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“Duna” da vida real: novo traje espacial transforma urina em água potável

“Duna” da vida real: novo traje espacial transforma urina em água potável

Dispositivo cabe em uma mochila de 8 kg, e recicla 500 ml de xixi em 5 minutos. A ideia é que o traje dê mais conforto durante missões espaciais longas – como a exploração de Marte, por exemplo

Você já parou para pensar como os astronautas vão ao banheiro quando estão usando seus trajes espaciais? Durante caminhadas e coleta de materiais fora das naves, que podem durar horas, a vestimenta garante oxigênio e proteção contra as baixas temperaturas. Porém, da mesma forma que nada penetra a roupa, nada sai – inclusive a urina.

Pensando nisso, pesquisadores da Universidade Cornell (EUA) criaram uma calça especial que funciona acoplada a um purificador de urina. Com o formato de uma mochila de 8 kg, o equipamento absorve a água eliminada, purifica o líquido e o transporta a um galão de água potável. Assim, astronautas têm a opção de beber o próprio xixi (ou melhor, uma versão purificada dele) durante suas caminhadas espaciais.

Desde 1970, os trajes espaciais contam com o chamado “Vestuário de Máxima Absorção” (MAG), uma fralda altamente absorvente, que pode reter cerca de dois litros de urina. O material é conhecido por ser desconfortável, anti-higiênico e ineficiente. É comum, por exemplo, que os MAGs vazem, podendo levar a infecções urinárias, especialmente em mulheres.

Além disso, ao contrário dos resíduos a bordo da Estação Espacial Internacional (ISS), a água na urina das caminhadas espaciais não é reciclada. No contexto de missões espaciais mais complexas, como as explorações em Marte, reverter esse desperdício pode ser essencial para o bem-estar dos astronautas.

A equipe da Universidade Cornell que projetou o possível substituto dos MAGs batizou o equipamento “Dispositivo de Coleta de Urina” (UCD). A tecnologia foi inspirada pelos “stillsuits” da ficção científica “Duna” (1965), de Frank Herbert. No romance, que foi adaptado para as telonas e é sucesso de bilheteria (e ganhou sequências recentes), os trajes são capazes de reciclar tanto a urina quanto o suor dos personagens.

Um protótipo da tecnologia que traz a fantasia à vida real já está sendo desenvolvido. Um artigo que descreve o projeto foi publicado nesta sexta-feira (12) na revista Frontiers in Space Technology.

Como o purificador de xixi funciona

Ao contrário do sistema MAG, que se baseia na absorção da urina, o UCD foi projetado para que a absorção seja mínima. Isso porque o líquido será coletado não mais por uma fralda, mas, por uma roupa íntima que se conecta a um copo de silicone, fabricado em designs específicos para garantir o ajuste ao redor dos genitais.

O copo coletor contém um revestimento macio e absorvente, que afasta a urina do corpo. Ao detectar a umidade no dispositivo, um sensor RFID ativa automaticamente uma bomba de vácuo que leva o material para um sistema avançado de filtragem de duas etapas na mochila, acoplada às costas do astronauta.

A filtragem é feita por um processo de osmose direta e reversa para separar a água de toxinas, minerais e outros solutos impróprios para o consumo. A água purificada é, então, enriquecida em eletrólitos e bombeada para a bolsa de bebida do traje. O sistema é alimentado por uma bateria de 20,5 V, e é capaz transformar cerca de 500 ml de urina em apenas cinco minutos.

“Nosso sistema pode ser testado em condições de microgravidade, já que a microgravidade é o principal fator espacial que devemos levar em conta”, aponta Christopher Mason, um dos pesquisadores envolvidos no estudo, em nota à imprensa. “Esses testes garantirão a funcionalidade e a segurança do sistema antes que ele seja implantado em missões espaciais reais”.

Potencial para missões espaciais

Em 2025 e 2026, a Nasa planeja lançar as missões Artemis II e III, nas quais uma tripulação orbitará a Lua e pousará em seu polo sul, respectivamente. No início da década de 2030, a agência espacial espera iniciar também missões tripuladas a Marte.

“Os trajes espaciais utilizados atualmente pelos astronautas têm apenas um litro de água disponível em suas bolsas de bebida. Isso não é suficiente para caminhadas espaciais de longa duração”, aponta Sofia Etlin, primeira autora do projeto. “As caminhadas nas missões Ártemis poderão durar cerca 10 horas – ou até 24 horas, caso haja alguma emergência”. Por isso, os UCDs podem ser uma solução interessante. A saúde dos astronautas agradece.