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Com a era dos elétricos, baterias ainda dependem de grandes inovações

Com a era dos elétricos, baterias ainda dependem de grandes inovações

Unidades de íon-lítio vão mover veículos elétricos e também a ampla revolução energética de que precisamos para enfrentar a crise climática. Mas há muito caminho pela frente

Em 2003, Gene Berdichevsky havia ouvido falar de um grupo de empreendedores que estavam pensando em construir carros elétricos esportivos para o mercado estadunidense. Ele era um estudante universitário em Stanford e havia se apaixonado pela indústria de energia – Berdichevsky vinha construindo veículos de pequeno porte movidos por painéis solares e baterias de íon-lítio, usando-os em corridas pelo país.

O então estudante havia calculado que a densidade energética do íon-lítio tornava possível construir carros de verdade que pudessem vencer 500 km com uma única carga – havia até um plano de negócios rascunhado sobre essa mesma ideia. Seis meses depois, ele largou Stanford para se juntar àqueles empreendedores, se tornando o sétimo empregado da Tesla.

Mas com o tempo passado na companhia, sua frustração com o estado da indústria de baterias foi crescendo. “Hoje o mundo inteiro deveria ter adotado os elétricos”, diz. Mas a performance dessa tecnologia chegou a um platô, sua acessibilidade em termos de custo estava desacelerando – e novas soluções que prometiam substituir o íon-lítio ainda estavam décadas distante.

Em 2011, ele fundou a Sila Nanotechnologies com Gleb Yushin, professor de engenharia da Georgia Tech, e Alex Jacobs, um colega da Tesla. A companhia tinha como objetivo fazer baterias 50% melhores com a troca do ânodo – um dos quatro componentes chaves de baterias, junto do cátodo, separador e eletrólito (Íons de lítio passam do ânodo para o cátodo através do eletrólito quando o aparelho é usado, movimento que ocorre na direção oposta enquanto ele está sendo carregado).

O ânodo é geralmente feito de grafita, mas a Sila criou uma versão feita em grande parte de silício modificado, capaz de absorver até 24 vezes mais lítio sem inchar ou degradar – assim uma bateria de tamanho comum é capaz de armazenar mais energia. A ideia pode ser essencial para retirar carbono da aviação e do transporte de cargas. “Essa melhora de 50% que entregamos, com certeza vai possibilitar viagens de longa distância, e a aviação elétrica”, diz Berdichevsky (ainda que reforce que essas viagens de avião provavelmente serão viáveis para voos domésticos curtos).

A Sila trabalha com a BMW e Daimler em veículos elétricos, assim como outras empresas parceiras em eletrônicos de consumo que serão anunciados ainda esse ano. Quando chegarem ao mercado (“dentro de seis meses”, garante Berdichevsky), esses produtos representarão o maior salto em tecnologia para baterias desde os anos 90, quando soluções baseadas no lítio e no cobalto primeiro chegaram aos compradores do Walkman da Sony.

Uma das preocupações sobre o sistema íon-lítio é o impacto negativo que a extração de seus componentes tem sobre o ambiente e comunidades na América do Sul, Ásia e África. Esse problema – e o preço em alta do lítio – é um dos principais motivadores por trás de novas tecnologias em armazenamento de energia surgindo recentemente, como o lítio-enxofre, alumínio-íon e supercapacitores baseados em carbono.

Mas o lítio é um dos menores e mais leves desses elementos. “Suas ligações moleculares são algumas das mais fortes em termos de unidades de peso e volume”, diz Berdichevsky. “Do ponto de vista científico é difícil encontrar um substituto”. Além disso, ele não é exatamente escasso, conclui. É possível obtê-lo da água do mar se preciso.

A estratégia da Sila certamente está dando certo no aspecto do investimento – a empresa conseguiu recentemente aporte de 600 milhões de dólares para uma nova linha de produção, e embora não haja planos de fabricar suas próprias baterias, nos próximos anos ela deve erguer um complexo capaz de providenciar ânodos para células energéticas de um milhão de veículos, ou um bilhão de dispositivos eletrônicos.

Ao focar em apenas um elemento de uma tecnologia ao invés de reinventá-la por completo, a Sila tem sido capaz de oferecer ao mercado melhor armazenamento de energia – e do forma que possa ser integrada a cadeias de produções já existentes – num momento que inovações ainda devem demorar a se viabilizarem. Outros aprimoramentos em elementos diversos da bateria devem melhorar ainda mais a performance do íon-lítio, e nos levar ao patamar necessário para combater a crise climática. “É uma revolução em partes”, resume Berdichevsky.