2,4 bilhões de pessoas enfrentam noites perigosamente quentes
Mudanças climáticas aumentam temperaturas noturnas e prejudicam saúde global, alerta estudo
As mudanças climáticas estão causando um aumento alarmante das temperaturas noturnas em todo o mundo, incluindo diversas cidades brasileiras, de acordo com um novo estudo da Climate Central. A pesquisa revela que cerca de 2,4 bilhões de pessoas enfrentam pelo menos duas semanas adicionais de noites com temperaturas mínimas superiores a 25 °C a cada ano, devido às alterações climáticas. No Brasil, os estados mais impactados são Rio Grande do Norte, Ceará, Piauí, Mato Grosso do Sul e Paraíba.
Com cada vez mais noites acima de temperaturas confortáveis ou seguras, especialistas em saúde alertam para uma epidemia de privação de sono induzida pelo clima, doenças agudas e crônicas e problemas de saúde mental. Segundo o relatório, as temperaturas noturnas subiram ainda mais rapidamente do que as diurnas à medida que o mundo aquece devido às alterações climáticas, causadas pela queima de combustíveis fósseis como carvão, petróleo e gás e pelo desmatamento.
O estudo trouxe evidências de que noites acima de 25 °C e 20 °C, ou mesmo 18 °C, podem impactar negativamente o sono e a saúde. Pesquisas mostram que o risco relativo de mortalidade em dias com noites quentes pode ser 50% maior do que em dias com noites não quentes. A Climate Central analisou como as alterações climáticas causadas pelo homem aumentaram essas noites quentes e quantas pessoas foram afetadas a cada ano, entre 2014 e 2023, dentre os principais pontos estão:
- Aproximadamente 2,4 bilhões de pessoas por ano vivenciaram pelo menos duas semanas adicionais de noites acima de 25 °C devido às alterações climáticas;
- Mais de 1,3 bilhão de pessoas vivenciaram pelo menos duas semanas adicionais por ano em que as temperaturas noturnas ultrapassaram os 20 °C devido às alterações climáticas;
Impactos no Brasil
Das 994 cidades analisadas ao redor do mundo, 30 experimentaram pelo menos um mês adicional, devido às mudanças climáticas, com temperaturas noturnas durante o verão superiores a 18°C. No Brasil tivemos como média nacional, três noites adicionais acima de 25°C devido às mudanças climáticas.
Muitas cidades grandes experimentaram um aumento muito maior no número de noites quentes, com semanas ou meses de noites acima de 25°C. Isso inclui 67 noites a mais com termômetros marcando acima de 25°C em Maceió (AL), 66 noites em Salvador (BA), 61 noites em Fortaleza (CE), 60 noites em Natal (RN), 46 noites em São Luís (MA), e um mês de noites adicionais no Rio de Janeiro (RJ) e em João Pessoa (PB).
Em Santos (SP), Recife (PE) e Belém (PA), foram adicionadas entre duas semanas e um mês de noites acima de 25°C. Também houve 12 noites adicionais acima desse limiar em São Gonçalo (RJ), Teresina (PI) e Manaus (AM).
Entre os estados mais impactados por noites adicionais acima de 20°C estão: Goiás, Minas Gerais, São Paulo, Bahia, Paraná, Distrito Federal, Rio Grande do Sul, Roraima e Rio de Janeiro. Foram registradas oito noites a mais com temperaturas acima de 20°C, incluindo 48 noites em Goiânia (GO), 17 em Porto Alegre (RS), 15 em São Paulo (SP), 13 em Campo Grande (MS) e Guarulhos (SP), 11 em Foz do Iguaçu (PR), 9 em Belo Horizonte (MG) e São Bernardo do Campo (SP), 6 em Curitiba (PR), e 4 no Rio de Janeiro (RJ).
Impactos na saúde
Segundo os pesquisadores, as altas temperaturas durante a noite são particularmente perigosas, pois impedem que o corpo esfrie e se recupere do calor diurno. Isso aumenta o risco de acidentes vasculares cerebrais, outras doenças cardiovasculares e mortalidade. As noites quentes também degradam a qualidade e a duração do sono em todo o mundo, o que tem uma ampla gama de impactos negativos na saúde física e mental, no funcionamento cognitivo, e na aprendizagem e desenvolvimento do cérebro das crianças.
O sono curto e de má qualidade também pode reduzir a expectativa de vida e aumentar os riscos de acidentes e lesões. “Esta análise revela uma crise de saúde pública, com consequências fatais”, destacou Lisa Patel, pediatra e diretora Executiva do Medical Society Consortium no Climate and Health. “O mundo está esquentando ainda mais rápido à noite do que durante o dia, e nossos corpos não conseguem dar conta. Sabemos que as altas temperaturas noturnas nos impedem de nos recuperarmos do calor do dia e de termos uma boa noite de sono, fatores essenciais para a saúde e o bem-estar humano”, explica.
As noites quentes têm impactos desproporcionais em grupos mais vulneráveis, incluindo crianças, idosos e grávidas. Os efeitos das altas temperaturas noturnas também variam entre países e dentro dos países, com as populações de renda mais baixa sendo afetadas de forma desproporcional, em parte devido a diferenças na qualidade das moradias e no acesso a ar condicionado. Os impactos das noites quentes podem ser ainda mais exacerbados nas cidades devido aos efeitos ilha de calor, que podem levar a temperaturas significativamente mais elevadas nas áreas urbanas em comparação com o seu entorno.
Precariedade piora situação
O estudo analisa temperaturas externas e não internas, observando que condições dentro dos edifícios podem ser ainda mais severas devido a fatores como tipos de habitação que são mais propensos ao superaquecimento, má ventilação e calor retido. O calor noturno extremo afeta desproporcionalmente pessoas sem moradia e refugiados, que dormem em tendas improvisadas ou estruturas que retêm o calor, agravando suas já precárias condições de vida.
O contexto do estudo inclui as contínuas ondas de calor recorde em todo o mundo, que se tornam cada vez mais extremas e mais prováveis devido às alterações climáticas, causadas principalmente pelos combustíveis fósseis. Junho de 2024 foi o décimo terceiro mês consecutivo mais quente já registrado, subindo para 1,6 °C acima dos níveis pré-industriais, depois de onze meses consecutivos durante os quais as temperaturas globais foram 1,5 °C mais altas do que em 1850. Julho viu recordes serem quebrados duas vezes em uma semana para o dia mais quente do mundo em mais de 120 mil anos.
“Com 2024 rumo a ser o ano mais quente já registrado, nunca foi tão crucial parar de queimar combustíveis fósseis como petróleo, carvão e gás e proteger as florestas para evitar que as temperaturas globais subam ainda mais”, enfatiza Michelle Young, Pesquisadora Associada de Impactos Climáticos da Climate Central.