Coluna Carbono Zero: Amazônia já emite mais carbono do que absorve
A maior parte do oxigênio da atmosfera, entre 50% e 80%, vem dos oceanos, onde ele é produzido pelo plâncton marinho. Não da Amazônia. Mas a floresta absorvia uma quantidade importante de CO2, ajudando a regular a temperatura global. Porém, recentemente veio a má notícia: a Amazônia não cumpre mais esse papel e, em muitos lugares, sobretudo na borda sudeste da floresta, ela já emite mais CO2 do que absorve.
Essa é a conclusão de um estudo (1) liderado pela pesquisadora Luciana Gatti, do Inpe (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais), e publicado na revista Nature. A equipe realizou 590 sobrevoos, medindo concentrações de CO2 e CO em quatro regiões da Amazônia, entre 2010 e 2018. E constatou que a floresta, ao menos em algumas regiões, já “virou o sinal” – de sorvedouro passou a ser emissora de carbono.
Em parte, não é difícil entender como isso acontece. A Amazônia inteira tem cerca de 123 bilhões de toneladas de carbono fixado em sua biomassa, no solo e no subsolo. Um jeito rápido de devolver tudo isso à atmosfera, de uma vez, é queimando. O desmatamento, portanto, cumpre um papel de destaque. Quando as árvores são derrubadas, a preparação do terreno para uso futuro (em geral para pasto ou agricultura) envolve queimar a área.
E o que deixa tudo mais preocupante é que as medições colhidas pelo grupo foram feitas entre 2010 e 2018, período em que o desmatamento não estava tão descontrolado quanto agora (naquela época, ele ficava ao redor de 7.000 km2 anuais, antes de explodir para mais de 10.000 km2 anuais em 2019 e 2020).
O clima também tem mudado, com alterações no regime de chuvas que estão tornando a região mais seca. A redução da umidade aumenta o risco de incêndios e leva as árvores a reduzir sua taxa de fotossíntese (isso quando sobrevivem). Ou seja, as mudanças climáticas também já estão pressionando a Amazônia a diminuir sua ação como sorvedouro de CO2. Imagine quando medirmos o impacto da recente explosão no desmatamento e nas queimadas.
A esta altura, não é descabido pensar que a floresta pode ter cruzado um “ponto de não retorno”, em que mesmo sem intervenções adicionais ela siga encolhendo e se “savanizando”, como há muitos anos os climatologistas suspeitavam que pudesse acontecer. Interromper o ciclo de destruição será apenas o primeiro passo na proteção deste que é o bioma mais biodiverso do país – e uma peça essencial no controle do clima terrestre.
Fonte 1. Amazonia as a carbon source linked to deforestation and climate change. L Gatti e outros, 2021.