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Técnica pode ajudar a prever períodos de seca no Brasil

Técnica pode ajudar a prever períodos de seca no Brasil

Um artigo publicado na Geophysical Research Letters indica que a temperatura da superfície do Oceano Atlântico Norte pode ajudar a prever eventos climáticos extremos no nordeste do Brasil com até três meses de antecedência.

O estudo mostrou, com base no conceito de déficit de precipitação (menor quantidade de chuva), que nos últimos anos o nordeste do país recebeu mais influência do Atlântico Norte do que do Pacífico tropical que, até então, era considerado um dos principais intensificadores das secas na região.

Ao mesmo tempo, os cientistas perceberam que as conexões atmosféricas entre o Pacífico e o Atlântico Norte se tornaram mais frequentes, situação que pode atuar como reforço para as secas que ocorreram na região nas últimas décadas.

A pesquisa também considerou que mudanças no uso do solo influenciam esse cenário, pois podem levar a alterações no ciclo hidrológico, como já demonstrado por estudos de modelagem, especialmente em relação à bacia amazônica. Por esta razão, os cientistas sugerem que sejam feitas novas pesquisas usando a metodologia desenvolvida para investigar como as mudanças no manuseio da terra alteram as características e interações climáticas.

Em declaração concedida à agência FAPESP, o cientista do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE) e co-autor do artigo, Lincoln Muniz Alvez, declarou que “o estudo foi motivado pela grave seca que durou de 2012 até 2015. Este longo período nos levou a pensar, do ponto de vista meteorológico, sobre como as temperaturas tropicais dos oceanos influenciam o clima. A diferença agora é a metodologia inovadora que explora os contrastes entre o Pacífico e o Atlântico, e o padrão de seca no Nordeste do Brasil”.

A seca citada pelo pesquisador foi tão intensa que destruiu plantações da região e deixou cidades e vilas sem água.

Outros estudos já haviam sugerido que a ausência de chuva era agravada era resultado da alta temperatura da superfície do Oceano Atlântico e da ocorrência do fenômeno climático El Niño, que ocorre quando as temperaturas do Oceano Pacífico estão acima do normal.

No Brasil, os efeitos do El Niño incluíram uma seca intensa no Nordeste e na Amazônia, uma estação seca muito mais longa do que o normal no Norte e em várias partes do Brasil central (áreas ao norte dos estados de Minas Gerais e Goiás, assim como no Distrito Federal), e inundações no Sul. Esse fenômeno já causou perdas em diferentes partes do mundo.

Alves assegura que “com base em nossa análise multifacetada, o artigo fornece amplas evidências para que os meteorologistas possam monitorar os sinais vindos do Atlântico tropical com vários meses de antecedência. A influência do Pacífico é inegável, mas o Atlântico tem mais”.

Como o artigo foi feito?

Para chegar a esses resultados, os pesquisadores do Brasil, China, Austrália e Alemanha, buscaram compreender as relações entre a variabilidade da temperatura da superfície do mar e o índice de precipitação padrão, que foram interpretadas como interações diretas, e as relações entre os oceanos, que foram interpretadas como efeitos indiretos nos níveis de precipitação.

Além disso, foram utilizados dados de precipitação do Climate Prediction Center (CPC), uma filial do US National Oceanic & Atmospheric Administration’s National Weather Service (NOAA-NWS).

Para verificar a consistência dos dados obtidos, eles compararam os resultados com o Niño 4, uma área que inclui o Pacífico equatorial central e parte do Atlântico Sul. A estação chuvosa foi definida como janeiro-abril, e a estação seca como maio-agosto.

Segundo Alves, “vários outros estudos têm corroborado os nossos resultados”. O pesquisador ainda ressalta que outros fatores precisam ser considerados. “Quando discutimos as mudanças climáticas, estamos falando também dos impactos socioeconômicos e do efeito sobre a biodiversidade”. Os centros meteorológicos podem usar o modelo para trabalhar na prevenção como uma contribuição às políticas públicas e à tomada de decisões sobre a mitigação de eventos extremos”, disse.