Filmada pela primeira vez reação de oxigênio e hidrogênio formando água
Pela primeira vez, cientistas conseguiram visualizar – em tempo real e em escala molecular – átomos de hidrogênio e oxigênio se fundindo para formar pequenas gotas de água.
O evento ocorreu durante um experimento cujo objetivo era tentar entender como o paládio, um elemento metálico raro e um dos melhores catalisadores que se conhece, otimiza a reação gasosa entre hidrogênio e oxigênio para formar moléculas de água.
Isto significa que, mais do que uma curiosidade científica, testemunhar essa reação em nanoescala revela novas estratégias para acelerar esse processo crucial para praticamente tudo que acontece na Terra – incluindo a vida.
Por exemplo, como o experimento onde a reação estava sendo gerada não requer condições extremas, os pesquisadores acreditam que elas podem ser aproveitadas como uma solução prática para gerar água rapidamente em ambientes áridos – inclusive na Lua e em outros planetas.
“Ao visualizar diretamente a geração de água em nanoescala, fomos capazes de identificar as condições ideais para a geração rápida de água sob condições ambientais,” disse o professor Vinayak Dravid, da Universidade Northwestern, nos EUA. “Essas descobertas têm implicações significativas para aplicações práticas, como permitir a geração rápida de água em ambientes de espaço profundo usando gases e catalisadores metálicos, sem exigir condições extremas de reação.”
[Imagem: Kunmo Koo et al. – 10.1126/sciadv.adj6417]
Nanorreatores
Sabemos que o paládio funciona como um catalisador para gerar água rapidamente desde o início do século passado. Mas como exatamente essa reação ocorre permanecia um mistério.
“É um fenômeno conhecido, mas nunca foi totalmente compreendido porque você realmente precisa ser capaz de combinar a visualização direta da geração de água e a análise estrutural em escala atômica para descobrir o que está acontecendo com a reação e como otimizá-la,” disse o pesquisador Yukun Liu, idealizador do tão esperado experimento.
De fato, visualizar esse processo com precisão atômica era simplesmente impossível até nove meses atrás. Em janeiro de 2024, a mesma equipe descobriu um novo método para analisar moléculas de gás em tempo real. Para isso, eles desenvolveram uma membrana vítrea ultrafina que retém moléculas de gás dentro de nanorreatores em formato de favo de mel, permitindo que elas sejam visualizadas em microscópios eletrônicos.
Além de examinar amostras em pressão atmosférica com uma resolução de meros 0,1 nanômetro – ou 1 ângstrom – a técnica também permitiu, pela primeira vez, realizar simultaneamente análises de informação espectral e recíproca.
Isto possibilitou filmar os átomos de hidrogênio entrando no paládio e expandindo sua rede atômica quadrada. O resultado são pequenas bolhas de água se formando na superfície do metal a partir dos átomos isolados individualmente. “Não era o que estávamos esperando. Por sorte, estávamos gravando, então pudemos provar para outras pessoas que não estávamos loucos,” disse Liu.
[Imagem: Vinayak Dravid/Northwestern University]
Melhor do que reação de “Perdido em Marte”
Após confirmar que a reação do paládio estava realmente gerando água, os pesquisadores começaram a tentar otimizar o processo. Para isso, eles foram adicionando hidrogênio e oxigênio em momentos diferentes, separadamente ou misturados, para determinar qual sequência de eventos gera água na velocidade mais rápida.
Os experimentos mostraram que adicionar hidrogênio primeiro, seguido por oxigênio, levou à taxa de reação mais rápida. Como os átomos de hidrogênio são muito pequenos, eles conseguem se espremer entre os átomos de paládio, fazendo com que o metal se expanda. Basta então adicionar o gás oxigênio.
“Átomos de oxigênio são energeticamente favoráveis para adsorver em superfícies de paládio, mas são grandes demais para entrar na rede,” disse Liu. “Quando fluímos oxigênio primeiro, seus átomos dissociados cobriram toda a superfície do paládio, então o hidrogênio não pôde adsorver na superfície para desencadear a reação. Mas, quando armazenamos hidrogênio no paládio primeiro, e então adicionamos oxigênio, a reação começou. O hidrogênio sai do paládio para reagir com o oxigênio, e o paládio encolhe e retorna ao seu estado inicial.”
A equipe vislumbra que, no futuro, possamos preparar paládio cheio de hidrogênio antes de viajar para o espaço. Então, para gerar água para beber ou para regar plantas, os astronautas precisarão apenas adicionar oxigênio. Embora o experimento tenha-se concentrado em estudar a geração de bolhas em nanoescala, folhas maiores de paládio gerariam quantidades muito maiores de água.
“Pense no personagem de Matt Damon no filme ‘Perdido em Marte’. Ele queimou combustível de foguete para extrair hidrogênio e então adicionou oxigênio de seu oxigenador. Nosso processo é análogo, exceto que dispensamos a necessidade de fogo e outras condições extremas. Nós simplesmente misturamos paládio e gases,” concluiu Dravid.
Artigo: Unraveling the adsorption-limited hydrogen oxidation reaction at palladium surface via in situ electron microscopy
Autores: Yukun Liu, Kunmo Koo, Zugang Mao, Xianbiao Fu, Xiaobing Hu, Vinayak P. Dravid
Revista: Science Advances
Vol.: 121 (40) e2408277121
DOI: 10.1073/pnas.2408277121
Artigo: Ultrathin silicon nitride microchip for in situ/operando microscopy with high spatial resolution and spectral visibility
Autores: Kunmo Koo, Zhiwei Li, Yukun Liu, Stephanie M. Ribet, Xianbiao Fu, Ying Jia, Xinqi Chen, Gajendra Shekhawat, Paul J. M. Smeets, Roberto dos Reis, Jungjae Park, Jong Min Yuk, Xiaobing Hu, Vinayak P. Dravid
Revista: Proceedings of the National Academy of Sciences
Vol.: 10, Issue 3
DOI: 10.1126/sciadv.adj6417