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Fórum das Águas denuncia devastação dos corpos hídricos. Artigo de Sandoval Alves Rocha

Fórum das Águas denuncia devastação dos corpos hídricos. Artigo de Sandoval Alves Rocha

“A água é um elemento imprescindível na vida, associando todos os seres vivos sob a mesma teia de integração e complementariedade. Os serviços ambientais da água possibilitam a permanência da vida no mesmo ecossistema global em uma rede de dimensões planetárias. O permanentemente fluir da vida é o grande milagre proporcionado pelo ciclo hidrológico que abrange as mais distantes regiões da terra”, escreve Sandoval Alves Rocha.

Sandoval Alves Rocha, doutor em Ciências Sociais pela PUC-Rio, mestre em Ciências Sociais pela Unisinos, bacharel em Teologia e bacharel em Filosofia pela Faculdade Jesuíta de Filosofia e Teologia (FAJE), membro da Companhia de Jesus (jesuíta), trabalha no Serviço Amazônico de Ação, Reflexão e Educação Socioambiental (Sares), em Manaus.

Eis o artigo.

No dia 26 de abril, o Fórum das Águas do Amazonas realizou na Praça Heliodoro Balbi, a IX Tribuna das Águas com o tema “Água e Bem Viver”. A iniciativa teve o apoio da Associação Habitat para a Humanidade e foi realizada em parceria com o Centro Associativo Amigos da Praça e a organização Elas por Elas com Eles. Em sintonia com ações sociais, que disponibilizaram diversos serviços na localidade, a Tribuna das Águas explanou a partir de variados olhares a relação das águas com a sociedade do Bem Viver inspirada no estilo de vida dos povos originários, que conviveu harmoniosamente com a natureza sem destruí-la.

Muitas organizações fizeram uso da palavra na tribuna: Articulação de Mulheres do Amazonas; Associação Arte na Luta contra o Câncer; Associação de Silves pela Preservação Ambiental e Cultural; Associação dos Docentes da UFAM; Associação dos Ex-alunos do Colégio Dom Pedro II; Central dos Movimentos Populares; Centro Associativo Amigos da Praça; Coletivo de Mulheres da Educação; Comissão da Ecologia Integral; Comissão Pastoral da Terra; Comunidade Portalzinho Mura; Discente do Colégio Amazonense D. Pedro II; Etnia Mura, Autazes/AM; Gabinete do vereador José Ricardo (PT); Igreja Anglicana; Laboratório de Antropologia da Vida, Ecologia e Política; Organização Converge; Representante da etnia Mura; Serviço Amazônico de Ação, Reflexão e Educação Socioambiental; Sindicato dos Trabalhadores de Pesquisa e Desenvolvimento Agropecuário e outros.

A água é um elemento imprescindível na vida, associando todos os seres vivos sob a mesma teia de integração e complementariedade. Os serviços ambientais da água possibilitam a permanência da vida no mesmo ecossistema global em uma rede de dimensões planetárias. O permanentemente fluir da vida é o grande milagre proporcionado pelo ciclo hidrológico que abrange as mais distantes regiões da terra. Esta sintonia de cooperação e interligação gera estilos de vida também colaborativos, onde todos os seres são valorizados nos papeis que exercem. Estilos de vida que comportam o respeito e a harmonia entre todas as formas de existência, sem destruição, exploração ou anulação do outro.

Ao contrário do estilo de vida moderno próprio das sociedades ocidentais, a sociedade do Bem Viver se processa em harmonia com a natureza, a partir do equilíbrio entre o ambiental, o econômico, o social e o cultural. Nesta sociedade, prevalece o principio da partilha material e espiritual entre os membros das comunidades com uma profunda comunicação circular e o desenvolvimento tecnológico servindo a vida em comum. Nesta organização social, os recursos naturais não estão a serviço de interesses particulares beneficiando empresas que priorizam a lucratividade acima dos interesses comunais. Ao contrário, na sociedade do Bem Viver todas as energias são bens comuns mobilizados para a manutenção da vida do conjunto dos seres vivos que compõem a comunidade, inclusive os seres não humanos.

Os palestrantes da Tribuna das Águas destacaram os riscos de atividades produtivas que não levam em conta o bem comum, mas têm um forte impacto destrutivo na vida das comunidades e na natureza, como a produção petrolífera, a mineração, o agronegócio e a agropecuária extensiva. Regimes ditatoriais que torturam, matam e retiram violentamente pessoas do convívio familiar também representam graves riscos a qualquer tipo de sociedade que busca a justiça, a sustentabilidade e a fraternidade. Práticas criminosas, como desmatamento, grilagem, poluição hídrica, garimpo ilegal e incêndios provocados desequilibram qualquer tentativa de construção de uma sociedade ambientalmente sustentável. Grandes empreendimentos hidrelétricos e rodoviários já provaram ser intervenções extremamente prejudiciais para o ciclo da vida, causando devastação e promovendo desestruturação social.

Tribuna das Águas também resgatou a audiência pública sobre as tarifas abusivas dos serviços de água e esgoto na cidade de Manaus, realizada na Câmara Municipal de Manaus no dia 31 de março deste ano. A empresa Águas de Manaus, apesar de oferecer serviços precários de abastecimento de água, cobra as tarifas mais elevadas da Amazônia, não apresentando nenhuma justificativa plausível para esta política. A população se encontra revoltada não somente por ser explorada pela empresa, mas também pelo fato de a concessionária cobrar tarifas onde os serviços não são realizados.

IX Tribuna das Águas finalizou convidando todos os participantes a realizarem um gesto simbólico da plantação de uma árvore em homenagem ao Papa Francisco. A plantação desta árvore na Praça Heliodoro Balbi simbolizou a esperança de que a construção de uma sociedade justa e sustentável é factível na medida em que nos mobilizemos para que este sonho seja realizado. O Papa Francisco fez a sua parte como liderança mundial, restando a cada pessoa e organização continuar se empenhando e sensibilizando a sociedade para que possamos construir relações harmônicas entre os homens e destes com a natureza.