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Envolverde: um vetor de desenvolvimento para a comunicação ambiental

Envolverde: um vetor de desenvolvimento para a comunicação ambiental

𝗗𝗮𝗹 𝗠𝗮𝗿𝗰𝗼𝗻𝗱𝗲𝘀 – A sustentabilidade no Brasil e no mundo é um quebra-cabeça complexo. Por décadas, a pauta ambiental foi um tema técnico, reservado a especialistas. No entanto, nos últimos anos, as discussões sobre o meio ambiente, em especial as mudanças climáticas e o desmatamento, saíram do nicho e foram parar no centro do debate político. Infelizmente, essa exposição trouxe consigo a polarização e o negacionismo, tornando o caminho para soluções mais difícil.

A ascensão de discursos extremistas e o alcance massivo das redes sociais deram ao “idiota da aldeia” um megafone digital, capaz de espalhar a desinformação. O efeito disso é corrosivo: questões complexas são simplificadas em escolhas binárias, inviabilizando soluções que exigem colaboração.

Nesse cenário, veículos como a Agência Envolverde, que eu ajudei a fundar, têm uma missão clara: não entrar em polêmicas vazias, mas oferecer fatos, análises e opiniões fundamentadas. Nosso papel é aprofundar o debate, com análises de especialistas, e trazer informação confiável que vá além da polarização.

Pioneirismo digital e o marco da Rio+20

A Envolverde nasceu de um espírito inovador. No início dos anos 90, o meio ambiente estava ganhando espaço no debate público. Em 1995, o Projeto Terramérica, iniciativa do Programa de Meio Ambiente da ONU, da Agência IPS (Inter Press Service) e da Envolverde, começou a circular em grandes jornais, como o Jornal do Brasil e o Correio Braziliense. Em janeiro de 1998, demos um passo adiante, lançando a Envolverde como um portal de notícias, o primeiro no Brasil focado em jornalismo ambiental digital.

Adotamos o conceito de Creative Commons, permitindo a reprodução livre de nosso conteúdo, desde que a fonte fosse citada. Isso expandiu enormemente o alcance de nosso trabalho. Ganhamos prêmios, firmamos parcerias com veículos como o jornal O Estado de S. Paulo e a Harvard Business Review, e hoje somos mantidos pelo Instituto Envolverde, fieis ao nosso compromisso de informar e engajar a sociedade em temas de sustentabilidade.

Rio+20, em 2012, foi um marco decisivo para o jornalismo ambiental, pois foi um dos primeiros eventos globais a usar a internet para produção e difusão de conteúdo em larga escala. Essa inovação tecnológica fortaleceu as mídias especializadas, que passaram a competir em um novo nível com as grandes corporações. Além disso, a cobertura aprofundada feita por jornalistas especializados levou grandes redações a contratarem profissionais com foco em meio ambiente, o que ampliou a importância do tema na mídia tradicional.

Temas sensíveis e credibilidade editorial

Nunca fugimos de temas complexos. No desmatamento, por exemplo, não nos limitamos a denunciar. Buscamos entender as causas, os impactos e as iniciativas que promovem o combate e a prevenção. Em relação ao agronegócio, reconhecemos sua importância econômica, sem deixar de lado a análise crítica de suas práticas. O mesmo vale para as políticas públicas e as negociações de clima, como as COPs, onde acompanhamos o que está em jogo, as posições dos países e como as decisões afetam a vida das pessoas.

Nossa linguagem não é excessivamente técnica nem meramente opinativa. É um jornalismo engajado e informativo, guiado por apuração rigorosa. Baseamos nosso conteúdo em dados e ciência, mas sempre traduzindo conceitos complexos para o público, sem perder a precisão. O que nos move é a busca por ampliar o conhecimento social sobre sustentabilidade, conectando cada pauta aos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) e, o mais importante, ajudando o leitor a entender não apenas “o que” ou “como”, mas principalmente “o porquê”.

Para preservar nossa credibilidade em um cenário de polarização, seguimos princípios essenciais: apuração rigorosa, múltiplas fontes e distinção clara entre fato e opinião. Somos transparentes em nossa missão e valores, mas não damos espaço ao negacionismo. Nossa credibilidade é resultado direto de um jornalismo de qualidade e de um engajamento transparente com a sustentabilidade.

O papel das Relações Públicas e os desafios do setor

A Envolverde mantém uma relação diária com assessorias de imprensa e profissionais de Relações Públicas. A pauta ESG, em especial, nos aproxima, mas todo material que chega passa por um crivo rigoroso. Nosso objetivo não é ser um “mural de releases”. Buscamos conteúdo que tenha valor e credibilidade, verificando informações, complementando dados e buscando outras fontes. Essa postura garante que a Envolverde seja um espaço de informação confiável e independente.

Profissionais de relações públicas têm um papel importante, atuando como tradutores entre a linguagem corporativa e a jornalística. No entanto, o maior desafio é equilibrar os interesses da empresa com a necessidade de transparência. Qualquer tentativa de maquiar problemas pode ser percebida como greenwashing ou social washing, e isso compromete a credibilidade de todos os envolvidos.

Um dos erros mais comuns que vemos é a comunicação tática, focada em anunciar o que a empresa fez sem explicar o porquê, qual o problema que buscou resolver, ou como a ação será implementada. A falta de métricas claras, tratar iniciativas como ações isoladas ou usar veículos especializados como espaços de “publicidade gratuita” são erros que comprometem a reputação.

Já nos deparamos com muitas tentativas de manipulação, a mais comum sendo o greenwashing. Combatemos essas práticas com jornalismo analítico, valorizando a investigação e a experiência para distinguir um compromisso genuíno de uma simples ação de marketing. Nossa reputação, construída ao longo dos anos, é nosso maior ativo.

Desafios futuros: desinformação e Inteligência Artificial

O jornalismo socioambiental enfrentará dois desafios interligados nos próximos anos: a desinformação e o avanço da Inteligência Artificial (IA). A fake news se tornou mais complexa, impulsionada por interesses que se beneficiam da confusão e da polarização. Ela mina a confiança na ciência e atrasa ações urgentes, criando dúvidas sobre fatos já estabelecidos, o que desgasta a credibilidade da imprensa de qualidade.

A Inteligência Artificial, por sua vez, é uma ferramenta que, apesar de ajudar, também amplia os riscos. Com a IA generativa, é possível criar textos, imagens e vídeos falsos, mas extremamente realistas, em larga escala e com custo quase zero. Isso facilita a produção de desinformação com aparência de credibilidade.

O grande desafio será manter a credibilidade e a relevância em um contexto onde a informação falsa pode ser produzida em escala industrial. Isso exigirá apuração rigorosa, transparência, responsabilidade editorial e a capacidade de oferecer contexto de forma clara e confiável. O caminho é continuar no ofício de sempre: com ética, responsabilidade, buscando o fato, e contando a história.

Dal-Marcondes

Dal Marcondes é fundador e editor da Envolverde, especialista em economia ambiental pelo Procam/USPe mestre em Produção Jornalística e Mercado pela ESPM/SP. Foi repórter e editor em grandes meios, como as revistas Isto É, Exame e Carta Capital,  e atuou em agências de notícias, como a Agence France Presse, Agência Dinheiro Vivo e Agência Estado, além dos jornais Gazeta Mercantil e DCI. Por 10 anos foi presidente a Rede Brasileira de Jornalismo Ambiental.