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Como cientistas estão usando inteligência artificial para “falar” com os animais

Como cientistas estão usando inteligência artificial para “falar” com os animais

Pesquisadores estão usando tecnologia disponível em ferramentas como drones, sensores portáteis e gravadores digitais para criar uma “versão zoológica do Google Tradutor”

O mundo ao nosso redor está vibrando com sons que não podemos ouvir. Morcegos chiam e balbuciam em ultrassom (frequência superior àquela que o ouvido do ser humano pode perceber); elefantes murmuram segredos infrassônicos (em ondas sonoras cuja frequência encontre-se abaixo do espectro audível humano) uns para os outros; e os recifes de coral são como clubes aquáticos, agitados com estalos, assobios e toques da vida marinha.

Durante séculos, nem sabíamos que esses sons existiam. Mas, à medida que a tecnologia avança, também aumenta nossa capacidade de ouvir. Hoje, ferramentas como drones, gravadores digitais e inteligência artificial estão nos ajudando a ouvir os sons da natureza de maneiras sem precedentes, transformando o mundo da pesquisa científica e levantando uma perspectiva tentadora: em breve, os computadores poderão nos permitir falar com os animais.

De certa forma, como relata a Scientific American, isso já começou.

“As tecnologias digitais, tão frequentemente associadas à nossa alienação da natureza, estão nos oferecendo uma oportunidade de ouvir os não-humanos de maneiras poderosas, revivendo nossa conexão com o mundo natural”, escreve a pesquisadora canadense Karen Bakker no livro “The Sounds of Life: How Digital Technology Is Bringing Us Closer to the Worlds of Animals and Plants” (“Os sons da vida: como a tecnologia digital está nos aproximando dos mundos dos animais e das plantas”, em tradução livre).

Postos de escuta automatizados foram instalados em ecossistemas ao redor do planeta, desde florestas tropicais até as profundezas do oceano, e a miniaturização permitiu que cientistas colocassem microfones em animais tão pequenos quanto abelhas, ela descreve.

“Combinados, esses dispositivos digitais funcionam como um aparelho auditivo em escala planetária: permitindo que os humanos observem e estudem os sons da natureza além dos limites de nossas capacidades sensoriais”, aponta Bakker.

Todos esses dispositivos criam uma tonelada de dados, o que seria impossível de passar manualmente. Assim, pesquisadores nas áreas de bioacústica (que estuda os sons produzidos por organismos vivos) e ecoacústica (que estuda os sons produzidos por ecossistemas inteiros) estão recorrendo à inteligência artificial para vasculhar as pilhas de gravações, encontrando padrões que podem nos ajudar a entender quais animais estão dizendo um ao outro. Agora existem bancos de dados de cantos de baleias e danças de abelhas, entre outros, que Bakker escreve que um dia poderiam se transformar em “uma versão zoológica do Google Tradutor”, informa a Vox.

Mas é importante lembrar que não estamos necessariamente descobrindo esses sons pela primeira vez. Como Bakker aponta em seu livro, as comunidades indígenas em todo o mundo há muito sabem que os animais têm suas próprias formas de comunicação, enquanto o estabelecimento científico ocidental historicamente rejeitou a ideia de comunicação animal.

Muitos dos pesquisadores que Bakker destaca em seu livro enfrentaram intensa resistência da comunidade científica quando sugeriram que baleias, elefantes, tartarugas, morcegos e até plantas produziam sons e até podiam ter línguas próprias. Eles passaram quase tanto tempo lutando contra a resistência quanto conduzindo pesquisas.

Embora isso pareça estar mudando com nossa maior compreensão dos animais, Bakker adverte que a capacidade de se comunicar com os animais pode ser uma bênção ou uma maldição, e devemos pensar cuidadosamente sobre como usaremos nossos avanços tecnológicos para interagir com o ambiente natural.

Podemos usar nossa compreensão da riqueza sônica de nosso mundo para obter uma sensação de parentesco com a natureza e até potencialmente curar alguns dos danos que causamos, mas também corremos o risco de usar nossos novos poderes para afirmar nosso domínio sobre animais e plantas.