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Mestrandos da PUC-Rio criam adaptadores de água potável para ajudar o RS

Mestrandos da PUC-Rio criam adaptadores de água potável para ajudar o RS

Iniciativa contou com a colaboração de designers de todo o Brasil e trouxe recursos hídricos até para povoados e quilombolas em Canoas

Diante da falta de água potável no Rio Grande do Sul após as enchentes, mestrandos do Biodesign Lab da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-Rio) desenvolveram um adaptador para dispositivos de filtragem de água. O projeto, intitulado “H20bah”, permite que as vítimas da tragédia tenham acesso à água de qualidade.

O adaptador está sendo distribuído em um kit, que também contém um saco resistente para servir como recipiente para a filtragem de água, uma vela de filtro de barro e um manual de instruções desenvolvido pela equipe da PUC-Rio. A estimativa é que 1.500 adaptadores tenham sido impressos e 400 entregues.

O projeto teve a iniciativa do professor João Azevedo, do Biodesign Lab, e do aluno de mestrado Raphael Bastos, que possibilitaram o envolvimento de profissionais de Design de Produto de todo o Brasil.

Quem tiver impressora 3D pode fabricar o adaptador e mandar para a PUC-Rio que está funcionando como um centro de recepção de doações para confecção das peças, ou para outro ponto de distribuição.

Pessoas que não possuem a impressora também podem contribuir doando peças como filtros ou anéis de vedação, que normalmente são vendidos em lojas de material de construção. A equipe do laboratório da PUC-Rio monta o kit com todos os itens recebidos e produzidos, e posteriormente, o envia para o Rio Grande do Sul.

Bate-papo hídrico

Tudo começou em um grupo de WhatsApp que tinha 200 membros, incluindo designers do Brasil. ”Eu estava em viagem antes e, quando cheguei, fiquei muito sensibilizado [com a tragédia no RS] e com o relato de outros membros [do grupo], que também foram afetados e perderam suas casas. Comentamos: ‘falamos tanto sobre o impacto do design e sobre seu potencial, está na hora de arregaçarmos as mangas e fazer [alguma coisa]’, disse Bastos à GALILEU.

Mais tarde, outro grupo de WhatsApp foi criado, juntando membros que quisessem ajudar. Em apenas 2 horas, o grupo contava com mais de 100 integrantes, incluindo engenheiros, médicos e pessoas de todos os lugares do Brasil.

“Aceitar a ideia dos outros também foi fundamental para que tudo isso conseguisse se desenvolver”, relata Bastos.“Uma semana depois, a gente tinha dois modelos validados e testados em todo o Brasil. Também optamos por não pegar dinheiro de ninguém para não ter essa dificuldade de manusear o dinheiro das pessoas.”

Acessível e ecológico

Um dos objetivos do projeto é ser acessível para que todas as pessoas possam ajudar. Pensando nisso, os pesquisadores não pretendem patentear o adaptador e não querem que terceiros comercializem a ideia.

O professor Azevedo acredita que a proposta é uma forma de devolver para a sociedade o investimento do dinheiro público. “Nós que estamos dentro da academia, nós damos de volta para nossa sociedade aquilo que a gente aprende aqui”, afirma “Eu fiz graduação, mestrado e doutorado, que tem bolsa com dinheiro público, então, eu acho que [o projeto] é um elemento de retorno que a gente tem que dar para a sociedade”.

Com a acessibilidade do projeto, a filtragem de água pode acontecer em diversas regiões do país. “Ela precisa estar acessível a maior quantidade de pessoas, até porque [o adaptador] não é uma peça que serve somente ao sul. Em um dos casos, no Piauí, um professor disse que tinha impressora 3D na escola pública e que poderia usar”, relata Azevedo.

O kit com todos os itens necessários para filtrar a água pesa em torno de 400 gramas, o que facilita o transporte. O equipamento tem capacidade de filtrar 50 litros de água por dia para até 20 pessoas durante cerca de 10 dias. “O kit completo custa menos de R$ 20 reais, podendo gerar água durante 10 dias e 500 litros de água no total”, contabiliza Bastos.

O adaptador em conjunto com um saco resistente para servir como recipiente para a filtragem de água e com uma vela de filtro de barro. — Foto: Biodesign Lab/PUC-Rio
O adaptador em conjunto com um saco resistente para servir como recipiente para a filtragem de água e com uma vela de filtro de barro. — Foto: Biodesign Lab/PUC-Rio

A cada dezena de dias, é recomendado que o adaptador seja lavado ou descartado, diante da impossibilidade de ser higienizado. A peça só pode ser usada por no máximo trinta dias. Isso porque objetos impressos podem conter ranhuras, que facilitam o acúmulo de bactérias.

Os plásticos envolvidos no processo são o Ácido Polilático (PLA) e o Acrilonitrila butadieno estireno (ABS), que, após serem descartados, podem ser encaminhados para a reciclagem. João Azevedo reforça que a quantidade de garrafas de água que estão sendo encaminhadas para ajudar o Rio Grande do Sul podem impactar o meio ambiente de forma mais significativa do que esses materiais.

Uma das dificuldades do projeto foi conciliar as necessidades e vontades das pessoas para fazer um produto utilizável, mas que também pudesse ser entregue. Diante disso, os pesquisadores queriam legitimar sua invenção como algo que fora testado e estudado pela equipe.

Com o bombardeamento de informações das redes, alguns indivíduos poderiam priorizar ideias de influenciadores, por exemplo. “Todo mundo quer que as pessoas bebam água, mas ela precisa ser de fato segura para beber”, ressalta o professor.

Universidade desenvolve adaptadores de água potável para auxiliar vítimas das enchentes no Rio Grande do Sul com impressora 3D — Foto: Biodesignlab DASA/PUC-Rio
Universidade desenvolve adaptadores de água potável para auxiliar vítimas das enchentes no Rio Grande do Sul com impressora 3D — Foto: Biodesignlab DASA/PUC-Rio

Outro desafio do projeto foi a logística de transporte para o Rio Grande do Sul. “Como transportar coisas da casa das pessoas? Como transportar essas coisas no Brasil? Como organizar os dados de todo o mundo?”, foram algumas questões levantadas pela equipe, segundo Bastos. O estudante também reforçou que o fluxo de informação foi importante para que o projeto acontecesse.

Conforme os pesquisadores, quilombolas e povoados em Canoas estão fazendo uso do adaptador. A situação de regiões interioranas está mais crítica porque a água potável está sendo destinada principalmente aos centros urbanos.

“Especialmente povoados que estão ao redor [da cidade] têm sofrido muito mais. Porto Alegre é uma cidade grande, é uma capital, vai começar a chegar água primeiro nesses lugares e depois vai chegar [no interior]”, observa Azevedo. “Então é um processo que tem acontecido e a galera tem até agradecido e pedido [o produto] por estarem nessa parte mais externa dos lugares”.

Para saber mais e fazer parte, acesse o site do projeto H20bah.