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Baunilha: conheça o potencial alimentício, terapêutico e econômico da planta

Baunilha: conheça o potencial alimentício, terapêutico e econômico da planta

Para pesquisadores, estudar as espécies de baunilhas brasileiras, que podem alcançar grande relevância para a produção e comercialização alimentícia e terapêutica é essencial

A baunilha é um dos condimentos mais conhecidos e consumidos no mundo, sendo explorada desde o início da colonização espanhola na América. Em 2022, apenas os EUA movimentaram cerca de U$ 348 milhões em importações. É um mercado que apresenta muitas incertezas, tendo em vista o longo tempo de cultivo, a baixa variabilidade genética e a repetição de desastres ambientais. Com isso o preço da baunilha já oscilou de US$ 50 a US$ 500 num curto intervalo de tempo.

Em 2017, por exemplo, na chamada “Crise da Baunilha”, o quilo chegou a custar US$ 700 e a instabilidade de seu preço no mercado internacional tem sido constante nos últimos anos. Em grande parte, isso se deve ao fato de ser uma espécie que precisa de condições ideais para ser cultivada, como o clima tropical encontrado em Madagascar — maior produtor mundial da espécie Vanilla planifolia. Para atender a ampla demanda mundial e driblar a exaustão da produção, o mercado é alimentado pela forma artificial da especiaria, ou seja, o que comumente conhecemos como essência de baunilha.

Na forma de cultivo atual, é impossível atender à demanda global com o extrato da fava de baunilha. Por isso, a busca por novas espécies que possam contribuir para a variabilidade genética e que podem ser cultivadas em outros lugares é algo urgente e promissor, considerando que um dos grandes obstáculos é a não adaptabilidade da orquídea da baunilha à variação ambiental.

Como o mercado da baunilha movimenta bilhões de dólares ao ano, essas espécies se cultivadas e comercializadas como especiaria podem trazer grandes benefícios e fortalecer a economia local.

Dentre os quatro tipos mais conhecidos de baunilha, a Vanilla planifolia, também chamada de Baunilha Bourbon, é reconhecida pelas suas características aromáticas, sendo espécie mais comercializada no mundo. Outras duas espécies de baunilhas, a Vanilla chamissonis e Vanilla bahiana, são encontradas no Brasil e demonstraram propriedades sensoriais semelhantes àquela comercializada internacionalmente.

A Embrapa (Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária) tem investido na ampliação capacidade de produção nacional de baunilha por meio da exploração dessas espécies, além de capacitar produtores locais, como quilombolas e pequenos produtores rurais. Com a melhoria das técnicas de cultivo, a produção pode ser aumentada e gerar importantes impactos de ordem econômica, social e política nas comunidades produtoras, melhorando a cadeia produtiva para atender mercado internacional.

Além disso, há a dimensão econômica que se revela no potencial de bioprospecção, ou seja, ampliação da produção pela diversificação genética da espécie, o que é um dos maiores desafios no caso do cultivo da especiaria.

'Vanilla planifolia', também chamada de Baunilha Bourbon, é reconhecida pelas suas características aromáticas, sendo espécie mais comercializada no mundo — Foto: Toxicology Report
‘Vanilla planifolia’, também chamada de Baunilha Bourbon, é reconhecida pelas suas características aromáticas, sendo espécie mais comercializada no mundo — Foto: Toxicology Report

Em nossa pesquisa, avaliamos se a Vanilla chamissonis e Vanilla bahiana oferecem algum risco genotóxico, ou seja, se essas espécies seriam capazes de gerar dano ao material genético em teste e, desta forma, causar doenças, a exemplo do câncer. Para essa avaliação, foram realizados ensaios que mensurassem a segurança dessas substâncias para ingestão humana, a exemplo dos ensaios de citotoxidade, mutagenecidade e genotoxicidade.

Ao final, nenhuma das duas espécies em análise apresentou risco ao DNA em teste. Todas essas indicações são requisitos exigidos pelas agências de vigilância sanitária para garantia de segurança à saúde. Esses resultados são promissores e apontam para o avanço das pesquisas que considerem o consumo humano.

Espécie de baunilha chamada 'Vanilla bahiana' — Foto: Toxicology Report
Espécie de baunilha chamada ‘Vanilla bahiana’ — Foto: Toxicology Report

A avaliação de risco de produtos naturais muitas vezes é negligenciada pela população. Isso acontece pela falsa crença popular que diz “o natural não faz mal”. Porém, todos os anos são reportados casos de intoxicação por produtos naturais, incluindo casos graves que podem levar ao óbito.

Um dos últimos casos que ganhou notoriedade foi de uma morte por hepatite fulminante associada ao consumo de um mix de ervas que prometia emagrecimento, conhecido como “50 ervas”. Por isso é importante investigar a segurança de novos produtos para que se confirme a segurança de seu consumo.

Para além do uso pela indústria alimentícia, há o potencial terapêutico, característica que recebe cada vez mais atenção e investimentos da indústria farmacêutica. Estudos anteriores, por exemplo, indicam que a espécie Vanilla planifolia apresenta potencial antitumoral in vitro e a Vanilina, uma das principais moléculas responsáveis pelo aroma da baunilha, também apresenta atividade anti-inflamatória, cicatrizante e neuroprotetora.

A 'Vanila Chamissonis', também encontrada no Brasil — Foto: Toxicology Report
A ‘Vanila Chamissonis’, também encontrada no Brasil — Foto: Toxicology Report

Embora a maior parte do mercado consumidor global seja abastecida com essência artificial de baunilha, essencialmente composta por Vanilina e outros elementos, que proporcionam a experiência sensorial da baunilha como a conhecemos, há uma tendência crescente de consumo de produtos naturais e desestimulo ao uso de produtos sintéticos na rotina alimentar da população.

Diante disso, fica cada vez mais evidente a importância de estudar as espécies de baunilhas brasileiras, que podem alcançar grande relevância para a produção e comercialização alimentícia e terapêutica.

*Natália Gonçalves Ribeiro Araújo é pesquisadora do Laboratório de Mutagênese Ambiental, Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ), e Israel Felzenszwalb é Professor Titular do Instituto de Biologia Roberto Alcantara Gomes da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ). Este texto originalmente foi publicado no The Conversation.