“Novas” cianobactérias podem ajudar na luta contra efeito estufa
Pesquisadores de Estados Unidos e Itália descobriram nova cepa de cianobactérias (algas), totalmente isolada de fontes oceânicas vulcânicas que consegue crescer rapidamente com a presença de CO₂ e facilmente afunda na água.
Essas características tornam essa nova cepa de cianobactérias boa candidata a ser parte central em projetos de sequestro de carbono de base biológica e bioprodução de commodities, traz o Phys.org.
Detalhes da nova cepa de cianobactérias
- A nova cepa foi apelidada de “Chonkus”;
- Ela foi encontrada na costa da ilha de Vulcano, na Sicília (Itália). Lá, este ambiente tem CO₂ marinho em abundância dada as aberturas vulcânicas rasas;
- A descoberta foi detalhada em artigo publicado na Applied Environmental Microbiology.
O carbono dissolvido é relativamente diluído em comparação a todas as outras moléculas no oceano e isso limita o crescimento de organismos fotossintéticos que vivem lá. Decidimos investigar o que acontece quando você alivia esse fator limitante indo para um lugar com bastante carbono, onde alguns organismos poderiam ter desenvolvido a capacidade de usá-lo para galvanizar seu crescimento.
Max Schubert, Ph.D., coautor correspondente, ex-cientista da equipe do Wyss Institute na Universidade de Harvard (EUA) e atual Cientista Líder de Projetos na Align to Innovate
“Essa cepa natural de cianobactéria tem várias características que podem ser úteis aos humanos, incluindo crescimento altamente denso e tendência natural a afundar na água, tornando a Chonkus um organismo particularmente interessante para trabalhos futuros em descarbonização e biofabricação”, prosseguiu Schubert.
Schubert teve, como seu autor correspondente, Braden Tierney, Ph.D., começando a trabalhar juntos quando estavam na Harvard Medical School (HMS), em 2016.
O agora Cientista Líder de Projetos na Align to Innovate é um microbiologista que busca construir ferramentas para evolução direcionada de bactérias e seus genomas. Em 2019, ele propôs levar seu trabalho às cianobactérias.
A proposta foi apresentada no Simpósio sobre Mudanças Climáticas de 2019 do HMS Consortium for Space Genetics. Ele ganhou o prêmio principal, o que financiou suas primeiras investigações relacionando seu trabalho principal às cianobactérias, visando estudar seu potencial de ajudar a fixar e sequestrar CO₂.
Por sua vez, Tierney, à época, era pós-doutorando coorientado pelo orientador de Schubert, George Church, Ph.D. Ele recebeu de um amigo um artigo sobre as infiltrações rasas (áreas no fundo do oceano nos quais os gases se infiltram na água, mas são rasas o bastante para receber a luz solar), percebendo que poderiam existir micróbios fotossintéticos vivendo em tais ambientes que evoluíram para adquirir a habilidade de capturar CO₂ dissolvido da água.
Para expandir o projeto, Tierney se uniu a Marco Milazzo, Ph.D. e Paola Quatrini, Ph.D, ambos professores na Universidade de Palermo (Itália). A dupla estava estudando essas fontes rasas.
O então pós-doutorando obteve financiamento para realizar uma expedição de coleta e falou com Schubert visando ajuda no entendimento e, também, para trabalhar com as cianobactérias potencialmente presentes no ambiente estudado.
Aos pesquisadores, se uniram outros profissionais do Wyss Institute, HMS, Weill Cornell Medical College, Colorado State University, University of Wisconsin-Madison, MIT, National Renewable Energy Laboratory no Colorado e diversas instituições de Palermo.
Uma vez juntos, eles fizeram uma expedição de campo ao oceano na costa de Vulcano. Lá mergulharam e coletaram amostras de água advindas de vazamento raso rico em carbono.
Essas amostras foram encaminhadas para Boston (EUA), onde cientistas liderados por Schubert isolaram e caracterizaram os micróbios presentes na água analisada.
Visando estimular as cianobactérias a crescerem, os pesquisadores replicaram as condições nas quais os micróbios de crescimento rápido prosperariam, ou seja, em temperaturas quentes, cheio de luz e de CO₂.
Após isolarem as culturas de enriquecimento, eles descobriram duas linhagens de cianobactérias de crescimento rápido, chamadas de UTEX 3221 e UTEX 3222. A escolhida para ser mais bem estudada foi a UTEX 3222 por conta de seu crescimento unicelular. Isso facilitou sua comparação com cepas de cianobactérias existentes.
A linhagem produziu colônias maiores do que outras linhagens de cianobactérias de crescimento rápido previamente conhecidas, além de que suas células individuais também eram maiores.
Ela chegou a densidade maior do que as outras linhagens, pareceu abrigar grânulos de armazenamento contendo CO₂ nas células e obteve conteúdo geral de carbono superior às demais linhagens. Essas características são importantes para sequestro carbono e bioprodução.
Além disso, outro comportamento apresentada pela Chonkus é que ela, rapidamente, se estabeleceu em pellet denso, simular a uma “manteiga de amendoim verde”, localizado no fundo dos tubos de amostra, enquanto outras linhagens permaneceram suspensas.
Isso é valioso para o processamento industrial, uma vez que concentrar e secar biomassa, atualmente, responde a entre 15% e 30% dos custos de produção.
Muitas das características que observamos em Chonkus não são inerentemente úteis em seu ambiente natural, mas são muito úteis para os humanos. Organismos aquáticos crescem naturalmente em densidade muito baixa, mas ser capaz de crescer até alta densidade em temperaturas mais altas é muito útil nos ambientes industriais que usamos para fabricar muitos bens e produtos e pode ajudar a sequestrar mais carbono.
Existe quantidade incrível de diversidade microbiana no mundo e acreditamos que é mais eficiente procurar os micróbios que já evoluíram para ter sucesso em ambientes relevantes para os humanos em vez de tentar modificar todas as características que queremos em bactérias E. coli cultivadas em laboratório.
Braden Tierney, Ph.D., coautor do estudo
Além das potenciais aplicações de Chonkus e de versões modificadas no sequestro de carbono, vários produtos fabricados em algas podem ser feitos de forma mais eficiente a partir de uma cepa que cresce mais rápida e densamente, como ácidos graxos ômega-3.
Quanto ao sequestro de carbono, o fato de as cianobactérias colherem carbono diretamente do ambiente ao qual pertence para crescer mostra que elas são capazes de acoplar os processos de sequestro de carbono e biofabricação em um só organismo.
As amostras de UTEX 3222 e UTEX 3221 foram criopreservadas e disponibilizadas de forma pública para uso de outros pesquisadores na Coleção Cultura de Algas da Universidade do Texas em Austin (EUA).
Próximas etapas
Após o êxito obtido com as cianobactérias italianas, Tierney e dois coautores do artigo, Krista Ryon e James Henriksen, resolveram criar uma fundação sem fins lucrativos chamada Two Frontiers Project. Ela estuda, a partir de expedições científicas de última geração, como a vida prospera em ambientes externos.
Eles já fizeram expedições a fontes termais no Colorado (EUA) Terras Fumegantes no Mar Tirreno, recifes de corais localizados no Mar Vermelho e a outros locais. A Two Frontiers foca em micróbios com usos para três principais aplicações: captura de carbono, upcycling de CO₂ para produtos sustentáveis e restauração do ecossistema de corais.
As características inerentes às cepas de cianobactérias naturalmente evoluídas descritas nesta pesquisa têm o potencial de serem usadas tanto na indústria quanto no meio ambiente, incluindo a biofabricação de produtos úteis à base de carbono ou o lançamento de grandes volumes de carbono no fundo do oceano.
George Church, Ph.D., professor na Robert Winthrop de Genética na HMS e de Ciências da Saúde e Tecnologia em Harvard e no MIT
“Embora modificações adicionais possam ser feitas para melhorar as habilidades desses micróbios, aproveitar bilhões de anos de evolução é avanço significativo na necessidade urgente da humanidade de mitigar e reverter as mudanças climáticas”, prosseguiu.
“Mas é muito importante ‘construir os cintos de segurança antes de construir o carro’ — nosso laboratório também estuda abordagens de biocontenção que ajudam a conter e controlar esses tipos de experimentos.”
O Wyss Institute foi fundado com base na crença de que a natureza é a melhor fonte de inovação do planeta e que imitar seus princípios é a chave para gerar impacto positivo.
Estou orgulhoso desta equipe por sair do laboratório e buscar as melhores ideias da natureza onde elas já se desenvolveram. Este é um exemplo maravilhoso de como nossa nova Sustainable Futures Initiative está buscando abordagens inovadoras para enfrentar as mudanças climáticas — o maior desafio da nossa geração.
Don Ingber, MD, Ph.D., diretor-fundador do Wyss, professor na Judah Folkman de Biologia Vascular na HMS e no Boston Children’s Hospital e na Hansjörg Wyss de Engenharia de Inspiração Biológica na Escola de Engenharia e Ciências Aplicadas John A. Paulson de Harvard