Cientistas coletam restos líquidos de mar existente há 390 milhões de anos

Análise química revela que águas que existiram no Devoniano Médio abrigavam criaturas hoje extintas, incluindo escorpiões marinhos do tamanho de uma caminhonete
Remanescentes líquidos de um antigo mar que ocupou há 390 milhões de anos o espaço que hoje fica o estado de Nova York, nos Estados Unidos, foram descobertos por pesquisadores com microscopia avançada e análises químicas. O achado pode nos ajudar a compreender como os oceanos podem se adaptar a mudanças climáticas.
O estudo foi registrado em 12 de outubro na revista Earth and Planetary Science Letters. Os rastros d’água foram descobertos escondidos em minerais de pirita de ferro no norte da Bacia dos Apalaches, no oeste nova-iorquino.
Conforme o perfil químico das amostras, o antigo mar interior ocupou não apenas Nova York. No período Devoniano Médio, esta porção de água se estendia do atual Michigan até Ontário, no Canadá.
Utilidade climática
Cientistas estudaram as amostras em nanoescala com uma técnica que pode expandir a ciência do clima, ajudando potencialmente a identificar locais no subsolo para armazenar hidrogênio destinado à produção de energia livre de carbono.
“Descobrimos que podemos realmente extrair informações dessas características minerais que podem ajudar a informar estudos geológicos, como a química da água do mar desde os tempos antigos”, informa Sandra Taylor, primeira autora do estudo e cientista do Laboratório Pacific Northwest National do Departamento de Energia dos EUA, em comunicado.
A química Sandra Taylor carrega uma amostra em um instrumento de tomografia por sonda atômica — Foto: Eric Francavilla | Pacific Northwest National Laboratory
A equipe utilizou técnicas de espectrometria de massa e tomografia por sonda atômica. Esse último é um dos poucos métodos que permite não apenas medir átomos de hidrogênio, mas também ver onde o elemento vai no mineral, segundo Taylor.
“Este estudo sugere que pequenos defeitos em minerais podem ser potenciais armadilhas para o hidrogênio”, explica a pesquisadora. “Então, usando essa técnica, poderíamos descobrir o que está acontecendo no nível atômico, o que ajudaria na avaliação e otimização de estratégias para armazenamento de hidrogênio no subsolo”.
O achado representa também os menores remanescentes líquidos de um mar interior antigo já revelados pela ciência. Os pesquisadores acreditam que a porção marinha abrigava um recife de coral que rivalizava com a Grande Barreira de Corais da Austrália.
Escorpiões marinhos gigantes, do tamanho de uma caminhonete, patrulhavam as águas que abrigavam criaturas agora extintas, como os primeiros exemplos de caranguejos-ferradura. Porém, o clima mudou e a maioria dos animais desapareceram com o próprio mar, deixando para trás apenas restos fósseis incrustados em sedimentos que eventualmente se tornaram a amostra de rocha de pirita.
Os cientistas notaram que os minerais tinham aparência de framboesas sob o microscópio, então os chamaram de framboides, um termo que deriva da palavra francesa para essa fruta (framboise). “Observamos primeiro essas amostras através do microscópio eletrônico, e vimos esse tipo de mini bolhas ou mini características dentro do framboide e nos perguntamos o que eram”, disse Taylor.
A equipe então descobriu que as bolhas realmente continham água — e sua química de sal combinava com a dos mares antigos. Normalmente, os cientistas usam depósitos minerais para estimar a temperatura dos oceanos.
De acordo com Daniel Gregory, um dos coautores da pesquisa, “depósitos de sal da água do mar presa (minerais halita) são relativamente raros no registro de rochas”. Já a pirita é encontrada em todos os lugares.