Iniciativa mapeia mais de 180 ruas abertas para lazer no Brasil

Realizado pelo Instituto Caminhabilidade, mapeamento inédito busca apoiar que mais cidades e mais modelos desse programa sejam realizados
Mais de 180 ruas já foram identificadas em todo o Brasil como parte de programas de Ruas Abertas, que transformam temporariamente vias destinadas aos carros em espaços de convivência, lazer e brincadeiras. A partir de um mapeamento nacional inédito lançado pelo Instituto Caminhabilidade, na Semana do Caminhar 2025, ficou evidente como essa política urbana vem ganhando força em diversas cidades brasileiras.
Fechar ruas para os carros e abrir para as pessoas é uma ideia simples, mas com grande impacto na forma como vivemos as cidades. Popularizado em São Paulo como “Ruas Abertas”, esse modelo de uso do espaço urbano permite, por algumas horas, que o asfalto deixe de ser pista de passagem rápida e vire palco de encontros. É uma medida barata, que inverte as prioridades nos espaços públicos e ajuda a construir cidades mais justas e acolhedoras.
Esse tipo de política urbana é de baixo custo, mas traz alto retorno social ao devolver às pessoas o direito ao espaço público. É também uma estratégia relevante para o enfrentamento das mudanças climáticas, funcionando como Zona de Baixa Emissão e espaço de respiro em cidades densas e quentes.
De Bogotá ao Brasil
O conceito não é novo. Em Bogotá, na Colômbia, desde 1974, grandes avenidas são abertas ao lazer e ao esporte com o programa Ciclovias Recreativas, que permanece ativo e em expansão até hoje.
No Brasil, as primeiras ações surgiram também nos anos 1970, como o programa Ruas de Lazer de São Paulo, criado em 1976. Segundo o levantamento, é o mais antigo do país ainda em funcionamento, hoje gerido pela Secretaria Municipal de Esportes (SEME).
Os programas identificados se dividem em três tipos de vias: locais, avenidas ou vias expressas:
- Vias locais: geralmente em bairros residenciais;
- Avenidas: corredores urbanos com grande fluxo;
- Vias expressas: como o Eixão em Brasília ou a Avenida Paulista em São Paulo.

O Mapeamento Nacional de Ruas Abertas identificou mais de 180 ruas abertas no Brasil, organizadas em 12 programas e distribuídas por sete estados: Pará, Alagoas, Distrito Federal, Minas Gerais, Santa Catarina, São Paulo e Rio de Janeiro.

Dentre as iniciativas mais recentes, o levantamento identificou a Rua da Gente, em Benevides (PA). Criado em 2021, o projeto se diferencia ao ocupar as ruas no período noturno – das 18h às 22h -, promovendo brincadeiras e atividades com foco nas crianças e usando as ruas para fortalecer o vínculo das pessoas com a cidade.
Anos 1990: um boom das ruas abertas nas cidades brasileiras

Durante a redemocratização do Brasil, houve um crescimento expressivo dos programas de Ruas Abertas, pois retomou-se o direito ao lazer e ao encontro no espaço público. O país também já era majoritariamente urbano, com mais de 75% da população vivendo nas cidades, o que aumentou a demanda por áreas públicas de qualidade.
Destaque: Eixão do Lazer em Brasília

Criado em 1991, o Eixão do Lazer, na capital federal, transforma 14 km dos Eixos Norte e Sul em uma ampla área de lazer, funcionando todos os domingos e feriados das 6h às 18h – uma das iniciativas com o maior tempo de funcionamento contínuo do país.
Rio de Janeiro: Avenidas de Lazer conectam orlas e parques
No Rio de Janeiro, desde os anos 1990, o programa Avenidas de Lazer fecha trechos da cidade como a Avenida Atlântica, no coração de Copacabana. Com o tempo, o programa se expandiu para o Aterro do Flamengo, outras orlas e avenidas importantes, criando um potencial de conexão que, se unificada, formaria a maior extensão de Ruas Abertas do país.
Belo Horizonte e Campinas ampliam as opções de lazer urbano
A Rua é Nossa (Belo Horizonte/MG): abrange 16 ruas com atividades aos domingos das 7h às 14h. Algumas têm estrutura organizada pela prefeitura, com brinquedos infláveis, elásticos e áreas para crianças pequenas.

Ruas de Lazer (Campinas/SP): acontece em um trajeto circular em torno do Parque Taquaral, um polo de esporte e lazer da cidade. Organizado pela EMDEC, funciona aos domingos e feriados das 7h às 12h, integrando também uma ciclofaixa de lazer.
Paulista Aberta completa 10 anos
Um dos programas mais simbólicos do país, a Paulista Aberta, comemora 10 anos em 2025. A iniciativa teve origem em uma mobilização do SampaPé! (hoje Instituto Caminhabilidade) liderado por Letícia Sabino.
Inspirada pela Avenida Reforma na Cidade do México, Sabino trouxe a ideia após intercâmbio em 2014. Com apoio de organizações como Bike Anjo, Cidade Ativa e Aromeiazero, os ativistas passaram a ocupar a Paulista aos domingos, organizando brincadeiras, petições e eventos na calçada.

“A gente foi muitos domingos para a calçada da avenida para reivindicar que a rua toda fosse aberta. Íamos brincar, convidar as pessoas a brincarem também e, claro, assinar uma petição que chegava diretamente no e-mail do prefeito e do secretário de transportes”, relembra Letícia.
O primeiro “teste” aconteceu em 28 de junho de 2015, na inauguração da ciclovia da Paulista. A ocupação espontânea consolidou a proposta e resultou em uma política pública permanente, que atravessou quatro gestões.
Apesar do sucesso, o horário já sofreu alterações e ainda há desafios. Mais do que ampliar horários, o foco agora deve ser expandir o modelo para outras avenidas da capital e cidades brasileiras.