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Por que a planta que faz a tequila pode revolucionar o Sertão do Nordeste?

Por que a planta que faz a tequila pode revolucionar o Sertão do Nordeste?

O agave é uma planta da espécie das suculentas e bastante conhecida por ser a principal matéria-prima para produção da bebida mexicana tequila.

E sua plantação ne Nordeste pode mudar a economia na região. Esse é potencial e a aposta dos produtores. O objetivo é criar toda uma nova cadeia industrial e até uma nova matriz energética internacional.

A aposta no agave como a “cana da caatinga” para produção de etanol não se limita mais aos centros de pesquisa, mas já chegou a importantes players do mercado. No avanço mais recente, a Shell decidiu investir R$ 30 milhões no projeto Brave (Brazilian Agave Development), em parceria com a Universidade Estadual de Campinas (Unicamp).

E por que a planta da tequila chamou atenção da multinacional petrolífera?

Espécies nacionais de agave já existem no sertão como cultivo voltado à extração da fibra de sisal, utilizada na produção de cordas, cestas e tapetes. Mas a concorrência das fibras sintéticas dificultou esse mercado. Desta vez os pesquisadores, e a indústria, estão de olho na enorme capacidade do agave para acumular água, nas condições mais inóspitas possíveis. Na Austrália, resistiu bem a temperaturas de quase 50º C.

Em tese, devido ao alto rendimento, com 3,3 milhões de hectares de agave seria possível produzir todo o volume de etanol do mercado brasileiro, ou 30 bilhões de litros. Enquanto com a cana, para o mesmo resultado, são necessários 4,5 milhões de hectares cultivados.

Executivos da Shell no país projetam um cultivo de até 2 milhões de hectares no semiárido (menos de 2% da área total do bioma), suficiente para produzir de 6 bilhões a 10 bilhões de litros de etanol de agave por ano. Assim, não haveria sequer pressão sobre as áreas de caatinga destinadas à preservação. “Ela pode ser plantada onde a cana não sobreviveria. E em áreas em que não traz impacto ambiental, porque são áreas que já tiveram algum tipo de agricultura, e que, hoje, devido a problemas hídricos, são subutilizadas, sem mata nativa, sem plantação alguma. O grande potencial estratégico é trazer uma matriz industrial para uma região que hoje não tem nada parecido”, diz o coordenador do projeto Brave na Shell, Marcelo Medeiros.

Planta multi aproveitada

Do agave pode se aproveitar tudo: além do etanol, fibras, silagem, nanocelulose, inseticida e carvão vegetal (biochar), que funciona como fertilizante do solo.

Atualmente, no entanto, no território do sisal, no nordeste da Bahia, somente uma parte decimal das folhas é aproveitada. Da biomassa, 95% são jogados fora. “Se a gente utilizasse todo o bagaço do sisal para gerar energia, naquela região toda da Bahia não precisava nem de diesel, nem de gás de cozinha”, destaca Pereira, da Unicamp.

O ciclo do agave exige planejamento e paciência. Leva de três a cinco anos até a primeira colheita. Até lá, a planta vai juntando forças e ganhando porte. No quinto ano, a produção atinge 880 toneladas por hectare. Um rendimento equiparável ao da cana-de-açúcar, quando distribuído ao longo do ciclo. Por que, então, o México, terra-mãe da agave tequilana, não aproveita todo seu potencial energético? Segundo Pereira, porque, por lá, os olhos estão todos voltados para a tequila, que alcança um elevado preço de mercado. Com 374 milhões de litros de tequila produzidos anualmente, os mexicanos conseguem levantar receitas que correspondem a cerca de 50% das obtidas pelo etanol no Brasil, com um volume de 15 bilhões de litros.

Curiosamente, enquanto no México só se aproveita a pinha do agave, onde está o açúcar, no Brasil usa apenas as fibras das folhas. Cada país joga fora todo o restante da planta. “Nossa ideia é uma biorefinaria para usar tudo. O Don Chambers, que teve essa ideia lá atrás, viu que o México não se interessava, levou para a Austrália, que também não se interessou. Mas talvez se interesse agora, quando nós começamos a fazer”, diz Pereira.