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Retrospectiva: 10 avanços para o clima e o meio ambiente em 2024

Retrospectiva: 10 avanços para o clima e o meio ambiente em 2024

Ano deixou a desejar no progresso em áreas-chave para enfrentar os desafios impostos pela tríplice crise do clima, perda de biodiversidade e poluição, mas ainda assim trouxe alguns avanços

2024 foi um ano em que os desafios climáticos e ambientais atingiram novos picos. O Brasil vivenciou enchentes devastadoras no Sul, que causaram enormes perdas humanas e de infraestrutura, e revelaram as fragilidades das cidades frente aos cada vez mais frequentes eventos climáticos extremos. Incêndios florestais, secas históricas e um ano de temperaturas recordes também marcaram a agenda brasileira e global, trazendo à tona a urgência da ação climática.

Também trouxe muitas frustrações, tendo em vista que alguns dos principais encontros multilatreais do ano — COP29 do Clima, COP16 da Biodiversidade, a Convenção contra a Desertificação e a reunião da ONU para criar um acordo global contra a poluição plástica — pouco avançaram para enfrentar essas complexas crises.

Contudo, mesmo diante de um cenário crítico, o ano também trouxe alguns avanços. A seguir, elencamos alguns deles.

Preocupação global com a emergência climática aumenta

À primeira vista, esta pode não parecer uma boa notícia. Afinal, se a preocupação aumenta é sinal de que cada vez mais as pessoas estão sentindo e sofrendo com os efeitos da emergência climática. Estima-se que ao menos 1,2 bilhão de pessoas estão expostas a pelo menos um risco climático crítico, como ondas de calor, inundações, furacões e secas, que podem mudar drasticamente seu modo vida.

Mas, diante da necessidade medidas de mitigação e adaptação climática em larga escala, a preocupação e mobilização popular é fundamental para gerar comoção política e, consequentemente, para implementar essas soluções. Segundo pesquisas globais de percepção pública sobre o tema, de maneira geral, a maioria das pessoas concordam que o clima está mudando e que isso é um problema urgente que precisa ser enfrentado.

De acordo com a Peoples’ Climate Vote de 2024, do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD), 80% dos entrevistados querem que seus governos tomem ações mais fortes para enfrentar a crise climática. A pesquisa contou com mais de 75.000 pessoas, de 77 países, representando 87% da população mundial.

Camada de ozônio se recupera

Em 2024, o buraco na camada de ozônio sobre o Polo Sul atingiu sua sétima menor extensão em mais de 30 anos, cobrindo uma área média de 20 milhões de quilômetros quadrados, o que representa uma recuperação gradual — e sinal de que um compromisso global efetivo pode resolver desafios climáticos e ambientais.

Esse buraco, que ocorre anualmente entre setembro e outubro, foi historicamente causado pela destruição do ozônio, essencial para proteger a Terra da radiação ultravioleta (UV), cuja intensificação contribui para aumento de câncer de pele, catarata e impactos negativos na agricultura e ecossistemas aquáticos. O Protocolo de Montreal, assinado em 1987, foi fundamental para a recuperação, ao eliminar substâncias como os CFCs, responsáveis pela destruição do ozônio. Cientistas da NASA e da NOAA destacam que a melhoria observada nas últimas duas décadas é um reflexo dos esforços coletivos internacionais bem-sucedidos para reduzir o uso desses produtos químicos.

Desmatamento na Amazônia tem maior queda em 15 anos

O desmatamento na Amazônia teve a maior redução em 15 anos, com uma diminuição de 30,63% entre agosto de 2023 e julho de 2024. Essa baixa foi a principal responsável pela maior queda percentual (de 12%) nas emissões de gases do Brasil desde 2009, com o país evitando a a emissão de uma quantidade de gases equivalente ao total da Argentina. A ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, ressaltou que o sucesso se deve a políticas públicas eficazes, instituições estruturadas e ao diálogo contínuo com a ciência. Em contrapartida, os incêndios florestais atingiram novos picos na região em meio a uma temporada sem precedentes.

Fundo Amazônia alcança recorde de aprovações

Em 2024, o Fundo Amazônia alcançou um recorde histórico de R$ 882 milhões em aprovações de projetos, superando os R$ 553 milhões registrados em 2023. Esse valor reflete a aceleração das ações de proteção ambiental, bioeconomia e inclusão social na Amazônia. Entre os principais projetos financiados, destacam-se o Restaura Amazônia (R$ 450 milhões), voltado à restauração florestal e geração de emprego, e o Amazônia na Escola (R$ 332 milhões), que beneficia produtores e alunos na região.

Além disso, o Fundo tem apoiado iniciativas como o Sanear Amazônia, com foco em acesso à água, e projetos emergenciais para combate a incêndios. Em nota, o BNDES, gestor do Fundo, diz que o aumento nas aprovações é resultado da reconstrução do Plano de Ação para Combate ao Desmatamento (PPCDAm) e da reestruturação da governança do Fundo, o que permitiu a retomada de análises e o lançamento de novos editais. Só neste ano, o Fundo já apoiou mais de 650 organizações da sociedade civil, com foco no desenvolvimento sustentável na região amazônica.

Brasil agora tem um marco legal do hidrogênio

Em 2024, o Brasil sancionou a Política Nacional do Hidrogênio de Baixa Emissão de Carbono, estabelecendo um marco legal para regulamentar a produção do hidrogênio com baixas emissões de carbono. A Lei 14.948/2024 cria uma certificação voluntária e oferece incentivos tributários ao setor. O hidrogênio de baixa emissão de carbono será aquele que gerar até 7 quilos de CO2 equivalente por quilograma de hidrogênio produzido, limite a ser adotado até 2030. A lei também define os conceitos de hidrogênio verde, produzido com base em fontes de energia renováveis. Empresas do setor poderão se beneficiar de incentivos fiscais e apoio ao desenvolvimento de infraestruturas e inovação, com o objetivo de impulsionar a produção e o uso sustentável do hidrogênio no país.

Brasil inclui mudanças climáticas e proteção da biodiversidade no currículo escolar

A partir de 2025, as escolas brasileiras deverão incluir, em seus currículos, o ensino sobre mudanças climáticas e a proteção da biodiversidade, conforme a Lei 14.926 sancionada em outubro de 2024. A norma, que modifica a Política Nacional de Educação Ambiental (Lei 9.795/1999), estabelece que as instituições de ensino devem promover atividades relacionadas à prevenção e redução das mudanças climáticas e aos riscos socioambientais. A lei visa integrar esses temas tanto na educação básica quanto no ensino superior, fortalecendo a conscientização ambiental entre os estudantes e incentivando a participação ativa em ações de preservação e mitigação de impactos.

Vitórica histórica do clima em tribunal

Em abril, um grupo de mulheres suíças, a maioria com mais de 70 anos, obteve a primeira vitória no Tribunal Europeu dos Direitos Humanos em um caso relacionado às mudanças climáticas. Elas alegaram que sua idade e gênero as tornam mais vulneráveis aos efeitos das ondas de calor causadas pelo aquecimento global. O tribunal concluiu que a Suíça falhou em cumprir suas metas de redução de emissões de gases do efeito estufa e que suas políticas climáticas eram inadequadas, violando o direito à vida sadia e segura. A decisão pode impactar as legislações de 46 países europeus. Conhecidas como KlimaSeniorinnen, as mulheres lutavam há quase uma década por melhores políticas de saúde e proteção contra os impactos climáticos.

Fundo Cali

Em resposta ao declínio acelerado da vida selvagem, países na COP16 da ONU, realizada na cidade de Cali, Colômbia, concordaram que empresas que utilizam dados genéticos de organismos da natureza para produtos comerciais, como as dos setores farmacêutico, biotecnológico e de cosméticos, devem pagar por isso e contribuir para o Fundo de Informações de Sequência Digital (DSI), também conhecido como fundo “Cali”.

O fundo foi criado para garantir o financiamento de ações de conservação de biodiversidade, especialmente em países que possuem biodiversidade rica, mas que enfrentam dificuldades financeiras para proteger seus ecossistemas. A iniciativa pretende reunir recursos tanto de governos quanto de setores privados, com o intuito de garantir uma fonte de financiamento sustentável para a preservação.

Primeiro crédito de biodiversidade do Brasil

E falando em biodiversidade, o Instituto Homem Pantaneiro (IHP) e a Ecosystem Regeneration Associates (ERA) desenvolveram o primeiro crédito brasileiro de biodiversidade, com o objetivo de financiar a conservação da flora e fauna do Pantanal e proteger espécies-chave como a onça-pintada. O projeto, que pode ser replicado em outros biomas, oferece créditos de biodiversidade baseados em ações verificadas de conservação. Com foco em 50 mil hectares de Reservas Privadas de Proteção Nacional (RPPNs) no Pantanal, o projeto visa garantir a preservação de habitats e espécies ameaçadas. Os créditos adquiridos financiarão ações como monitoramento da onça-pintada, pesquisa científica, ecoturismo e educação ambiental.

Mercado de carbono

Em 2024, o Brasil avançou na regulamentação do mercado de carbono, criando um sistema nacional que visa facilitar a negociação desses créditos. Com isso, o país vai implementar o Sistema Brasileiro de Comércio de Emissões (SBCE), que estabelecerá limites para as emissões de gases de efeito estufa nos setores mais poluentes da economia, além de criar um mercado para compensações ambientais. Ao mesmo tempo, na COP29, reunião de clima da ONU no Azerbaijão, foram aprovadas regras para a criação de um mercado de carbono global dentro do Acordo de Paris, com o intuito de padronizar e expandir os mecanismos de compensação de emissões entre países e empresas.

Apesar de contribuir no enfrentamento da emergência climática, os mercados de carbono não devem ser a única solução, sendo necessária uma abordagem mais ampla que inclua compromisso dos países com a transição energética — o que implica desinvestimento em fontes fósseis — e grantir recursos para adaptação nos países mais afetados e economicamente desprivilegiados, além de fundos para cobrir perdas e danos. No que diz respeito aos mercados de carbono regulados, ainda há pontas soltas quanto à integridade ambiental dos projetos, com a possibilidade de certificação de iniciativas de baixo impacto, e o risco de dupla contagem dos créditos, o que enfraqueceria os esforços globais de combate às mudanças climáticas.