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Estimativa de temperatura contribui com a investigação de vida em planetas similares à Terra

Estimativa de temperatura contribui com a investigação de vida em planetas similares à Terra

Modelo aplicado em estudo indica que planetas da nossa galáxia, a Via Láctea, são compatíveis com temperaturas amenas e a presença de água líquida, o que aponta para a possibilidade de existência de vida

Na nossa galáxia, a Via Láctea, existem planetas com densidades que indicam a possibilidade de terem uma superfície sólida semelhante à da Terra, os exoplanetas rochosos. Para estimar sua temperatura e verificar as chances de abrigar vida como na Terra, cientistas brasileiros aplicaram um modelo, desenvolvido pelo próprio grupo de pesquisadores, que considera aspectos como o tamanho e a forma da órbita, a radiação refletida na superfície e a existência de atmosfera.

A pesquisa concluiu que os exoplanetas analisados são compatíveis com temperaturas amenas e a presença de água líquida. Ao mesmo tempo, o estudo verificou que as maiores variações de temperatura acontecem em planetas com órbitas excêntricas, de formato diferente do circular, e as menores acontecem quando a atmosfera é mais espessa.

As conclusões do trabalho são apresentadas em artigo da revista científica Monthly Notices of the Royal Astronomical Society, publicado no último mês de junho. “Exoplanetas são planetas que se encontram fora do Sistema Solar, ou seja, orbitando estrelas que não são o nosso Sol”, relata a pesquisadora Raquel Farias, do Programa de Pós-Graduação Interunidades em Biotecnologia (PPIB) e do Laboratório de Astrobiologia do Instituto de Química (IQ) da USP, uma das autoras do trabalho. “Eles foram descobertos no início da década de 1990 e, atualmente, já conhecemos mais de 5.700 exoplanetas”.
Raquel Gomes Gonçalves Farias – Foto: Currículo Lattes

De acordo com Raquel Farias, exoplanetas rochosos são aqueles que possuem uma superfície sólida, como a Terra, e provavelmente apresentam em sua composição rochas e silicato (compostos de oxigênio e silício), e a presença de uma superfície sólida é interessante do ponto de vista da astrobiologia (área de pesquisa científica que estuda a vida no Universo, origem, evolução, distribuição e futuro, em conexão com o ambiente astronômico), pois indica que o planeta pode abrigar grandes corpos de água líquida. “O interesse por planetas rochosos está justamente no potencial de serem semelhantes à Terra e, assim, terem a possibilidade de abrigar vida, como ocorre no nosso planeta”, ressalta.

“O nosso maior objetivo é desenvolver métodos para descobrir planetas e luas habitáveis fora do Sistema Solar”, afirma a pesquisadora. “Em particular, o trabalho buscou modelar a temperatura de exoplanetas reais e hipotéticos e exoluas hipotéticas ao longo de vários períodos orbitais, para averiguar se eles apresentariam condições de temperatura que permitiriam condições de habitabilidade”.

Gráfico do modelo de variação da temperatura de uma Terra hipotética, quando se altera a densidade da atmosfera, demonstrando sua influência na estabilização da temperatura ao longo do tempo – Imagem: Cedida pelas pesquisadoras
Modelagem da temperatura dos exoplanetas reais estudados, o Kepler-422 b e o Kepler-186 f, dada a variação da excentricidade, ou seja, do quanto a órbita é diferente do formato circular – Imagem: Cedida pelas pesquisadoras

Temperatura

Raquel Farias explica que a temperatura de um planeta depende de vários parâmetros, como a distância até a estrela hospedeira, a excentricidade orbital, ou seja, o quanto sua órbita difere de um círculo, a emissividade, o albedo (porcentagem de radiação refletida pela superfície) e a presença de uma atmosfera. “Nossa intenção era averiguar como cada parâmetro influencia na estabilização da temperatura de um planeta rochoso, como a Terra”, aponta.

Todos os exoplanetas estudados estão dentro da nossa galáxia, a Via Láctea, e estão dentro da chamada Zona Habitável (ZH) de suas estrelas, explica Raquel Farias. A ZH é definida como a região ao redor da estrela dentro da qual é possível a existência de água no estado líquido na superfície de um planeta rochoso. “Foram analisados os exoplanetas rochosos Kepler-186 f e Kepler-422 b, e exoluas hipotéticas em torno dos exoplanetas gigantes HD 128 356 b, HD 147 513 b, HD 45 364 c, HD 165 155 b e HD 221 287 b”, descreve. “Estudamos a influência de vários parâmetros orbitais e atmosféricos individuais na temperatura de exoplanetas usando um modelo publicado anteriormente por um dos autores do artigo, Rafael Pinotti, e modelamos a temperatura de exoplanetas reais e de exoluas hipotéticas com base nos dados de observação disponíveis.”

“Dessa forma, modelamos um planeta com todas as características reais da Terra, o qual chamamos de ‘Terra hipotética’ e variamos cada parâmetro individualmente, para obter a sua influência específica na temperatura”, afirma a pesquisadora. “Em seguida, usamos o modelo para calcular a temperatura de exoplanetas reais, como também adaptamos o modelo simulando a presença de exoluas em torno de exoplanetas orbitando diferentes tipos de estrelas.”

Os pesquisadores verificaram que as temperaturas dos planetas analisados de fato são compatíveis com temperaturas amenas e a existência de água no estado líquido. “Planetas e luas em seu entorno com órbitas mais excêntricas, como esperado, apresentam maior variação de temperatura ao longo do ano e a densidade da atmosfera age no sentido oposto: quanto mais espessa a atmosfera, menor são as oscilações de temperatura ao longo do ano”, diz Raquel Farias. “Além disso, vimos que a amplitude das variações de temperatura em exoluas não pode ser detectada com a tecnologia atual no momento”.

A autora principal do artigo é Beatriz Blanco Siffert, professora do campus Duque de Caxias da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). Também participaram do trabalho Raquel Farias, os doutorandos Matias Garcia e Luiz Felipe Melo de Menezes e o pesquisador Marcelo Borges, do Observatório Nacional (ON), o professor Gustavo Porto de Mello, do Observatório do Valongo da UFRJ, e Rafael Pinotti, que trabalha na Petrobras.

Mais informações: e-mail raquelfarias@usp.br, com Raquel Farias