A força da meditação: cinco minutos por dia já beneficiam o cérebro
No começo da década de 1990, o neurocientista americano Richard J. Davidson começou a estudar as diferenças entre cérebros de monges budistas e pessoas que não meditavam. Os resultados o assombraram e foi o início de uma pesquisa que derrubou o mito de que a meditação e seus benefícios são para quem pode se isolar numa caverna no Tibete, ou é o que popularmente se chama de uma pessoa zen.
Nada disso. Meditar, explicou Davidson em entrevista ao EXTRA, está ao alcance de todos e produz, com apenas cinco minutos diários de prática, transformações na estrutura do cérebro que ajudam a ter foco, regular emoções e ter compaixão. Se tudo isso já era importante antes de pandemia, frisou o diretor do Laboratório de Neurociência Afetiva da Universidade de Wisconsin, nos EUA, na fase de gradual retorno à normalidade tornou-se uma necessidade.
— Durante a pandemia trabalhamos com mais de 600 professores de escolas públicas que estavam dando aula online, submetidos a situações extremas. Com cinco minutos de meditação por dia essas pessoas reduziram em 25% seu nível de estresse em pouco tempo — conta Davidson, que semana passada foi o convidado estrela do foro sobre “Neurociência e bem-estar. Habilidades do futuro, conhecimento e bem-estar para a comunidade”, organizado pelo Instituto de Neurologia Cognitiva (Ineco), de Buenos Aires.
Em seu laboratório, o neurocientista americano tem algumas das tecnologias mais avançadas para obter imagens cerebrais, como tomografia por emissão de positrões e ressonância magnética. Com mais de 20 anos de estudos, Davidson não tem dúvidas de que meditar é um hábito que qualquer ser humano pode incorporar à rotina, da mesma forma que todos aprendemos, um dia, a escovar os dentes.
— Além da crise sanitária, a pandemia disseminou ansiedade e depressão. Os índices, em alguns países, duplicaram. Nossa mensagem é de que toda pessoa tem em suas mãos o potencial para melhorar seu bem-estar — enfatiza Davidson.
Comece aos poucos e depois aumente tempo
Em Buenos Aires, a psicóloga clínica e coordenadora do programa de Mindfulness do Ineco Mercedes Mendez também prega o hábito de deixar a mente descansar, perceber como estamos, o que estamos pensando, sem qualquer tipo de julgamento. Essa última recomendação é fundamental, aponta Mercedes, porque muitas pessoas têm dificuldade de sentir e não se criticar.
O Mindfulness é uma prática terapêutica que surgiu em 1979, quando o médico Jon Kabat-Zinn combinou a meditação budista com elementos da ciência médica ocidental e Fundou o Mindfulness Based Stress Reduction (MBSR).
Ela também acredita que é possível começar com breves minutos diários, mas defende que para obter os melhores benefícios é preciso adquirir o hábito de pausar entre 15 e 20 minutos.
— Se não conseguiram encontrar esse momento, façam a pausa enquanto comem, brincam com seus filhos ou conversam com seus pais. Isso já é muito potente, é perceber o momento presente, voltar a você e não deixar que os pensamentos te arrastem.
‘É simples, mas demorei a entender isso’
O mais importante para quem decide iniciar esse caminho, concordam outros especialistas, é entender que se trata, simplesmente, de desligar o piloto automático e perceber nossos pensamentos, muitas vezes, profundamente negativos sobre nós mesmos e que causam mal estar.
Aos 54 anos, a professora de ioga e instrutora de meditação brasileira Maria Araújo dedica sua vida a transmitir às pessoas como ela conseguiu passar do pânico à paz graças a práticas que existem há mais de cinco mil anos. Em seu estúdio no bairro do Catete, na Zona Sul, ela dá aulas presenciais e virtuais e todas as noites oferece aos alunos uma meditação:
— Meditar é muito simples, mas eu mesma demorei a entender isso. A primeira vez que tentei meu corpo coçava inteiro e desisti. Demorei alguns anos em tentar de novo e hoje sei que todos podemos meditar, e que não existe pessoa zen, existem pessoas, como eu, que conseguimos sair mais rápido de momentos de estresse — diz.
Maria lembra até hoje como as pessoas comentavam como ela tinha mudado sua expressão depois que começou a meditar. Antes, vivia com o rosto zangado e raramente sorria:
— Meditar é tudo o que fazemos no presente. Podemos meditar olhando a chuva, uma planta, uma vela. É uma pausa que fazemos e na qual nos observamos. Tem gente que tem dificuldade, não quer nem fechar os olhos, não quer se ver.
Maria convida seus alunos a romper resistências e tirar o pé do acelerador todos os dias, o tempo que for possível. Os principais benefícios da são tranquilidade, superação de pânicos, desfrute das pequenas coisas, organização da mente e dos pensamentos.
— É como se tivéssemos uma gaveta toda bagunçada, com todos os tipos de roupas. Você organiza essas peças em gavetas diferentes. Eu vivia com medo, pânico, e, com a meditação, organizei a gaveta e criei espaço mental.