do sono, cuja privação pode agravar a saúde física dos indivíduos. Apenas 59,3% da população dorme de sete a nove horas, tempo recomendado pela Fundação Nacional do Sono. Pelo menos metade dos jovens (54,2%) dormem menos do que isso atualmente.

Uso de inebriantes

O consumo do tabaco ainda é um grande problema para a saúde pública. “O Brasil é um país referência em políticas de controle do produto e muitos avanços foram registrados nas últimas décadas, mas os esforços não podem parar”, aponta Luciana Vasconcelos Sardinha, gerente da Vital Strategies.

Segundo o estudo, o uso de cigarros está diminuindo. Pré-pandemia, o número de usuários era equivalente a 14,7% da população, isso baixou em 2022 para 12,2% e, hoje, está em 11,8%, sendo mais comum entre homens e pessoas de 45 a 54 anos.

“O valor do cigarro convencional está muito barato, uma vez que não há reajuste de preço desde 2016. Isso precisa ser revisto como forma de desincentivar o hábito de fumar”, destaca Sardinha. Além do produto industrializado, o tabaco ainda pode ser encontrado em outros formatos, como em paieros, bolados, charutos, narguilés e, até, cigarros eletrônicos.

Infográfico - Risco para doenças crônicas em jovens — Foto: Divulgação/Covitel 2023

Infográfico – Risco para doenças crônicas em jovens — Foto: Divulgação/Covitel 2023

Cerca de 23,9% dos jovens adultos já usaram pelo menos uma vez na vida cigarro eletrônico. Desses, foram estimados 17,3% de experimentação, 6,1% de uso não diário e 0,5% de uso diário.

Da mesma forma, o levantamento constatou um aumento no uso excessivo de bebidas alcóolicas. Em 2023, o valor que estava em 20,6% subiu para 22,1%. Esses eventos estão, em alguns casos, associados a episódios de violência.

O estudo indicou que adultos entre seus 25 e 44 anos são aqueles que mais apresentaram comportamentos violentos ao consumir álcool. Os dados também apontam que, entre os indivíduos de 35 a 54 anos, estão os maiores níveis de preocupação de terceiros com o consumo excessivo de álcool por essas pessoas.

Neste ano, 32,6% dos jovens relataram ter passado por pelo menos um episódio de consumo abusivo de álcool. A condição equivale a quatro doses ou mais para mulheres e cinco doses ou mais para homens em uma mesma ocasião.

Saúde mental

Por fim, no que diz respeito à saúde mental, a taxa de diagnósticos médicos para depressão e ansiedade são altos para todos os adultos. No caso da depressão, houve uma leve diminuição ante 2022 (13,5%) para 12,7% em 2023, mas o número ainda é maior do que o registrado anteriormente à Covid-19, 9,6%.

Já entre a população de 18 a 24 anos, a taxa de prevalência dessa condição era de 7,7% antes da pandemia. Esse número e cresceu para 14,8% no ano passado e reduziu para 14,1% em 2023.

É a primeira vez que a ansiedade entra no relatório, então, não há parâmetros anteriores para sua comparação. Porém, o registro de 2023 indica uma elevada porcentagem de 26,8% de ocorrência da doença entre a população geral. No caso dos mais jovens, esse número é ainda maior: 32,6%, quase uma a cada três pessoas.

Políticas públicas

“Os jovens não estão cuidando da saúde como deveriam”, pondera Pedro de Paula. “Isso acende um importante alerta sobre os desafios para os sistemas de saúde que estão por vir. Entre eles, a saúde da população brasileira no longo prazo e a viabilidade econômica de se financiar um sistema sob pressão”.

Dessa forma, os especialistas apresentam o grupo da população mais jovem como o público que precisa da maior atenção no que se refere aos cuidados com as doenças crônicas não transmissíveis. “A princípio, achávamos que esses fatores de risco só afetariam a saúde no futuro, mas, como os dados mostram, isso já está causando problemas”, afirma Érika Aquino, da Vital Strategies.

Ela alerta: “É necessário planejar novas políticas públicas. A saúde é algo cumulativo, e esse quadro pode ser catastrófico, caso essa população chegue ao envelhecimento. Os dados podem refletir até mesmo em um aumento da mortalidade precoce por essas doenças”.

“As doenças não transmissíveis, os acidentes e a violência são pautas prioritárias deste governo. Precisamos criar políticas melhores do que as que fizemos até agora”, afirmou Ethel Maciel, secretária do Ministério da Saúde, que esteve presente no evento de lançamento do documento.