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Suicídio — um mal evitável

Suicídio — um mal evitável

Este é um assunto pouco discutido na sociedade. Há quem evite tocar neste tema por haver uma falsa crença popular que, assim agindo, despertará e até encorajará tal ato, em alguém que, por ventura, já tenha esta ideia preconcebida. Contudo, os profissionais de saúde mental discordam dessa convicção popular.

Mesmo já tendo falado sobre esta temática meses atrás, resolvi replicar este escrito por estarmos no mês dedicado à prevenção deste grave problema. O fato é que, o suicídio, é a principal causa de morte evitável em todo o mundo, e, segundo as estatísticas, tem crescido mundialmente, nas mais diversas faixas etárias, especialmente entre os jovens e os idosos.

Em todo o mundo, esta prática por indivíduos jovens, já é mais frequente que as mortes por HIV, por exemplo, sendo a depressão a principal causa desses suicídios.

É necessário esclarecer que, mesmo sendo a depressão muito comum na sociedade contemporânea, e o principal agente motivador para a retirada da própria vida, falar desse mal, não necessariamente é falar de suicídio, pois, a grande maioria das pessoas depressivas não chega a cometer tal ato.

De acordo com os dados oficiais, no Brasil, os suicídios perdem apenas para homicídios e acidentes de trânsito entre as mortes causadas por fatores externos, sendo a prevalência destes eventos fatais no sexo masculino. Os homens brasileiros têm 3,7 vezes mais chances de se matar que as mulheres. É o que atesta um levantamento feito pela Universidade Federal da Bahia.

Por que os homens se matam mais? Segundo alguns especialistas, certamente o que justifica este dado é o fato de os homens normalmente usarem para tal prática métodos mais violentos e letais que aqueles comumente utilizados pelas mulheres. Estas, em geral, tentam se matar tomando comprimidos ou cortando os pulsos, que são métodos menos traumáticos, possibilitando, muitas vezes, que o socorro chegue a tempo de salvar as suas vidas. O que comumente não acontece com os homens, pois estes em geral usam métodos bem mais letais, como disparo de armas de fogo, se jogam de prédios, enforcamento etc.

A Organização Mundial de Saúde – OMS enumera algumas causas que comumente influenciam na retirada da própria vida, quais sejam: histórico familiar de suicídio, uso abusivo de álcool e outras drogas, perda ou luto, transtornos mentais, como a esquizofrenia, decepções amorosas etc. Contudo, como já citado, a maior parte dos suicídios são executados por pessoas com depressão, independente de sexo, faixa etária ou qualquer outra característica.

Em se tratando dos jovens, entre as possíveis causas para a retirada da própria vida, ainda segundo a OMS, estão o fracasso na escola ou no trabalho, conflitos interpessoais com um parceiro romântico, impulsividade alta e o cyberbullying (bullying sofrido pelas redes sociais).

É importante lembrar que, muitas vezes, um comportamento agressivo do jovem, que pode ser confundido com uma fase difícil, clássica da adolescência, pode ser um sinal de depressão, pois especialmente em relação a esta faixa etária, nem sempre a depressão se manifesta como as pessoas imaginam: ficar na cama sem ânimo, se isolar socialmente etc. Além disso, outro aspecto que não deve ser esquecido é que os adolescentes, em geral, sentem muita dificuldade de pedir ajuda.

Já no caso dos idosos, as justificativas mais citadas pelos estudiosos para a alta incidência de suicídios é que, nessa idade, há o acúmulo de problemas de saúde, doenças crônicas e incuráveis, muitas vezes dolorosas ou de tratamento penoso, associado a um isolamento social progressivo, causado pela viuvez, separações, distanciamento de filhos e netos etc.

Diante de tal realidade, o que se pode fazer para ajudar a salvar alguém do suicídio?  A primeira coisa é nos aproximarmos da pessoa que demonstra estar sofrendo, ou que apresenta mudanças acentuadas e bruscas do comportamento, ouvi-la com atenção, e, se não nos sentirmos capazes de lidar com o problema, estimular esta, e também ir junto com a mesma, na busca de ajuda profissional (médico, psicólogo etc.), pois na maioria das vezes a pessoa não está com ânimo ou terá iniciativa para sozinha, buscar tal auxílio. O apoio da família e de um líder religioso, caso aceite, também é muito importante.

Quando se trata de suicídio alguns mitos ou crenças populares são comuns, dentre estes: 1. “Quem fala, não faz” – Isso não é verdade. Muitas vezes, a pessoa que diz que vai se matar não quer “chamar a atenção”, mas apenas dar um último sinal para pedir ajuda; 2. “Não se deve perguntar à pessoa depressiva se a mesma pensa, tem, ou já teve pensamentos ou ideação suicida, pois pode estimulá-la a tal feito”, isto também é mitodeve-se sim falar sobre isso, caso a pessoa esteja com sintomas da depressão. Uma conversa amigável e franca, sem julgamentos, para entender o que se passa com ela e tentar ajudá-la é muito importante. Não tocar no assunto pode piorar a situação; 3. “Só os depressivos clássicos se matam”, esta também é uma convicção falsa. Como já citado anteriormente, existe o depressivo mais conhecido, aquele que fica deitado na cama e não consegue levantar. Mas outras reações podem ser também indicativas de transtornos depressivos e, consequentemente, de comportamento suicida, como alta agressividade e nível extremo de impulsividade; 4. “Quem tenta se matar uma vez, vai tentar novamente”, também não é bem assim. É importante que a família fique atenta, mas, a maior parte dos pacientes que levam a sério o tratamento com medicamentos e terapia adequados não chegam a tentar tirar a própria vida uma segunda vez. Portanto, é muito importante sempre buscar ajuda.

Outro aspecto importante a considerar é que a família deve ficar atenta ao momento em que um depressivo, sem tratamento, diz estar bem; muitas vezes ele pode já ter decidido tirar a própria vida e tem o assunto como resolvido.

Também é necessário lembrar que geralmente os medicamentos (antidepressivos), levam um certo tempo para surtir os efeitos desejados e esperados. Por isso, os primeiros 30 dias após o início do tratamento são os que precisam de mais atenção dos cuidadores.

No Brasil, a porta de entrada para os atendimentos relacionados à saúde mental, de forma gratuita, são os Centros de Atenção Psicossocial – CAPs. Estes equipamentos possuem em seus quadros profissionais especializados como, médicos psiquiatras, psicólogo(a)s, e outros. Outra forma de buscar ajuda é contactar o Centro de Valorização da Vida (CVV), pelo número telefônico 141, pois este centro tem como missão, promover apoio emocional e preventivo às pessoas em sofrimento mental.

Assim sendo, é importante que o poder público promova campanhas educativas de conscientização relativas à saúde mental, em especial acerca da depressão, principal causa motivadora do suicídio, tal como ocorreu no tocante à Aids e o tabaco por exemplo, visando com isto, minimizar este grave problema.

Para tanto, é indispensável o envolvimento também da sociedade civil, em que todas as pessoas se sintam corresponsáveis por esta empreitada em prol da vida. E, como primeiro passo, que tal, elogiar mais as pessoas à sua volta. A autoestima elevada também ajuda a prevenir suicídios.

Deusimar Wanderley Guedes*

*Educador físico, psicólogo e dvogado. Especialista em Criminologia e Psicologia Criminal Investigativa. Ex-agente Especial da Polícia Federal Brasileira, sócio da Associação Brasileira de Estudos do Álcool e outras Drogas e do Instituto Brasileiro de Justiça e Cidadania. Autor de livros sobre drogas.