Organizações tentam evitar anulação de lei que já retirou 4,3 bilhões de sacolas plásticas de circulação

Associação de Supermercados e ONGs criaram movimento ‘Desplastifique-se’ para desestimular o uso das bolsas
Após retirar do território fluminense 4,3 bilhões de sacolas plásticas, consideradas uma ameaça à natureza pelos ambientalistas, a lei estadual 8.473/19 corre o risco de extinção. Pelo menos dois municípios — São Gonçalo e Maricá —- sancionaram leis recentemente proibindo que as bolsas sejam cobradas nos supermercados. Propostas semelhantes tramitam em Barra do Piraí, Petrópolis, São Pedro da Aldeia e também na Câmara de Vereadores da capital, onde o texto de autoria do vereador Marcio Ribeiro (Avante) defende que o custo de distribuição deve ficar com os estabelecimentos, e não com os clientes. A Associação de Supermercados do Estado do Rio de Janeiro (Asserj) se juntou a entidades como a Fecomércio, Clean Up The World e Change.org para a criação de um movimento socioambiental batizado de “Desplastifique Já”.
Mas a questão envolve outros custos, sendo o mais alto deles o ambiental, segundo especialistas. Um relatório recente da ONG Oceana, criada em 2001 por um grupo de fundações líderes em conservação, apontou que a indústria brasileira produz anualmente cerca de 500 bilhões de itens plásticos descartáveis. Após a utilização, grande parte desses resíduos é levado ao mar, gerando grandes prejuízos para a vida marinha e para quem vive dos recursos do mar.
— A maior parte do lixo marinho é composta por produtos e embalagens plásticas descartáveis. As medidas para reciclagem e tratamento desse resíduo sozinhas nunca resolverão o problema que é crescente e urgente, é preciso reduzir a produção desse material — afirma a engenheira ambiental Lara Iwanicki, gerente da campanha de combate à poluição marinha por plásticos da Oceana.
Sancionada em 2019, a lei das sacolas plásticas determinou que os supermercados não eram obrigados a fornecer as bolsas gratuitamente e, no caso de venda das bolsas, só poderiam cobrar o valor de custo. Por isso, os estabelecimentos não lucram com a venda das sacolas, segundo o presidente da Asserj, Fábio Queiroz.
— Nós não queremos vender sacolas plásticas. Queremos que o consumidor deixe de utilizá-las, seja onerosa ou gratuitamente. Como presidente da Asserj, eu faço um apelo ao consumidor: que não compre sacolas plásticas nos nossos estabelecimentos e adote a sua sacola retornável — diz Queiroz.
Embora não proíba a distribuição gratuita das sacolas, a lei estadual exige que os estabelecimentos criem mecanismos para reduzir o volume de bolsas à disposição. Essa redução deveria ser equivalente a 40% no primeiro ano, e mais 10% nos anos seguintes, chegando a uma queda de 70% no quarto ano de vigência da lei.
Para incentivar a redução no consumo de plástico, a Asserj se juntou a entidades como a Fecomércio, Clean Up The World e Change.org para a criação de um movimento socioambiental batizado de “Desplastifique Já”. O movimento publicou uma carta aberta à população fluminense convocando todos a fazerem parte dessa mudança. “Em médica, 179 milhões de sacolas por mês, quase 6 milhões por dia, deixam de ser descartadas no meio ambiente, em aterros sanitários, e em rios e seus afluentes. Um resultado que também contribui para melhorar a qualidade de vida da população de nosso estado”, diz um trecho da carta, que finaliza: “Precisamos estimular cada vez mais esta mudança de mentalidade”.
Segundo uma pesquisa feita pela associação, em junho desse ano, 70% dos consumidores fluminenses não utilizam mais a sacola plástica, biodegradável ou não, para compras. A lei, portanto, já gerou uma mudança no comportamento de grande parte dos consumidores, atingindo o objetivo inicial do autor da proposta, o deputado estadual Carlos Minc (PSB/RJ), de criar um esforço coletivo pela causa ambiental.
— É um raro acordo que envolve ambientalistas, técnicos, consumidores e supermercados. Só fica de fora a demagogia populista, que vai inclusive na contramão da COP26, que pede a redução do fóssil e do plástico, para evitar consequências como as inundações que são acirradas pelo entupimento e obstrução causados pelo plástico — diz Minc.
Disputa na Aerj
Para preservar a lei das sacolas plásticas em todo o estado, a mesa diretora da Assembleia Legislativa do Rio (Alerj) ajuizou uma ação direta de inconstitucionalidade no Tribunal de Justiça do Rio (TJ-RJ) pedindo a suspensão das leis municipais que contrariam a legislação estadual.
— Uma lei municipal não pode contestar uma lei estadual. Isso é inconstitucional. Mas o campo para populismo é grande e, por isso, tanto vereadores quanto deputados navegam nessa maré — diz Minc.
Enquanto a mesa diretora da casa tenta conter as ações nas Câmaras de Vereadores, pelo menos dois projetos de lei tramitam na Alerj para proibir a cobrança de sacolas plásticas nos supermercados. A proposta apresentada pelo deputado Filippe Poubel (PSL) recebeu apoio de outros 26 parlamentares, que assinaram para que a tramitação seja acelerada e a votação realizada em plenário.
Na opinião de Poubel, a lei tinha de fato o objetivo de promover a redução do consumo de sacolas plásticas, mas não houve por parte dos supermercados a preocupação em incentivar o uso de ecobags. Além disso, justifica o deputado, a qualidade das sacolas cobradas pelas redes de supermercados não atende à finalidade, pois são feitas de material pouco resistente, fazendo com que haja um consumo maior destas sacolas, indo na contramão da ideia de proteção ao meio ambiente.
— Os empresários estão usando a questão ambiental como desculpa para continuar lucrando. A população sofre com a ausência de emprego, situação agravada pela pandemia. Qualquer centavo que sai do bolso do trabalhador diminui a sua renda, reduz a comida na mesa das famílias, principalmente as mais pobres — diz Poubel.
O deputado Marcus Vinícius (PTB), autor de projeto de lei com a mesma finalidade, diz que a preocupação em proteger o meio ambiente também é prioridade e, justamente por isso, as campanhas contra o uso de sacolas e a consciência daquelas pessoas que podem utilizar caixas de papelão e sacolas retornáveis são essenciais.