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Pepitas de ouro podem se formar pela eletricidade gerada por terremotos

Pepitas de ouro podem se formar pela eletricidade gerada por terremotos

Eventos como o Ciclo do Ouro no Brasil, a Corrida de Ouro nos EUA ou os inúmeros outros casos de surtos de garimpo e mineração em busca do metal precioso registrados em todos os tempos e ao redor de todo o planeta, em sua larga maioria, foram ocasionados pela descoberta de pepitas de ouro em formações rochosas à base de quartzo – muito diferente das minas de ouro exploradas por grandes empresas hoje, onde normalmente o ouro é coletado usando cianeto.

Mas nunca ficou claro qual é a metalogênese das grandes pepitas de ouro que são a marca registrada desses afloramentos: Como é que se formam essas pepitas se o ouro normalmente vem dissolvido ou se apresenta em concentrações extremamente baixas nas rochas?

Christopher Voisey e colegas da Universidade Monash, na Austrália, acreditam ter finalmente encontrado a resposta: O ouro que forma as pepitas nas ocorrências de quartzo é aglomerado pela eletricidade gerada por grandes terremotos.

Pela nova teoria, os terremotos geram um campo elétrico que atrai ouro dissolvido em fluidos, que são forçados a subir do subsolo.

“A explicação padrão [da geologia] é que o ouro precipita de fluidos quentes e ricos em água à medida que fluem por rachaduras na crosta terrestre,” contextualiza o professor Voisey. “À medida que esses fluidos esfriam ou sofrem mudanças químicas, o ouro se separa e fica preso em veios de quartzo.

“Embora essa teoria seja amplamente aceita, ela não explica completamente a formação de grandes pepitas de ouro, especialmente considerando que a concentração de ouro nesses fluidos é extremamente baixa,” completou o pesquisador.

Como as pepitas de ouro se formam? Pela eletricidade gerada pelos terremotos

E se o ouro de tolo puder deixar os tolos ricos?
[Imagem: Ivar Leidus/Wikimedia]

Eletricidade natural minerando ouro

Os pesquisadores decidiram testar então um novo conceito, baseado no fenômeno da piezoeletricidade, uma propriedade característica do quartzo, o mineral que normalmente hospeda esses depósitos de ouro – o quartzo é uma forma cristalina do óxido de silício (SiO2).

Os cristais de quarto são piezoelétricos, o que significa que eles geram uma carga elétrica quando são submetidos a um estresse mecânico, e vice-versa – aplique-lhes uma carga elétrica e eles darão um tranco. É por causa desse fenômeno que o quartzo está presente nos  relógios, nos isqueiros e em inúmeros outros dispositivos de acendimento automático, onde uma pequena força mecânica cria uma voltagem significativa.

E se o estresse gerado pelos terremotos pudesse fazer algo semelhante no interior da Terra, forçando os cristais de quartzo a produzir “disparos” de eletricidade, que então atrai o ouro e força seus átomos a se acumularem?

Para testar essa hipótese, os pesquisadores idealizaram um experimento para replicar as condições que o quartzo pode experimentar durante um terremoto: Eles submergiram cristais de quartzo em um fluido com ouro dissolvido e aplicaram estresse usando um motor para simular o tremor de um terremoto. Após o experimento, as amostras de quartzo foram examinadas sob o microscópio para ver se algum ouro havia sido depositado.

“Os resultados foram impressionantes,” disse o professor Andy Tomkins, coautor do estudo. “O quartzo estressado não apenas depositou ouro eletroquimicamente em sua superfície, mas também formou e acumulou nanopartículas de ouro. Notavelmente, o ouro tinha uma tendência a se depositar em grãos de ouro existentes, em vez de formar novos grãos.”

 

Como as pepitas de ouro se formam? Pela eletricidade gerada pelos terremotos

Diferente do grafeno, no qual os átomos de carbono se organizam em formato de favo de mel, no oureno os átomos de ouro formam triângulos.
[Imagem: Shun Kashiwaya et al. – 10.1038/s44160-024-00518-4]

Como se formam as pepitas de ouro?

O acúmulo de ouro em partículas que se tornam cada vez maiores ocorre porque o ouro é um bom condutor elétrico, enquanto o quartzo é isolante. Uma vez que algum ouro é depositado, ele se torna um ponto focal para crescimento posterior dos cristais, efetivamente “revestindo” os grãos de ouro com mais ouro.

Como o quartzo é repetidamente estressado por terremotos, ele gera tensões piezoelétricas que podem reduzir o ouro dissolvido no fluido circundante, causando sua deposição. A longo prazo, pepitas de ouro cada vez maiores vão se formando – além disso, o ouro quando fica muito fino, quase 2D, comporta-se como um líquido.

“Em essência, o quartzo age como uma bateria natural, com ouro como eletrodo, acumulando lentamente mais ouro a cada evento sísmico,” sugere Voisey.

Esta nova compreensão da formação de pepitas de ouro não apenas lança luz sobre um antigo mistério geológico, como também destaca a inter-relação entre os processos químicos e físicos da Terra.

Bibliografia:

Artigo: Gold nugget formation from earthquake-induced piezoelectricity in quartz
Autores: Christopher R. Voisey, Nicholas J. R. Hunter, Andrew G. Tomkins, Joël Brugger, Weihua Liu, Yang Liu, Vladimir Luzin
Revista: Nature Geoscience
DOI: 10.1038/s41561-024-01514-1