Os outros fatores que explicam por que algumas pessoas não conseguem emagrecer
A contagem e o gasto calórico são importantes, mas a qualidade dos nutrientes também
Uma verdade repetida sobre dietas é que engordar ou emagrecer é uma questão matemática: o balanço entre as calorias consumidas na alimentação e queimadas para nos manter vivos e ativos. Se sobrar energia, ela será armazenada na forma de gordura; se faltar, nossas reservas são usadas e perdemos peso. A máxima pode representar grande parte da questão, mas não traz todas as respostas sobre o emagrecimento.
É o que defende o gastroenterologista Christopher Damman, em um artigo para o site The Conversation. Nele, o médico e pesquisador, que estuda o microbioma e o metabolismo há mais de 20 anos, sustenta que a equação “diferença entre calorias consumidas e utilizadas” é importante, mas a qualidade nutricional do que comemos é fundamental.
Damman destaca pesquisas recentes que apontam o papel fundamental de alguns compostos dos alimentos chamados bioativos nas diferenças individuais de apetite, digestão e metabolismo. “Esses compostos têm uma ação importante em regular os controles metabólicos do corpo: o centro de apetite no cérebro (o hipotálamo), o biorreator digestivo do seu intestino (o microbioma) e os geradores de energia metabólica das células (as mitocôndrias)”.
Alimentos integrais
Esses três atores fundamentais, explica o pesquisador, são influenciados pela qualidade do que botamos no prato. “Estudos mostram que consumir alimentos integrais, que ainda vêm ‘embalados’ com suas fibras e polifenóis (compostos coloridos de plantas que conferem a elas muitos benefícios à saúde), leva à perda de mais calorias através das fezes na comparação com comidas processadas que foram ‘pré-digeridas’ pela indústria e transformadas em carboidratos simples, óleos refinados e aditivos”.
Em resumo, comer mais alimentos integrais e menos comidas processadas pela indústria faz com que você consiga ingerir mais calorias porque parte delas vai parar no vaso sanitário.
Damman acrescenta que as fibras e os polifenóis também regulam o apetite no cérebro e, consequentemente, o quanto comemos. O microbioma (os microrganismos que colonizam nosso intestino) transformam esses compostos bioativos em metabólitos, subprodutos moleculares da digestão que naturalmente diminuem a fome. Eles atuam sobre os mesmos hormônios produzidos no intestino sintetizados em remédios como Ozempic e Mounjaro.
No caso dos ultraprocessados, não apenas faltam esses compostos bioativos como os produtos vêm com altas doses de sal, gordura, açúcar e aditivos, que aumenta a palatabilidade deles e aumenta o desejo por comer mais.
Mitocôndrias
O pesquisador também destaca o papel das mitocôndrias em como utilizamos a energia adquirida pela alimentação. Essas organelas usam as calorias dos nossos alimentos como combustível para as funções das células. Pessoas saudáveis têm essa usina energética em pleno funcionamento, mas quando ela não funciona bem temos mais fome, menos massa muscular e mais acúmulo de gordura.
“Essas pessoas (menos saudáveis) têm menos gordura marrom, que é rica em mitocôndrias. Em vez de armazenar calorias, esse tipo de gordura queima energia para produzir calor. Ter menos gordura marrom ajuda a explicar por que algumas pessoas com obesidade têm temperatura corporal mais baixa e por que tem havido um declínio da temperatura corporal nos EUA desde a Revolução Industrial”, escreve o pesquisador.
A saúde das mitocôndrias tem influência de uma série de fatores, como a prática de exercício regular, a qualidade do sono, os níveis de estresse e a alimentação adequada. No quesito dieta, estudos mostram que a eficiência mitocondrial é influenciada não apenas pelos macronutrientes essenciais (gordura, proteínas e carboidratos) e micronutrientes como vitaminas e minerais. Também é importante comer fibras, polifenóis e alimentos fermentados, que colaboram com o metabolismo.
O problema, segundo o médico, é que as dietas ocidentais costumam ser pobres nesses compostos bioativos, mais encontrados em dietas como a Mediterrânea e a de Okinawa. São eles: castanhas, sementes, frutas, vegetais, grãos integrais e comidas fermentadas. “Muitos desses compostos passam sem ser digeridos pelo intestino delgado e chegam ao intestino grosso, onde o microbioma os converte em metabólitos. Eles são então absorvidos, influenciando a quantidade de mitocôndrias nas células e seu funcionamento”.
O consumo contínuo de alimentos ultraprocessados, com poucos compostos bioativos, muito sal e aditivos, “prejudica a capacidade do microbioma de produzir os metabólitos necessários para a saúde mitocondrial. O uso excessivo de antibióticos, o estresse e a falta de exercícios também degradam o microbioma e a saúde das mitocôndrias”.