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Em busca do bebê saudável: rastreio de alterações genéticas avança na reprodução assistida

Em busca do bebê saudável: rastreio de alterações genéticas avança na reprodução assistida

Quando a farmacêutica gaúcha G.G. e o marido decidiram pela fertilização in vitro, conheciam “só o básico” dos processos de reprodução assistida. Foi novidade quando um geneticista comentou sobre um exame que permite analisar se os dois teriam genes com variantes associadas ao risco de desenvolver uma ou várias doenças, que poderiam ser passados à prole.

— Apesar de não termos nenhuma doença genética na família, pensamos na saúde do embrião — lembra G.G., de 39 anos.

O resultado apontou duas alterações genéticas na farmacêutica e uma no marido, que correspondiam a riscos para doenças diferentes. Se tivessem coincidido teriam optado por realizar uma biópsia nos embriões obtidos com a FIV, antes de implantá-los no útero, para verificar se eles carregariam as mesmas alterações.

— O exame nos tranquilizou em uma caminhada que é muito incerta. Agora estamos no segundo ciclo da FIV e temos mais segurança pelo que aprendemos.

A oferta de exames de detecção de doenças genéticas ainda surpreende muita gente, mas não se trata de nada futurístico. A tecnologia é real e tem avançado nos últimos anos, tanto na quantidade de doenças rastreadas, hoje em mais de 500, quanto na precisão e na acessibilidade, com custos em queda, embora ainda não seja ofertada no SUS.

A área se beneficiou do universo aberto com os conhecimentos gerados a partir do projeto genoma humano, focado em desvendar nosso DNA. Na última década, em especial, foi possível aprofundar o estudo dos genes responsáveis pelas características humanas, e também suas patologias. E, a partir disso, buscar também meios para prevenir — ou tratar — doenças derivadas de alterações genéticas.

Os painéis genéticos de portador, como são chamados, foram desenvolvidos para rastrear pessoas que não apresentam nenhum sintoma, manifestação ou diagnóstico de uma doença, mas que carregam alterações genéticas que podem ser passadas aos filhos e comprometer sua saúde.

Quando só um genitor tem essas alterações, a probabilidade de desenvolver algo é baixa. Mas, quando os dois têm a mesma mutação, a chance de nascimento de uma criança comprometida é de 25%, considerada alta.

— Muitas doenças graves são geneticamente determinadas e surgem de casais que não tinham nenhuma história familiar, e isso causa estranheza. Muita gente desconhece que pode ser genético. Mesmo pessoas que já tenham tido filhos “normais” antes podem ter outras gestações em que isso apareça, caso sejam portadores de alguma alteração — diz a ginecologista e especialista em reprodução assistida Isabel de Almeida, coordenadora do Centro de Fertilidade do Hospital Moinhos de Vento, em Porto Alegre.

Os exames podem apontar um “match” em que ambos os genitores sejam portadores de doenças genéticas. Se o casal estiver em um processo de FIV, é possível fazer uma biópsia embrionária e optar por não transferir os embriões que tiverem sido comprometidos geneticamente.

— A detecção pode ajudar a que crianças nasçam sem doenças graves, cuja expectativa de vida costuma ser baixa. Em países desenvolvidos, que realizam diagnósticos anteriores e rastreamento pós-parto também, 20% da mortalidade infantil está relacionada a doenças genéticas. E 10% das hospitalizações pediátricas estão relacionadas a complicações dessas doenças — explica a especialista.

A cientista de dados I.B., de 42 anos, começou a pesquisar sobre o tema depois de se decidir por uma maternidade solo, com o auxílio da FIV:

— Resolvi fazer o mapa genético para ver se eu tinha algum gene recessivo preocupante. Havia uma alteração, mas era algo simples. Se fosse grave, eu teria optado por um banco de sêmen do exterior, onde os doadores costumam fazer todo esse rastreamento, e assim poder diminuir as possibilidades de ter uma criança com algum problema sério.