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Especialistas são contra retorno das girafas importadas pelo BioParque à África do Sul

Especialistas são contra retorno das girafas importadas pelo BioParque à África do Sul

Ao contrário da recomendação feita pelo Ministério Público Federal (MPF) ao Ibama no dia 28 de janeiro, especialistas se posicionam de forma contrária à devolução para a África do Sul das 15 girafas importadas pelo BioParque do Rio. Eles alegam que, além de eventuais problemas de manejo e adaptação, é muito grande o risco desses animais serem destinados ao abate seletivo assim que chegarem ao país africano.

Para o biólogo e mestre em zoologia Igor Morais, ex-integrante da Associação de Zoológicos e Aquários do Brasil (Azab), ao invés de enviá-los ao exterior, a Azab deveria se juntar imediatamente às autoridades, como o Ibama, para buscar a melhor saída possível para os animais, “destinando-os a zoológicos onde terão vida digna e com propósito”.

— Não é viável devolver os animais à África, pois não sabemos sua origem exata e, muito provavelmente, eles são excedentes destinados ao abate seletivo para controle populacional. Esta é uma realidade comum no sul desse continente. Os animais deveriam, se possível, ficar sob a tutela do Ibama: isso tornaria viável um programa de conservação, visto que, caso virem patrimônio de outras instituições, como é permitido por lei, pode haver o descumprimento das recomendações de manejo populacional por seus gestores — afirma o especialista.

Até mesmo o ambientalista Marcio Antonio Augelli, que denunciou ao Ibama a morte de três das 18 girafas inicialmente importadas, se diz contra a medida. Segundo ele, é provável que a África do Sul não as aceite de volta ou as sacrifique com a justificativa de prevenir a propagação de doenças.

— Se a África do Sul aceitar as girafas, o mais provável é que elas sejam sacrificadas logo no desembarque do aeroporto, para evitar uma suposta contaminação por agentes patogênicos dos espécimes em seu habitat natural. Isso sem contar no tremendo esgotamento físico e emocional do transporte — diz Augelli, que integra a Associação de Proteção Animal Mountarat e que, no último dia 4, enviou um ofício ao MPF pedindo para reconsiderar a recomendação.

Médico veterinário de animais silvestres, Mário Henrique Alves também pontua que uma nova viagem intercontinental não seria recomendada do ponto de vista técnico.

— Esse translado representaria um alto risco para esses animais do ponto de vista veterinário. É evidente que os animais não vieram para o Brasil por viés conservacionista e sim por interesses econômicos, mas agora que eles já estão aqui, um retorno não seria indicado — aponta Alves, que já trabalhou em zoológicos e projetos de conservação no Brasil e hoje atua em um zoológico na Colômbia.

A Azab também se diz contra o retorno dos bichos para a África do Sul alegando receio de que eles sejam sacrificados e também devido à exaustão das girafas caso sejam submetidas a uma nova viagem e, consequentemente, uma nova quarentena (a íntegra da nota enviada pela associação segue no fim deste texto). O GLOBO aguarda um posicionamento do MPF e do Ibama acerca da possibilidade das girafas ficarem no Brasil.

Confinamento

No dia 11 de novembro de 2021, há cerca de três meses, 18 girafas desembarcaram no Aeroporto Internacional do Galeão. Compradas pelo BioParque do Rio, elas vinham de Joanesburgo, na África do Sul. Algumas delas se tornariam atrações do zoológico, o que não ocorreu. Desde que chegaram, foram colocadas em quarentena no Portobello Safári (para onde foram transportadas em grandes caixotes içados por caminhões), em Mangaratiba.

Em 14 de dezembro, numa tentativa experimental dos veterinários de tirá-las do galpão fechado e levá-las para o solário, seis delas fugiram: três foram recuperadas, mas três acabaram morrendo logo em seguida. Desde então, as outras 15 girafas continuam confinadas em baias de 31 metros quadrados (três indivíduos em cada).

O BioParque informa que as girafas seguem “em processo de adaptação, e a prioridade é a segurança e o bem-estar dos animais. Todo o trabalho é conduzido pela equipe técnica, e informado aos órgãos competentes”. Diz ainda que os animais estão em período de adaptação e quarentena no cambiamento para, em seguida, irem para o solário. O terceiro estágio é a ida para um recinto de manejo maior. Por último, o acesso das girafas a uma área do recinto de 44 mil metros quadrados.

“A evolução dos estágios de adaptação dos animais é acompanhada com rigor técnico, e segue todos os procedimentos e protocolos necessários para garantir a segurança dos animais. O processo é lento e individualizado para cada animal. No momento apropriado, o Bioparque informará aos órgãos competentes sobre a evolução dos animais nos quatro estágios técnicos mencionados”, concluiu o BioParque, por nota.

Confira a nota da Azab na íntegra:

A Associação de Zoológicos e Aquários do Brasil (Azab) informa que a prioridade, neste momento, é cuidar dos indivíduos que chegaram ao Brasil, de forma a garantir bem-estar e qualidade de vida. De início, o retorno desses animais para a África do Sul pode parecer a alternativa mais assertiva. No entanto, é necessário analisar o contexto, uma vez que se trata de uma situação bastante complexa.

É necessário levar em consideração a trajetória desses animais até aqui. As girafas foram retiradas do ambiente onde viviam, passaram por uma quarentena, enfrentaram uma longa viagem, chegaram ao Brasil e aqui estão novamente em uma quarentena. Vale ressaltar que o retorno desses indivíduos para seu país de origem envolveria todo esse processo novamente, no qual exige analisar questões sanitárias, comportamentais e genéticas para inserí-los em um programa de reintrodução.

Além disso, cabe reforçar que própria legislação da África do Sul permite, em muitas regiões, o manejo para controle populacional da espécie. Diante desse fato, a Azab acredita ser sensato contribuir para a permanência desses animais no Brasil e, mais do que isso, garantir que recebam os cuidados necessários, independentemente de onde estejam.

A Associação enfatiza que a maior preocupação, neste momento, é garantir o melhor para as girafas. Para isso, a Azab se colocou à disposição dos órgãos competentes para auxiliar no que for necessário.