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Cidadão precisa se reconectar com a natureza e cuidar dela, diz especialista do WWF

Cidadão precisa se reconectar com a natureza e cuidar dela, diz especialista do WWF

Executiva para mudança climática do WWF-Brasil, Renata Camargo conversou com Um Só Planeta sobre maneiras de atuar na questão climática no dia a dia

Nesta quarta-feira (16), o Brasil celebra o Dia Nacional de Conscientização sobre as Mudanças Climáticas. O país já enfrenta fenômenos ligados ao clima extremo e assiste a batalhas políticas, como o recente Ato pela Terra em Brasília. Mas e no cotidiano, onde e como lidar com os desafios climáticos?

O Um Só Planeta conversou com Renata Camargo, especialista em mudanças climáticas do WWF-Brasil, que traz reflexões para impulsionar a tomada de atitude que o momento pede.

“O brasileiro reage muito às consequências. Se está indo tudo bem, vai indo. Quando algo ruim acontece, ele reage. Não é bom que esse seja o nosso tipping point (ponto de inflexão)”, comenta a ambientalista, sobre a necessidade de uma mudança imediata de comportamento, voltado à prevenção e adaptação antes que maiores problemas ocorram.

Segundo demonstram pesquisas, o aquecimento global e suas consequências são vistos como uma realidade alarmante por sete em cada dez brasileiros, que acreditam que as mudanças climáticas podem “prejudicar muito” suas famílias.

Renata Camargo, especialista em mudanças climáticas do WWF-Brasil: "A gente caminha para um cenário em que a necessidade de adaptação vai ficar mais visivel". — Foto: Divulgação

Renata Camargo, especialista em mudanças climáticas do WWF-Brasil: “A gente caminha para um cenário em que a necessidade de adaptação vai ficar mais visivel”. — Foto: Divulgação

A preocupação com outros problemas ambientais também marca presença. Em enquete internacional do Instituto Ipsos, 75% da população mundial é a favor de banir plásticos descartáveis. O apoio dos brasileiros a um pacto mundial do plástico, como o que a ONU vem negociando, chega a 95% dos cidadãos.

Bora organizar pequenos grupos

Para Renata, a ação individual não deve ser menosprezada, mas ganhar um empurrãozinho para se tornar algo mais, seja no condomínio ou na região onde as pessoas vivem. “A gente pode fechar a torneira, trocar menos de celular, mas quando temos escalas maiores, como quando nos unimos com nosso bairro para captar água da chuva, para reduzir o consumo de energia, isso traz pequenas transformações sistêmicas maiores”, pondera.

Contato com a natureza

A rotina de notícias alarmantes sobre o futuro do planeta vem gerando ecoansiedade, um distúrbio emocional catalogado e que causa sensação de impotência e depressão, principalmente entre os jovens.

Renata sugere uma atitude simples para melhorar esse panorama: entrar em contato com a natureza, para o que ela chama de “reconexão”.

“Nos tornamos muito urbanizados, a água chega no cano, o fogo no botijão de gás. Não temos mais a noção de que isso vem da natureza”, analisa a executiva do WWF. “Plantar uma árvore e ver o processo natural do tempo vai te reintegrar no processo mental e biológico, isso vai reduzir os processos de ansiedade. A reconexão é importante tanto para a saúde mental quanto para a compreensão dos fenômenos climáticos.”

Adaptação climática: “Nossa casa foi inundada”

Os percalços vão continuar ocorrendo, como alertou o último relatório do IPCC, o painel das Nações Unidas para o clima. Adaptação é a palavra de ordem para um mundo que vai começar a mudar a olhos vistos.

A própria Renata conta sobre como a mudança climática afeta a sua rotina: na área rural de Brasília, onde construiu uma casa, a ambientalista viu o volume de chuvas superar a previsão feita no projeto de escoamento de água, que levou em consideração as médias de chuvas na região.

A nossa casa foi inundada mesmo com esse escoamento planejado. A vazão da água da chuva está muito forte, e é algo com que nós vamos cada vez mais nos deparar. Vamos ter que ter esse jogo de cintura para lidar com os problemas, tanto a chuva como a seca.
— Renata Camargo, WWF-Brasil

Comprar comida do produtor local

A alimentação é algo no cotidiano das pessoas que deve sofrer mudanças com o aquecimento global, afirma Renata. O consumo de produtos cultivados em locais distantes tende a ficar mais caro com safras irregulares. Para lidar com isso, a saída sugerida pela executiva já está em andamento e muitos brasileiros a praticam: apoiar a agricultura local.

“A mudança nas safras vai mudar a lógica do mercado, e vamos ter que consumir com mais organização local, para que o produto seja feito dentro das possibilidades, para que a gente tenha alguma previsibilidade”, prevê Renata.

Um Só Planeta pergunta se isso não seria uma volta ao passado pré-globalização, quando a importação não era algo corrente como hoje e havia uma variedade menor de produtos disponíveis. “Não seria uma volta ao passado, mas uma ida para o futuro”, comenta a executiva.

Temos que pensar em soluções, e quando a gente pensa no comércio internacional, no comércio de commodities, temos grandes safras produzidas em grandes áreas, um modelo não sustentável de produção que traz o desmatamento para suprir grandes mercados, como a China. Esse tipo de produção não é para o consumidor local, temos que nos perguntar se isso está ajudando o consumidor.
— Renata Camargo, WWF-Brasil

Segundo Renata, a agricultura familiar pode suprir grande parte das necessidades do mercado interno. “A gente fica achando que tem que desmatar muito, se não a quantidade de alimento não vai dar, mas isso visa muito mais à exportação e o lucro, essas lógicas de mercado, do que para a sobrevivência dos brasileiros”, critica.

Educação não é só na escola

Pensando nas futuras gerações, a executiva reforça a necessidade de colocar as crianças em contato com a natureza, para formar cidadãos mais conectados com o meio ambiente. E ainda, não esperar que apenas a educação formal garanta a formação de cidadãos conscientes.

“A falta dessa educação ambiental é uma barreira, e não é só educação formal, é do dia a dia, não jogar lixo no chão, achar que os recursos são infinitos, esses maus hábitos são grandes barreiras.”