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Entenda a nomofobia, o medo de se sentir incomunicável sem um telefone por perto

Entenda a nomofobia, o medo de se sentir incomunicável sem um telefone por perto

Quem não conhece alguém que não consegue ficar muito tempo sem checar as mensagens no celular? Ou que fica nervoso quando sai e esquece o telefone em casa? Essa dependência, cada vez mais comum, pode indicar um problema sério, que psiquiatras já denominaram como nomofobia, o medo de ficar incomunicável pela falta do aparelho.

— Para saber se a pessoa tem um problema exagerado no uso de celulares é preciso definir se ela vive ansiosa, se sente desconforto caso não cheque o tempo inteiro se recebeu mensagens ou se fica em alerta na expectativa do sinal de notificações — exemplifica Maria Francisca Mauro, mestre em Psiquiatria pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ).

Diferentes estudos já relacionaram esses excessos no uso do celular a casos de depressão, ansiedade e estresse crônico. Por isso, há quem adote a estratégia de desligar as notificações para reduzir o número de vezes que olha o aparelho. Mas uma pesquisa da Universidade de Penn State, nos Estados Unidos, mostra que o efeito pode ser inverso.

A partir da análise de dados coletados sobre o tempo de tela de 138 pessoas, foi constatado que todos os participantes da pesquisa passaram a utilizar mais os dispositivos quando deixaram o celular em modo silencioso. Em média, eles checavam os telefones 53 vezes ao dia quando os alertas estavam ativados, frequência que passou para 98 vezes depois que os silenciavam. As pesquisas relacionando celular à dependência ainda são consideradas incipientes na psiquiatria.

— Dentro dos critérios de avaliação psiquiátrica ainda não temos uma classificação que configure o vício. Em pesquisas, avaliações e evidências, o termo mais utilizado é o uso problemático do celular. O que sabemos é que essas pessoas têm no uso do aparelho uma forma de manejar algumas emoções, para se sentirem menos entediadas e sozinhas, ou um sentimento de que estão inseridas socialmente através de interações nas redes, como se aquilo fosse uma medida de valor social — explica Maria Francisca.

Segundo ela, estudos mostram que há diferenças entre o uso problemático do celular e vícios em substâncias:

— Diferentemente da bebida alcoólica, do tabaco e de outras drogas, as dependências comportamentais não têm um ativo químico que atua no cérebro. Portanto, critérios como abstinência e a necessidade de usar maiores quantidades para obter o mesmo efeito ficam mais difíceis de serem caracterizados.

Em nível neurobiológico, sabe-se que existe um “sistema de recompensa cerebral” (SRC), que tem como função estimular comportamentos que colaboram com a manutenção da vida, como sexo, alimentação e proteção. Quando o SRC é ativado, com a liberação do neurotransmissor dopamina, proporciona imediatas sensações de prazer e satisfação. No entanto, ainda não há estudos que validem uma associação clara de ativação do SRC com o uso problemático do celular.

— Alguns marcadores nos mostram outros comportamentos mais validados, ou seja, quadros de adoecimento emocional, como depressão, ansiedade ou que configuram maior impulsividade. Pessoas que tendem a agir sem planejamento ou não se controlam mediante a ação, além de diagnósticos de transtorno de déficit de atenção e de hiperatividade, podem ter traços comportamentais do uso problemático do celular, em que a forma de comunicação se faz capaz de entrar numa rotina de adoecimento — diz a mestre em Psiquiatria da UFRJ.

Interferência na rotina

Hoje, o dispositivo também é visto como maior facilitador. Um fator de risco, por exemplo, são os jovens que estão mais expostos ao uso de mídias sociais. Uma pesquisa realizada pela Global Web Index (GWI), empresa de segmentação de público, aponta que o usuário típico da internet passa três horas e 39 minutos por dia utilizando a rede em seu celular.

— Para além de apontar o uso do celular com consequências maléficas para a saúde mental das pessoas, se faz necessário elas poderem conseguir ter mais conhecimento de sua interferência em suas rotinas de trabalho e na convivência com a família e amigos — comenta Maria Francisca.

Orientações para reduzir a utilização

Maria Francisca Mauro dá algumas orientações para diminuir o tempo de utilização do telefone celular. O primeiro passo, segundo ela, é tentar fazer essa redução de forma que não seja traumática.

— Precisamos listar quais medidas podem ser simples na vida da pessoa. É preciso compreender quantas horas por dia você está consumindo conteúdo em seu aparelho, além de observar se esse uso está distribuído em trabalho ou lazer — diz.

De acordo com a especialista, não deixar que o uso do celular interfira nas relações pessoas é fundamental.

— Importante observar o que a pessoa tem feito com o seu relacionamento interpessoal para que ele não seja ultrapassado por alguma interação via jogos, consumo de mídias sociais e outro elementos que acabam por retirar o diálogo, a conversa e as relações mais profundas, usando o celular como um artifício de fuga de uma rotina — acrescenta Maria Francisca, lembrando que não é recomendado utilizar o aparelho no período de uma a duas horas antes de dormir: — A luminosidade, as informações e os gatilhos emocionais podem dificultar o sono.