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Especialistas dizem o que pode ser feito para evitar desastres como o que assola o Rio Grande do Sul

Especialistas dizem o que pode ser feito para evitar desastres como o que assola o Rio Grande do Sul

A geografia do estado torna o RS mais vulnerável às mudanças climáticas. A proteção da capital precisa ser estendida a outras regiões para não sobrecarregar as defesas que já existem.

Jornal Nacional ouviu de especialistas para saber o que pode ser feito para evitar desastres como esse que assola o Rio Grande do Sul. Diante de imagens nunca vistas, diante de todos os superlativos dessa tragédia, uma pergunta se torna urgente: o que é preciso fazer para cenas como essa não se repitam?

No passado, o Rio Grande do Sul já se fez essa mesma pergunta e soube responder. As cheias de 1941 mostraram que a cidade estava à mercê de forças da natureza difíceis de controlar.

“A cidade é uma área de risco hoje. Em razão da impermeabilização do solo, em razão de uma série de outros fatores, às vezes de desvio ou canalizações de arroios, acabam afetando áreas que são frágeis do ponto de vista ambiental”, explica Heleniza Campos, professora de urbanismo na UFRGS.

A ideia de que Porto Alegre precisava se proteger foi ganhando força e tomando forma. E, ao longo de 30 anos, se consolidou.

O sistema de proteção contra as cheias de Porto Alegre é uma gigantesca obra de engenharia. Foi concluído na década de 1970. É formado por 68 km de diques, que cercam a cidade nas margens do Rio Gravataí e do Guaíba. Os diques chegam a 6 metros de altitude, nos pontos mais elevados, para evitar que a água entre na cidade.

Para ajudar a água a sair da capital, existem 19 estações de bombeamento. O sistema também é formado por 14 comportas, que permitem o acesso ao rio, e são fechadas nos momentos em que o nível do Guaíba está muito alto.

Nas chuvas da semana passada, a água entrou por brechas no sistema de diques e comportas. Para agravar o problema, várias casas de bombas tiveram que ser desligadas quando o nível da água atingiu a parte elétrica.

É difícil imaginar, mas sem os diques a tragédia teria sido ainda pior. Os especialistas precisam esperar a água baixar para entender exatamente o que aconteceu. Por que um sistema bem projetado e bem construído não funcionou plenamente?

“As causas que causaram essa falha provavelmente estão associadas à questão da manutenção que eventualmente não foi feita. As áreas inundadas seriam menores, o centro da cidade seria operacional, as pessoas poderiam ter, os acessos de saída e entrada da cidade alguns estariam operacionais para resgatar e fornecer auxílio, e o aeroporto estaria totalmente operacional, o que é muito importante nessa hora”, explica Jaime Frederic Gomes, professor da Escola Politécnica da PUC-RS.

O sistema que protegeu Porto Alegre ao longo de décadas envelheceu. E a ameaça também mudou.

“Os meteorologistas já veem, cientistas, até a questão da mudança climática, um fato, a gente vê isso. O que ela já diz para nós, pelos modelos, que os eventos eles vão ser cada vez mais frequentes. Mais chuvas e também mais secas”, afirma Jaime.

A geografia do estado torna o Rio Grande do Sul mais vulnerável às mudanças climáticas. A proteção da capital precisa ser estendida a outras regiões do estado para não sobrecarregar as defesas que já existem. Mudar de lugar bairros inteiros destruídos em cidades do interior pode significar apenas empurrar o problema.

“Mapeamento das zonas de risco é a primeira coisa. A partir desse mapeamento das zonas de risco, nós vamos avaliar efetivamente o que é melhor: remover pessoas ou fazer também um sistema de proteção. Eu entendo que vai se encaminhar também talvez para o mesmo sistema de proteção como Porto Alegre, diques. Se a cidade não for removida, estações de bombeamento” pontua o professor.

Uma outra solução possível seria uma obra no extremo sul do Brasil. O Guaíba escoa para a Lagoa dos Patos, uma enorme massa de água que dá no Oceano Atlântico por uma saída estreita, o canal de Rio Grande. O alargamento do canal é a solução mais fácil de imaginar, mas talvez seja a mais difícil de fazer.

“Uma obra de engenharia absurda. Não é só nem a questão de recursos financeiros, é um recurso que vai muito além, questões ambientais, questões sociais, tem gente instalada na beira da saída, tem fábricas, tem indústrias, tem uma série de sistemas”, comenta Jaime.

Porto Alegre, os rios e o lago são um conjunto inseparável que precisa viver em harmonia. A proteção contra a força das águas é uma condição da vida humana nesse meio ambiente. A natureza relembrou da pior forma possível as lições de 1941.

“Em qualquer lugar do mundo, a orla sempre é vista como um espaço cuja paisagem é atraente para investimentos públicos, investimentos privados. Então, ao longo do tempo, essa perspectiva foi se perdendo dos riscos que efetivamente a gente corria e, infelizmente, agora a gente de uma forma muito dramática tem que voltar os olhos para uma recuperação que não vai ser fácil”, conclui a professora Heleniza.