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Pesquisador usa casca de coco para tratar águas

Pesquisador usa casca de coco para tratar águas

Estudo da UFF transforma um resíduo abundante no Rio de Janeiro em descontaminante

Fármacos, produtos de higiene pessoal e outros poluentes têm se tornado uma preocupação crescente devido à sua presença constante em corpos d’água ao redor do mundo. Para amenizar esse problema, uma pesquisa da UFF (Universidade Federal Fluminense) está usando o coco verde como descontaminante.

Os chamados “contaminantes emergentes” representam um risco ambiental significativo, uma vez que não são completamente removidos por estações de tratamento de água e esgoto convencionais, o que resulta na possibilidade de bioacumulação e riscos potenciais para seres humanos e o meio ambiente.

casca de coco
Foto: Datingscout | Unsplash

Com o intuito de melhorar esse quadro de forma sustentável, foi desenvolvida uma tese de doutorado da UFF que se propõe a elaborar formas de retirar esses poluentes das águas de maneira sustentável. “Começamos a trabalhar com o processo de pirólise — reação de decomposição térmica —, em que se converte biomassa em três produtos: sólido, líquido e gasoso. Focamos no sólido, com a finalidade de remover resíduos da água”, afirma a professora Marcela de Moraes, orientadora da pesquisa.

“Escolhemos a casca de coco verde, por ser uma preocupação do estado do Rio de Janeiro, já que demora de 10 a 15 anos para se decompor e acaba levando ao esgotamento precoce de aterros sanitários”, completa a professora.

A situação ambiental preocupante do descarte do coco fica ainda mais evidente quando se leva em consideração que 250ml de água geram cerca de 1kg de lixo.

Dois problemas, uma solução

O estudo remove contaminantes emergentes da água utilizando como meio um resíduo (o coco verde descartado), resolvendo, assim, dois problemas ambientais. O processo se dá pela adsorção, fenômeno que envolve o contato entre um sólido e um fluido e resulta na transferência de massa da fase fluida para a superfície do sólido.

casca de coco
Foto: Meimei Ismail | Unsplash

O processo é semelhante ao que acontece quando se utiliza o carvão para retirar o mau cheiro na geladeira. Nesse caso, o que ocorre é que os alimentos liberam substâncias gasosas na decomposição que causam esse odor. Como o carvão tem uma grande quantidade de poros na superfície, adsorve esses gases, ou seja, o gás fica retido na superfície, não incorporado a seu volume, como ocorre com a absorção. Já no contexto do estudo, a diferença é que os contaminantes emergentes estão na fase líquida.

Segundo a professora, “chegou-se à conclusão de que esse biocarvão possui muito potencial na adsorção dos contaminantes emergentes. A preocupação em seguida foi como recuperar esse material jogado na água, principalmente levando em conta que essa retirada envolve procedimentos de alto custo. Pensando em facilitar essa etapa, foram incorporadas nanopartículas magnéticas nesse biocarvão, uma metodologia inédita. Então, quando se aplica um campo magnético com um ímã, é possível separar o composto da água”.

A ilustração a seguir apresenta todo o processo e demonstra as vantagens da utilização do biocarvão a partir dos rejeitos do coco verde em detrimento do carvão ativado comumente usado.

casca de coco descontamina água
Ilustração UFF

Para chegar a esses resultados e avaliar o potencial do composto, o estudo utilizou cafeína e ácido salicílico (o mesmo empregado para tratamentos de pele) como contaminantes emergentes modelo. A professora explica que foram preparadas soluções aquosas destas substâncias [a cafeína e o ácido] e incubadas com o biocarvão.

“Avaliamos diferentes tempos de incubação, concentrações do contaminante e quantidades do biocarvão. Depois, determinamos a concentração destes contaminantes na água”, detalha.

Em relação à eficiência de remoção dos poluentes, foram comparados os resultados com o carvão ativado não magnético (comumente usado) e dois magnéticos: o preparado pelo estudo a partir dos rejeitos do coco e outro já existente na literatura científica.

coco verde
Foto: Utsman Media | Unsplash

“A performance do biocarvão que produzimos é menor porque as partículas magnéticas afetam a superfície do carvão. Então, já era esperada essa leve diminuição na eficiência da remoção, mas ele ser magnético facilita muito no processo de retirada dos poluentes. Fica mais viável e barato”, explica a docente.

Os resultados indicam a viabilidade da nova metodologia proposta para o preparo de biocarvões magnéticos produzidos a partir da casca do coco verde, obtendo-se um material com elevada capacidade adsortiva e que representa uma excelente alternativa para a remoção de fármacos em águas, assim como um ganho para o meio ambiente a partir de um processo que, por si só, já é sustentável.