Anchor Deezer Spotify

Como as cidades brasileiras podem prevenir alagamentos

Como as cidades brasileiras podem prevenir alagamentos

Conheça algumas Soluções Baseadas na Natureza (SbN) já implementadas pelo país e resoluções híbridas para o escoamento de água

Após uma intensa onda de calor, as regiões sul e sudeste do Brasil registraram chuvas significativas no começo de outubro. O acúmulo de água preocupa os especialistas, tendo em vista os recentes alagamentos, inundações e deslizamentos de terra pelo país.

Em São Paulo, a Secretaria Municipal de Infraestrutura Urbana e Obras (Siurb) já empenhou R$ 1,2 bilhão para obras de drenagem em 2023. As intervenções visam aumentar a resiliência da cidade quanto aos alagamentos, incluindo a construção de vários piscinões. Além disso, a Prefeitura de São Paulo anunciou um amplo programa de investimentos para canalizar 57 córregos do município até o final de 2024.

“Nosso imaginário ainda é dominado pela necessidade de investimento em grandes obras de engenharia convencional para solucionar os problemas urbanos. Contudo, foram esses projetos que potencializaram as vulnerabilidades por tentarem controlar os processos e fluxos naturais, com a impermeabilização do solo e a canalização dos cursos d’água”, afirma Cecilia Herzog, pesquisadora do Departamento de Arquitetura e Urbanismo da PUC-Rio e membro da Rede de Especialistas em Conservação da Natureza.

Um destaque positivo do plano anunciado pelos gestores da capital paulista é a transformação dos leitos de alguns córregos em parques lineares, como o Itaquera, na zona leste. Além de servir ao escoamento, retenção e infiltração de água, essas Soluções Baseadas na Natureza (SbN) contemplam espaços verdes de lazer, atividade física e recreação socialmente inclusivos.

O conceito de SbN surgiu apenas no final dos anos 2000, mas não é necessariamente novo. Uma prova disso é o Parque Barigui de Curitiba (PR), e o Parque Taquaral, em Campinas (SP), ambos inaugurados em 1962.

“Construídos ao longo do rio, eles se transformam em grandes bacias de retenção de água durante a época de chuva. Inunda-se o parque para não inundar a cidade”, explica Cecilia. “As cidades esponjas da China ou sensíveis à água, como temos ouvido, preveem justamente espaços renaturalizados, com a volta da vegetação nativa”, completa.

Outra estratégia interessante é a de jardins filtrantes, como os implantados no Parque Orla Piratininga, em Niterói, no Rio de Janeiro. “Eles receberão a água poluída que antes desembocava na lagoa. Se não há uma área de infiltração, toda a poluição difusa, que acabaria sendo lavada nos primeiros 10 ou 15 minutos de chuva, cai direto no fluxo de água. Neste projeto, as plantas macrófitas agem como uma espécie de biofiltro, recuperando a qualidade da água que chega à lagoa”, diz Cecilia.

Infelizmente, com as cidades já consolidadas, nem sempre é possível abrir espaços amplos e naturais para o manejo de água. Neste caso, são necessárias soluções híbridas, como as biovaletas – canais projetados para acumular e escoar águas pluviais removendo detritos e poluição. São José dos Campos, por exemplo, já totaliza 270 m² da infraestrutura verde.

“Canalizar córregos e rios é a fonte do problema, não a solução. Os espaços onde a água se acomodava e escoava voltarão a alagar. Com a crise climática, tudo isso só se agrava”, afirma a especialista.

“O princípio de precaução não é efetivamente adotado no Brasil. Precisamos de um planejamento social e ecológico para a ocupação ou a adaptação frente às mudanças climáticas, a fim de prevenir outros desastres”, conclui.