Abelhas, animais silvestres e outras espécies que vivem no Cinturão Verde do Jaraguá são ameaçados

Povo Guarani, que tem sua aldeia a 200 metros de especulação imobiliária da construtora Tenda, luta por um dos últimos cinturões verdes de São Paulo e as espécies que lá vivem.

Assine e compartilhe a petição para a criação do Parque Ecológico Yary Ty (CEYTY) e o Memorial da Cultura Guarani no Jaraguá, em São Paulo.

A construtora Tenda já derrubou 522 árvores em área de Mata Atlântica no Jaraguá, classificada pela UNESCO como parte do cinturão verde de São Paulo, matando diversas espécies animais, entre elas as abelhas sem ferrão, como arapuás, uruçus amarelas, que o povo Guarani, desde 2016, vem criando na T.I. Guarani no Jaraguá, impulsionando sua expansão e fortalecimento. Essa abelhas passaram a utilizar, também, essa área onde a Tenda quer construir até 11 torres de apartamentos e, para isso, derrubar a soma de 4.000 mil árvores.

Além das abelhas, diversas espécies de animais, como pássaros silvestres e cobras, foram mortos nessa primeira devastação.

Um crime ambiental inaceitável.

Por isso, desde 30 de janeiro, o povo Guarani, que tem sua T.I. a 200 metros dessa área alvo da especulação imobiliária, ocupou o local e, desde então, já promoveu o replantio de 800 mudas, limpou o lago onde a Tenda jogou entulho depois do desmatamento, entre outras ações. Até que uma ordem de reintegração de posse em favor da Tenda foi levada a cabo pela Polícia Militar do Estado de São Paulo no dia 10 de março.

Hoje, os Guarani ocupam a área externa, na calçada, em condições extremamente precárias e pedem apoio da população de São Paulo para que um dos últimos cinturões verdes de São Paulo seja preservado. Irregularidades, ilegalidade e desrespeito a leis federais marcam os descaminhos da construtora Tenda para tomar posse de área de preservação.

Apoiados por um forte coletivo jurídico, que se formou para assessorar o povo Guarani em sua luta no Jaraguá – como a Comissão Guarani Yvyrupa, o CIMI (Conselho Indigenista Missionário) e uma representação da OAB – os líderes Guarani vêm denunciado diversas irregularidades, ilegalidades e desrespeito à leis federais por parte da Tenda, como a construtora ter ignorado a Portaria Interministerial 060 de 2015, que garante que nenhum tipo de especulação ou obra pode ser realizada sem um estudo de impacto ambiental e sócio-componente indígena em área a 8 km de uma terra indígena. A T.I. do Jaraguá está a 200 metros do empreendimento. Nenhum estudo foi realizado pela construtora.

Além dessa Portaria, existe a Convenção 169 da OIT, adotada em Genebra, em 1989, e aprovada pelo Congresso Nacional por meio do Decreto Legislativo 143, de 20 junho 2002, garantindo que qualquer tipo de ação que venha ferir uma comunidade indígena de qualquer forma, causando qualquer tipo de impacto, deve haver uma consulta prévia, livre e informada, de boa fé com essa comunidade.

Não foi o que aconteceu. O povo Guarani no Jaraguá, recebeu, no final do ano passado, a visita de funcionários da Tenda dizendo que estavam ali apenas para avisá-los sobre o empreendimento. Imediatamente, os líderes Guarani disseram que não era bem assim, que não podiam chegar do nada e querer desmatar uma área de preservação, de amortecimento do Parque Estadual do Jaraguá, entre tantas outras questões. Foi quando iniciaram sua resistência.

Em 12 de março último, a líder Guarani Sonia Ara Mirim iniciou uma live nas redes sociais dizendo que a resistência precisa permanecer, mesmo do lado de fora, na calçada, em via pública, sem acesso a área do terreno, como antes, porque “A gente precisa estar perto das árvores porque elas sentem uma força quando estamos aqui”, inicia Sonia. Em 10 de março, a Tenda mandou a Polícia Militar do Estado de São Paulo levar a cabo uma reintegração de posse, assinada por uma juíza estadual em favor da construtora.

“A Tenda fica pressionando a gente para sair daqui”, continua a líder Guarani Sonia Ara Mirim em sua live. ” Parece até que compraram um pedaço da rua… Mas vamos continuar na resistência, mesmo em condições difíceis. As pessoas passam de carro e xingam, mas tem muita gente solidária também. O importante é que vamos ter que ganhar essa luta. A gente precisa desse espaço para que possamos construir um trabalho bonito com o parque. É um espaço que tem um número grande de área verde, que pertence à Mata Atlântica, e estamos aqui para proteger a vida, a vida da floresta, a vida das árvores, que ainda estão aqui resistindo, de pé, e a vida de nossas crianças, que precisam de um espaço melhor também. A situação que estamos aqui na rua hoje é perigosa” (Sonia interrompe a fala para pedir que “alguém tire aquele cachorro de lá, senão não consigo nem falar”).

Sonia Ara Mirim, no dia da reintegração de posse (10/3) | Divulgação

Com a ocupação, agora na calçada e em frente a uma avenida muito movimentada, que passa em frente à T.I. Guarani no Jaraguá, os cachorros e animais domésticos da aldeia ficam atravessando o tempo todo para encontrar e dar apoio aos seus tutores e tutoras da ocupação, como manda a solidariedade desses seres sencientes. Os motoristas dos carros normalmente passam acelerados e um cachorro já foi morto. “As pessoas não respeitam a vida, nenhum tipo de vida, incluindo a vida animal”, desabafa Sonia, antes de continuar sua live.

“Hoje estamos na calçada, porque tivemos que sair (do terreno), para que não houvesse um massacre (pela PM) do meu povo… Disseram que tínhamos 15 minutos para sair dali e tivemos muito medo que houvesse uma repressão policial, porque estavam dispostos a qualquer coisa naquele momento. Rezei muito e hoje estamos aqui em uma situação muito precária, uma parte da comunidade está na calçada, com riscos muito grandes, porque aqui é um bairro violento, com risco de carros e atropelamentos…” (Em outra entrevista, Thiago Karai Jekupe Martim, um dos líderes Guarani da ocupação, contou que é comum carros pararem em frente da aldeia para aliciar as crianças indígenas, além da não incomum abordagem agressiva da polícia, cotidiana na vida dos Guarani no Jaraguá).

Na live, a líder Sonia Ara Mirim continua seu relato: “Estou fazendo a live, e ao mesmo tempo olhando para o lado, porque tem os animais que ficam trafegando, as crianças, e muitas vezes ficamos com medo que aconteça algo ainda pior na rua. É uma situação muito difícil, mas só estamos aqui, desta forma, na calçada, correndo riscos, para proteger as vidas que ainda estão em pé, que são as árvores. Esse é o maior motivo da gente estar aqui ainda, resistindo. Vejo as árvores como minhas veias…Estamos com um abaixo assinado on-line, e vamos fazer um também por escrito – quem passar por aqui pode também assinar, para que a Tenda saia daqui definitivamente e a gente consiga logo a construção desse parque, que é para todos: para nós, as populações indígenas, a população que mora ao redor e para a população de São Paulo. Vamos trabalhar com agrofloresta, premacultura, plantio, ervas medicinais, que é nosso modo de vida e estamos aqui para as pessoas entenderem quem é essa população de São Paulo que está resistindo, para que essas vidas sejam preservadas. Esse é nosso objetivo. Peço muito que nos ajudem e nos apoiem! O povo Guarani não é assim: não precisamos correr tantos riscos para proteger a vida. Estamos precisando de muita água, muita fruta, frutas cítricas, limão, laranja, melancia, que ajudem a gente a não ficar gripado, a não ficar doente, porque temos que ficar fortes. Precisamos ficar hidratados, porque o calor aqui é muito forte.
Estamos também precisando de barracas (veja pontos de coleta no final da matéria). É a vida de um povo que está aqui. As pessoas não respeitam nem os animais que estão aqui nos protegendo.”

Nesse momento, Thiago Martim, um dos líderes Guarani da ocupação, pergunta à Sonia:

– Ainda não recebi nada da prefeitura, nenhum tipo de manifestação. Você recebeu alguma coisa? Como você está vendo a postura do prefeito Bruno Covas e da prefeitura, e do que estão fazendo com a gente, Sonia?

– O prefeito é omisso, o governador é omisso. A única coisa que o governador garantiu que ia fazer foi a reintegração de posse. Mandou a polícia dele aqui, com todo o armamento para prejudicar uma comunidade resistente, uma comunidade que não estava armada, eles sim estavam armados, eles sim eram os repressores.

O prefeito não deu nenhum respaldo… o laudo feito pelo Ministério Público do Estado não está sendo respeitado. É um laudo muito bem feito. Ali está comprovado que aqui ocorreu um crime ambiental – não tem como dizer o contrário disso.

Então, precisamos realmente que a população de São Paulo se mobilize, que a população compartilhe e dê sua opinião sobre essa questão, que é muito triste. Estamos aqui para preservar a vida, porque a natureza é sim importante, mais enchentes virão se essas vidas não forem preservadas.”

Outras informações relevantes:

Como publicado na Folha Noroeste de 26 de fevereiro de 2020, “há dois projetos de lei protocolados na Câmara Municipal, ambos de autoria do vereador Eliseu Gabriel. Um deles muda o zoneamento local, hoje classificado como ZEIS (Zona Especial de Interesse Social), para Zona de Preservação Ambiental (ZEPAM). O segundo propõe transformar a área em questão em parque municipal. Já o vereador Gilberto Natalini entrou com duas representações junto aos Ministérios Públicos Federal e Estadual com o objetivo de garantir a integridade física dos índios e impedir que mais árvores nativas sejam derrubadas. No documento, o parlamentar questiona o fato do terreno ser classificado como ZEIS estando ele inserido numa ZEPAM. A área, inclusive, é considerada uma Reserva de Biosfera (instrumento de preservação que incentiva uma gestão integrada e sustentável dos recursos naturais)”.

Como participar:

Doações: o povo Guarani que resiste em condições precárias no Jaraguá necessita de doações, como verduras, legumes, frutas cítricas e muita água, além de barracas.

Foram criados dois pontos de coleta:

Rua Girassol, 464, Vila Madalena (Hanna)
Rua São Vicente de Paula, 401, Santa Cecília (Pedro)

Acompanhe e compartilhe as páginas do povo Guarani nas mídias sociais:

Existe Guarani em SP > https://www.facebook.com/existeguaraniemsp/

Tenonderã Ayvu > https://www.facebook.com/tenonderaayvu/

Luta Parque Jaraguá > https://www.instagram.com/lutaparquejaragua/

***

Outras matérias publicadas pela jornalista Sonia Maia sobre a resistência Guarani no Jaraguá.

Entenda a luta do povo Guarani pelo Parque Ecológico Yary Ty no Jaraguá

https://jornalistaslivres.org/entenda-a-luta-do-povo-guarani-pelo-parque-ecologico-yary-ty-no-jaragua-sp/?fbclid=IwAR0dp_gDLjG7AiEB8PI-21utwxmebZ3xmOAVZMeS8V1bvFY-v1_LYuSe2cM

Guaranis resistirão a reintegração de posse no Jaraguá

https://jornalistaslivres.org/guaranis-resistirao-a-reintegracao-de-posse-no-jaragua-sp/?fbclid=IwAR1I-MSxjFbGc6TlF_BWE2bV3wSHgFc2zGO2eV-gPLfzFmQ_KokkM3tlnsw

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *