Novo método elimina até 92% de resíduos plásticos presentes na água em duas horas

Combinação de processos químicos mostrou-se eficiente na remoção de bisfenol A, composto químico encontrado em materiais do cotidiano e associado ao câncer e outras doenças crônicas
A poluição causada pelo plástico é considerada uma crise global, com o descarte inadequado impactando meio ambiente e saúde animal e humana. A degradação desses resíduos libera substâncias químicas tóxicas, como o bisfenol A (BPA), que está relacionado ao câncer, diabetes, obesidade e problemas cardiovasculares. Como na natureza o produto contamina solo e água, pesquisadores da USP em Ribeirão Preto investem na criação de um método eficaz na eliminação do BPA em amostras de água.
Para maior eficiência na remoção de contaminantes da água, a inovação combina tratamentos eletroquímicos (utilização de corrente elétrica para manipular substâncias químicas) e enzimáticos (material biológico retirado de fungos) em processos oxidativos avançados. “O tratamento eletroquímico gera radicais altamente reativos que iniciam a degradação química dos poluentes, enquanto o tratamento enzimático acelera ainda mais esse processo”, informa Alexandre Carneiro Cunha, do Departamento de Química da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Ribeirão Preto (FFCLRP) da USP e responsável pela pesquisa.
Os testes realizados mostraram um novo método mais eficiente que os tradicionais em uso, conseguindo remover 92% do BPA da água em apenas duas horas e obtendo como resíduos “subprodutos menos tóxicos e mais biodegradáveis”, conta o pesquisador. Ele afirma que, entre esses subprodutos, foram encontrados ácidos de menor toxicidade, “o que indica uma rota de degradação com menor impacto ambiental”.
Os resultados do estudo, publicados na International Journal of Environmental Science and Technology, são comemorados pelos pesquisadores já que rios urbanos como o Tietê, em São Paulo, e o Rio dos Sinos, no Rio Grande do Sul, vêm apresentando concentrações de BPA potencialmente tóxicas para organismos aquáticos.

Outro motivo para investir no setor está nos resultados de um levantamento feito em 2024 em efluentes da região Sudeste, mostrando que “o BPA não é totalmente removido pelos processos convencionais, destacando a urgência de soluções”, diz Cunha.
Degradação rápida pode servir para outros poluentes
O bom resultado da combinação dos métodos eletroquímico e enzimático era esperado. Cunha informa que estudos anteriores já mostravam a complementaridade dos mecanismos envolvidos. “O tratamento eletroquímico gera intermediários mais simples e reativos, que se tornam substratos ideais para a ação enzimática.”
Enquanto isoladamente o tratamento eletroquímico removeu cerca de 10% do BPA da água e o enzimático, cerca de 35%, a combinação dos dois removeu 92%, com “uma oxidação mais profunda e eficiente, mesmo para compostos recalcitrantes (substâncias que resistem à degradação e aos processos de tratamento convencionais), superando os resultados dos métodos tradicionais isolados”, informa o pesquisador.

O sucesso do novo método, no entanto, ainda precisa ser confirmado em estações de tratamento de água. É que os testes foram realizados em amostras laboratoriais e precisam de adaptações para as estações. O pesquisador explica que “em sistemas reais, a presença de uma grande diversidade de compostos orgânicos pode interferir nos mecanismos de degradação e gerar subprodutos inesperados”. Além disso, “questões de custo, manutenção dos eletrodos (no caso do método eletroquímico) e regeneração das enzimas ainda precisam ser resolvidas”.
Outros desafios mencionados pelo pesquisador envolvem a estabilidade dos eletrodos, utilizados no processo eletroquímico, e das enzimas, utilizadas no processo enzimático, em condições reais de operação; o custo de produção e manutenção dos materiais; e a necessidade de adaptar o sistema a diferentes matrizes de efluentes.
“É preciso considerar a geração de subprodutos e a eficiência energética do processo”, destaca. Esse escalonamento requer investimentos em pesquisa aplicada, testes em planta piloto e avaliações ambientais e econômicas robustas.
Mas, segundo ele, os investimentos devem valer a pena. “O método tem potencial para tratar uma ampla gama de poluentes orgânicos, como corantes, pesticidas, fármacos e compostos fenólicos (substâncias químicas encontradas em vegetais)”, enfatiza.
O artigo Combining electrochemical and enzymatic treatments to enhance bisphenol a degradation in water pode ser lido neste link.
Mais informações: e-mail alexandre.carneiro90588@gmail.com, com Alexandre Carneiro Cunha.
*Estagiária com orientação de Rita Stella
**Estagiária com orientação de Moisés Dorado