Fígado humano se regenera, mas não do jeito que você pensa

O fígado humano se regenera — uma capacidade única entre os órgãos. Essa informação vem desde a mitologia grega, com o mito de Prometeu, que recebeu uma punição dos deuses: passar a eternidade acorrentado enquanto um abutre comia o seu fígado. Mas essa regeneração é um pouco diferente do que a gente imagina.
É justamente essa habilidade de regeneração que traz a força da punição presente no mito. Já que o órgão está sempre regenerando, a punição se faz infinita.
Com o decorrer do tempo, a ciência permitiu entender como exatamente esse processo regenerativo acontece e quais são as consequências dele.
O que o fígado faz?
Para começar, vale entender o que o fígado faz. O órgão desempenha três funções principais: serve como uma fábrica de proteínas, um filtro de sangue e um processador metabólico.
Ou seja: o fígado produz proteínas importantes que trabalham para equilibrar a espessura do seu sangue. Se o fígado não estiver funcionando corretamente, como por não receber os nutrientes certos. Também é esse órgão que limpa o enorme volume de sangue que flui do trato gastrointestinal de volta para o coração.
Cabe ao fígado, também, a tarefa de criar a bile que auxilia na digestão dos alimentos e que ajuda o corpo a absorver medicamentos.
Como o fígado regenera?
De acordo com o National Institutes of Health, o fígado pode voltar a crescer para um tamanho normal mesmo depois de até 90% dele ter sido removido.
O fígado é composto de estruturas repetidas chamadas lóbulos. Cada lóbulo consiste em três zonas:
- A zona 1 é mais próxima de onde o suprimento de sangue entra no lóbulo.
- A zona 2 fica no meio.
- A zona 3 é mais próxima de onde ele drena de volta.
Um estudo da Science mostra que hepatócitos (células hepáticas) na zona 2 fazem a maior parte do trabalho de manutenção normal do fígado e se dividem para substituir células do fígado em todas as zonas que atingem o fim de suas vidas.
Quando o fígado sofre dano induzido por toxina, hepatócitos da zona 2 proliferam para substituir o tecido lesionado nas zonas 1 e 3. Os estudos mostram que células da zona 1 também podem ser encontradas na zona 3 após células na zona 3 terem sido danificadas, e vice-versa.

Além disso, há uma via específica de sinalização celular que leva as células do fígado da zona 2 para “repovoar” o tecido danificado. As células na zona 2 recebem essa “posição privilegiada para regenerar o fígado” porque são protegidas de lesões tóxicas que afetam qualquer extremidade do lóbulo.
De acordo com um estudo da Nature Reviews Gastroenterology & Hepatology, a proliferação de hepatócitos durante a regeneração hepática é controlada por múltiplos sinais extracelulares, e a perda de hepatócitos que ocorre em doenças hepáticas crônicas desencadeia a proliferação dos hepatócitos sobreviventes e os expõe a lesões potencialmente que podem levar a um tumor.
Implicações na regeneração do fígado
Mas quando pensamos na regeneração do fígado, acreditamos que o órgão refaz da mesma maneira, sem nenhum tipo de empecilho. Não é bem assim.
Quando uma parte do fígado é retirada, isso pode comprometer a circulação, uma vez que os vasos sanguíneos não se recuperam plenamente. Depois da regeneração, o tecido também pode ficar mais duro que o original.
O fígado regenera, mas não é invencível
Mas apesar da habilidade de regeneração, precisamos ter em mente que o fígado não é invencível. Muitas doenças e exposições podem prejudicá-lo além do ponto de reparo, como:
- Câncer
- Hepatite
- Doença hepática gordurosa
- Esteatose hepática
- Cirrose
Por conta disso, todos os anos, milhares de pessoas recebem um transplante de fígado. No entanto, muitas outras que precisam de um e não conseguem o órgão a tempo.
Ciência contra doenças hepáticas
Justamente por isso os pesquisadores buscam uma forma de poder aumentar a capacidade natural do fígado de se reparar, e até pensam fora do convencional em busca de uma solução.
É o caso, por exemplo, de um tratamento experimental para criar um “novo fígado” em humanos. Neste novo método — ainda longe de ser uma realidade nos hospitais, já que as pesquisas só começaram — os hepatócitos são injetados nos gânglios linfáticos.
Dentro dos gânglios, as células do fígado se multiplicam e formam uma massa que se conecta ao sistema circulatório, até o surgimento de um minifígado capaz de reverter a insuficiência hepática.