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Dia da Terra: como um saco de batatas fritas jogado numa trilha pode afetar todo um ecossistema?

Dia da Terra: como um saco de batatas fritas jogado numa trilha pode afetar todo um ecossistema?

Você já ouviu falar em “não deixar rastros” ao fazer caminhadas? Aqui está a ciência por trás do motivo pelo qual é crucial sempre deixar os ambientes selvagens do jeito que os encontrou.

nosso planeta é repleto de delicados e diversos ecossistemas. Neste Dia da Terra, mais do que nunca, é preciso refletir como pequenas atitudes podem trazer grandes prejuízos ao meio ambiente, como por exemplo, um simples saquinho de alimento ao ser descartado em local errado pode prejudicar imensamente a natureza.

queda de um saco de salgadinho industrializado, batata frita chips, perturbou drasticamente o delicado ecossistema de uma caverna no Carlsbad Caverns National Park, no estado do Novo México, nos Estados Unidos, de acordo com publicações em redes sociais feitas por funcionários do parque em 6 de setembro de 2024.

Essa caverna é quase totalmente isolada do mundo exterior, portanto, a introdução de qualquer coisa estranha pode ser catastrófica. “A caverna tem de 90 a 100% de umidade, então as coisas ficam encharcadas rapidamente”, diz a guia do parque Ashley Parsons. Um lanche pastoso, por exemplo, atrai micróbios, estimulando o crescimento de mofo. Logo, algumas criaturas – como grilos, aranhas e morcegos – entram para se alimentar, espalhando a contaminação.

Os guardas florestais encontraram o pacote de batata frita em quatro ou cinco horas. “Mas isso pode ser tudo o que é preciso”, afirma Parsons. “Tenho certeza de que alguns grilos das cavernas fizeram um lanchinho”.

Com mais de 500 milhões de pessoas visitando os locais públicos em parques naturais (isso só nos Estados Unidos) todos os anos, há inúmeras oportunidades de prejudicar nossos lugares selvagens. “Quando você olha para a escala, é incrível”, diz Dana Watts, diretora executiva do Leave No Trace Center no Colorado.

Visitar um parque natural sem deixar rastros não se trata apenas de manter a natureza limpa — aqui está a ciência por trás do motivo pelo qual isso protege a vida selvagem.

Não deixe restos de alimentos

Embora o pacote de batata chips descartado tenha sido rapidamente removido das cavernas de Carlsbad, os resíduos de alimentos podem levar muito tempo para se decompor, especialmente em determinados ambientes. “Leva muito mais tempo para um caroço de maçã ou casca de banana se decompor em um deserto do que em uma área úmida ou floresta boreal”, explica Clara-Jane Blye, professora assistente de turismo sustentável na Universidade de Utah e membro da diretoria da Leave No Trace no Canadá.

As embalagens de alimentos industrializados são ainda piores. “Se jogarmos coisas como sacos plásticos, latas de metal ou outros tipos de lixo no oceano, o tempo de decomposição pode ser de séculos a milênios”, afirma Carlos Duarte, professor de ciências marinhas da Universidade de Ciência e Tecnologia King Abdullah, na Arábia Saudita.

Deixar resíduos no meio ambiente introduz os animais em uma dieta não natural e muda seu comportamento com consequências às vezes catastróficas. Quando pássaros ou peixes confundem plástico com comida, o plástico enche seus estômagos e eles não conseguem comer. “Eles basicamente morrem de fome”, diz Blye.

Os ursos que adquirem o gosto pelo lixo e se tornam um “incômodo” para os humanos podem ter de ser abatidos. “Os ursos podem se habituar à comida humana em três semanas”, comenta Watts. “Todo mundo perde nesse caso.”

Os resíduos biológicos também são problemáticos. As fezes de cachorros introduzem novos patógenos no ecossistema e o rastro desse predador perturba espécies de ungulados, como veados e alces. Enquanto isso, os excrementos humanos e o papel higiênico introduzem a bactéria e-coli nas fontes de água. “Isso pode nos deixar muito, muito doentes”, diz Blye.

Os especialistas recomendam que você se alivie em uma “bolsa de plástico” caso não tenha outra alternativa em meio à natureza e leve-a com você quando sair do local para descartá-la em local adequado. “Sei que parece muito estranho fazer cocô em um saco”, diz ela. “Mas também é estranho fazer em um buraco”.

Permaneça na trilha indicada

Nos parques nacionais na maioria dos países, as trilhas designadas são cuidadosamente projetadas para evitar áreas sensíveis ao meio ambiente. Sair da trilha indicada, mesmo para uma foto rápida, pode afugentar a vida selvagem. “Alguns animais podem parar de procurar alimentos, abandonam locais realmente bons para fazer ninhos e covas e têm menos probabilidade de voltar”, diz Blye.

Os impactos cumulativos de muitos visitantes resultam em danos de longo prazo à natureza e à vida selvagem em diversos parques. Mas as pessoas não pensam nisso quando veem a oportunidade perfeita para tirar fotos. “É uma coisa tão difícil de resistir”, afirma ela.

risco para ecossistemas sensíveis, como a crosta do deserto, muitas vezes não pode ser visto a olho nu.

É muito fácil para nós pensar: “Ah, tem flores silvestres ali. Não devo pisar nelas“, explica Blye, mas essas biocrostas discretas estão repletas de organismos microscópicos essenciais para a vida no deserto.

Esses minúsculos ecossistemas proporcionam muitos benefícios, incluindo a redução do risco de erosão e a ajuda na absorção de chuvas, e podem levar centenas de anos para retornar ao seu estado original.

Deixe “lembranças” locais para trás

Ao visitar ambientes oceânicos, é importante considerar “como chegaremos lá? Como partiremos?”, diz Duarte. Os barcos podem liberar óleo ou produtos químicos tóxicos na água e lançar âncora pode destruir os recifes de coral.

Os próprios turistas podem introduzir produtos químicos nocivos — “Nós nos cobrimos com uma loção protetora solar que também é comprovadamente tóxica, não apenas para os corais, mas para nós mesmos”, diz Duarte — ou danificar os corais chutando-os ou tocando-os. Quebrar acidentalmente um pequeno pedaço de coral “pode estar causando danos que durarão décadas”, diz ele.

“Provavelmente, o princípio mais desafiador para muitas pessoas é deixar o que você encontra em seus lugares originais”, afirma Watts, porque as pessoas adoram guardar lembranças. Mas levar uma lembrança tira os recursos do ecossistema. Por exemplo, por conta do turismo de massa, tornou-se mais difícil encontrar conchas.

Para Watts, vivenciar a natureza é bom para a saúde mental e física das pessoas, mas o incidente com a batata chips “ilustra a necessidade de as pessoas entenderem seus próprios impactos no meio ambiente”.