Conheça movimento que mostra como comprar (bem) menos beneficia a saúde mental, as finanças e o meio ambiente

O cansaço com o excesso de informações e produtos oferecidos à exaustão pelas redes sociais parece ser um dos principais agravantes para quem busca o estilo de vida
Na virada do ano, a nutricionista Thaís Surian, de 32 anos, cansou-se de olhar para o armário entulhado de roupas e sapatos. Embora tenha muitas peças — só vestidos, eram 30, e sandálias, 15 pares, alguns deles já doados —, percebeu que sempre vestia as mesmas combinações. As maquiagens e os outros itens de beleza seguiam pelo mesmo caminho, com batons e paletas de sombra e blush a perder de vista. “Estava consumindo há tempos de forma excessiva. Agora, tenho um objetivo maior, que é pagar as parcelas do meu apartamento e estou focada nisso. Quero adiantá-las o mais rápido possível”, explica a paulistana.
Para tanto, Thaís adotou uma tática em alta nas redes sociais como meta de 2025: o low buy (comprar menos, em tradução livre). A proposta do movimento não é parar de comprar em definitivo, mas sim, adquirir apenas o estritamente necessário. A nutricionista se propôs a ficar, ao menos, seis meses longe dos e-commerces e lojas físicas, mas as tentações surgem por todos os lados. “Outro dia, meu marido precisava comprar roupas de treino e fomos a um outlet da Adidas. Fiquei louca querendo uma camiseta, mas pensei bastante e consegui me controlar”, conta. Além da rua e dos shoppings, os estímulos surgem também nas redes e em conteúdos comerciais produzidos por influenciadores. “Tento evitar o Instagram por causa da quantidade de anúncios. Infelizmente, não posso abandoná-lo por causa do trabalho, mas o que era para ser uma distração, tornou-se um shopping”, acredita.
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O cansaço com o excesso de informações e produtos oferecidos à exaustão pelas redes parece ser um dos principais agravantes para quem busca o estilo de vida low buy. Segundo Paula Gonçalves Sauer, economista e professora da ESPM, em São Paulo, muitas vezes compramos produtos que nada têm a ver com nosso estilo de vida ou personalidade, simplesmente para termos a sensação de pertencimento. “É uma forma de ser validado pela família, por colegas. Na internet, tudo é muito visual. Tem que ter, ou no mínimo, parecer que tem”, diz. Por isso, as novas gerações buscam reprogramar o pensamento e escolhem “comprar” experiências em vez de coisas. “Os incontáveis lutos da pandemia, sentidos até hoje, transformaram os propósitos: ter menos coisas para limpar, guardar e consumir energia e dinheiro.”
Assim como Thaís, a carioca especialista em recursos humanos Bel Vazquez, de 41 anos, decidiu adotar o low buy e o transformou no plano “30 anos em 3” para finalizar o financiamento do imóvel próprio. Mas não só. Além do interesse por um estilo de vida minimalista, o movimento também é importante, diz, para que as mulheres olhem com mais carinho e disciplina para as finanças. “Tive zero educação financeira. Dinheiro sempre foi tabu. Nem na faculdade você é ensinada a gerir sua carreira”, admite. “Os homens constroem patrimônio, investem em viagens, estudo, gastam com qualidade. E nós, mulheres, somos incentivadas a consumir coisas. A renda escoa com algo que não trará retorno.”
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Na hora de fazer o “destralhe” de seu armário, Bel levou um choque ao perceber a quantidade de lixo gerado, principalmente, com itens de beleza e skincare. Por isso, na esteira do low buy, ela segue outra tendência, a do “project pan”, que viralizou no Tik Tok e incentiva as mulheres a finalizarem todos os seus produtos de beleza antes de comprarem um novo. “Tenho dez hidratantes corporais, dez perfumes, 30 batons… Para quê? E, com relação às roupas, mesmo ao fazer doações, você não sabe se aquilo realmente será usado ou descartado, virando lixo.”
Além de dar um tempo de roupas e outros itens de vestuário, a engenheira agrônoma Alana Galbiatti, de 28 anos, estendeu o seu low buy para o lazer. Ela e o marido diminuíram os jantares fora de casa aos finais de semana e priorizam restaurantes que aceitam vale-refeição. “Comecei a pensar em fazer uma reserva de emergência para a velhice. As pessoas não se planejam. Será que a minha geração vai conseguir se aposentar?”, reflete.
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Na opinião da psicóloga Larissa Fonseca, doutoranda pela Universidade Federal de São Paulo, à medida em que amadurecemos emocionalmente, percebemos o quanto o excesso de consumo não gera satisfação duradoura. E um dos benefícios de um estilo de vida quase sem compras é justamente a diminuição da ansiedade e a melhora na autoestima. “O uso consciente do dinheiro fortalece, no cérebro, o córtex pré-frontal, melhorando a tomada de decisões e reduzindo a impulsividade”, diz. “Não depender de bens materiais para validação social fortalece a identidade pessoal com a conscientização das qualidades reais de quem somos e não do que temos.
Ficou interessado em aderir ao low buy? Segundo o economista Allan Couto, uma ideia é começar estabelecendo um orçamento mensal que limite os gastos de compras não essenciais. “É importante se educar sobre produtos e marcas, priorizando a qualidade em vez da quantidade. Outra meta simples é guardar uma pequena quantia por mês, por menor que seja. Aplicativos de orçamento também ajudam a rastrear receitas e despesas. Experiências, no lugar de bens materiais, também podem ser mais prazerosas”, finaliza o especialista.